quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Aos que pensam estar na planície em desespero

essa queima de fogos
assusta cães, não a mim,
estou sabendo o que virá

as pessoas vão enlouquecendo aos poucos
tentando sustentar o status quo e,
quando não conseguem,
entram em parafuso,
bebem o fígado,
gemem, culpam o mundo,
ora, o mundo sempre foi assim,
para pior

o desemprego é o que abala,
mas também é uma fonte de oportunidades:
jamais encontrei quem quisesse trabalhar duro desempregado,
jamais

para aqueles que estão desempregados, aconselho:
entrem em 2012 com garra, dizendo "eu tenho colhões, porra!",
vou trabalhar em 2012 até espatifar meus braços e
esfarinhar meu cérebro, mas vou comer parte dessa torta, caralho,
se vou

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A grande bola de merda avança - e quem pode detê-la ao pé do Himalaia?

“Fillgrow, cadê meu presente?!”
Fillgrow olhava a TV, um lourinha vendia alguma coisa.
“Cadê meu presente!”
“Está em cima da mesa. O peru... pra você temperar”.
“O caralho que o meu presente vai ser aquela porra de peru...”
Fillgrow levantou um lado e soltou a bufa.
“Entenda como quiser”.
“Seu cretino... Vou lhe avisando: se não tiver presentes para mim e Vicent debaixo daquela árvore amanhã à noite, você não terá peru algum pra cravar o garfo... Se naquela árvore não...“.
Anunciavam um jogo da NFL para amanhã e ele não conseguia ouvir a notícia por causa dos gritos de Marlene.
“Que árvore? Aquilo não passa de um monte de gravetos”.
“Pois bem, se não tiver presentes – e dos bons – pendurados naqueles gravetos amanhã, seu peru não dará o ar da graça”.
“OK, Mal, vou comprar umas coisas pra você e o garoto. Tem tempo até amanhã”.
“Sei, já são quatro da tarde e você não se mexe dessa cadeira desde as 11”.
“Tem tempo. Pega uma cerveja, baby”.
Marlene gruniu, mas seguiu para a geladeira.
Na TV, Papai Noel mostrava as novidades em uma loja de departamento.
Fillgrow mudou de canal, irritado.
“Porra, tem que ter tempo, sempre tem”, resmungou.

domingo, 18 de dezembro de 2011

...

é,baby,
dividiremos colchões manchados de molas ruins
copos frágeis que se quebram nas bebedeiras
iremos suar um pouco no sexo
faremos o que tiver que ser feito
deixaremos nossos filhos no mundo
e será bom ter feito tudo isso,
porque, apesar de toda luta,
mais não importa...

talvez, o último drinque, talvez
a última azeitona no prato
quem sabe?
nada

sábado, 3 de dezembro de 2011

Em que me abala o que eu não tive por conhecer alguém dessa maneira estúpida

a bebida é um prazer
mas a ressaca é o demônio preso na garrafa
e, você, Otto, tem uma rixa com esse cara
e sempre sai perdendo no confronto

a cidade é um vício
assim como as mulheres e como era o cigarro
belas pernas, coxas, traseiro e seios
triste é ver tudo ir se acabando

não gosto de Natal, de dar ou receber presentes
não gosto do compromisso, de shopping center
da bonomia de rostos intrusos em minha vida
gosto é da solidão de mim mesmo,
ou melhor, comigo mesmo

essa obrigação, essa urgência da época
me causa engulho, certa vertigem até
Dusquene, você não está pronto para festas,
aliás, jamais estará...

não sei, realmente, como você sobreviveu a quatro décadas
e a mais de 15 empregos desconfortáveis, monótonos, erradios
como gatos pretos

a essa inescapável existência
do moto continuum
até o fim
o fim

domingo, 27 de novembro de 2011

Um pouco de alma em tudo isso

Mais um vez Natal
os perus já estão na engorda
os destrinchadores já estão sendo procurados
no fundo dos armários

mulheres e homens
começam a ficar nervosos
a insânia dos presentes, armar a árvore
e tudo o mais já se avizinha

Mais uma vez Natal
as garrafas de vinho já são reservadas
o champagne do Ano Novo também e
eu continuo bêbado de tédio

estou, na verdade, cada vez mais convencido
da imbecilidade e da propensão do homem
para o caos, a loucura...

mulheres desagradáveis de se olhar passam por mim, tensas,
crianças agitadas berram seus brinquedos,
homens contam os trocados e pensam nas dívidas futuras
e no trabalho que pode faltar no próximo ano

o quadro é triste, muito triste, lamentável
é, talvez o Natal e as garrafas me façam esquecer,
um pouco, esse drama humano,
quem sabe?

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

A merda nossa que vaza todos os dias - escritos de Dusquene (27)

"Humm... Ehhhhhhhhh... Hummm... Velhinha gostosa que cê é, Sally"."Ééé?" "Cê não sabe que é?" "Assim, cê qué? Assim..." "Isso, Sally, faz Sally, cê tem uns músculos aí dentro, Sally. Ughhh...aaaahh". "Aprendi com Wilburn. Ele leu numa revista sacana e eu comecei a praticar, é um tal de poncon.. pompo...". "Para não de praticar, viu Sally, tá? Ughhh. Mais, mais isso, Sallynha...". "Cê gosta, é?". "E como... Pratica sempre comigo, viu Sally". "As ordens, prepara que essa vai doer..."

sábado, 12 de novembro de 2011

É duro ser discreto à luz da lua

Bug Bess entrou no bar. Pug Lee levantou. Alfred, o dono do bar, foi logo dizendo: "Calma aí, rapazes, não quero confusão aqui. Se têm algo a resolver, é lá fora". Bug Bess e Pug Lee se olhavam, ferozes. "Onde está minha mulher?", falou Bess. "Se você não sabe, muito menos eu", respondeu Pug. "Você está fodendo ela, eu sei". "É, demos uns amassos, foi só". "Seu filho-duma..., cê ainda confessa?". Pug: "Estou sendo sincero, foi isso só entre nós". Bess cerrou os punhos: "Cê tem certeza?". "Tenho". "Tudo bem, então, deixo você me pagar uma cerveja". "Tudo bem. Mas só uma". "Tudo bem, só uma". O bar voltou à normalidade.

A merda nossa que vaza todos os dias - escritos de Dusquene (26)

iremos todos morrer em vão,
tentando pisar firme,aguentando,
sorrindo lamentavelmente,
quando tudo em nossa volta
desaba

iremos todos terminar, juntos,
na grande merda colossal,
deitados

e o que fizermos de nossas vidas a partir de agora
- sempre, sempre amigo -
terá sido um esforço
inútil

como o voo frenético dessa mariposa em volta da lâmpada
neste triste fim de noite
de novembro

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Razão que há de dizer adeus, somente, imunda

"Elfroy, largue essa garrafa agora". "Não, hoje é meu dia de folga". "Sempre é seu dia de folga. Você não trabalha há quatro meses". "Não é que eu não procure. Não tem emprego em lugar algum do país". "Vá se foder! Um país deste tamanho e não tem um mísero emprego para um catador de pulgas que nem você". "Mãe, fale pro seu macho repugnante calar a boca, senão vamos cair no braço". "Vem, seu porco imundo! Vem!". "Parem os dois, já". Mamãe foi pegar mais cerveja para Elfroy e Edmund. Um coçou um pouco o saco. Outro fungou. Ambos aceitaram a birita. Um triste quadro. Espalhado pela América mais baixa.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Dusquene, sua grande bola de merda rolante

Ei, camarada,
Eu sou Dusquene
E, você, quem?
Não ouvi...
Grande bola de merda você é
Eu faço a minha parte
Produzo alguns poemas,
uns bons outros nem tanto,
mas produzo, estão aí
para serem lidos
ou cobrir piso
de gaiola de canário,
a decisão não é minha

"Ninguém é bom o suficiente para você, Dusquene".
"É que eu não ligo muito pra ninguém, baby,
só para as suas doces pernas brancas de leite", apalpei um naco.
"No fundo você é um sujeito decente, Duc".
"Às vezes, pareço que sim, até para mim".
"Você já ajudou alguém, não é? Todo mundo ajudou".
"É?". "Não é?". "Éééé...."
"Conta como foi?"
"Deixa pra lá"
"Diga, vá", Suzzy esfregou sua bela coxa no meu pau.
"Huuummm... Um velhote desmaiou na rua. O coloquei dentro
de uma lanchonete. Um calor dos infernos e o velho dando umas voltas. Sabia mais ou menos onde ele morava, era dali,
alertei um filho ou genro, sei lá".
"E depois?"
"Deixei o velho com o parente e fui beber no Tony´s".
"Tá vendo? VOCÊ É UM SER HUMANO, DUC!"
"É, pode ser, às vezes..."

É disso que falo: da vida barateada,
descartável, e imensamente sincera
Eu escrevo sobre ISSO, camarada,
E você? Quem? Sua grande bola de merda.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A melhor hora da cidade em que ela vive

vejo a cidade morta às quatro horas da manhã
as ruas parecem a pele de um imenso anfíbio negro-cinza
pisada por bêbados erradios e sujos de merda
estou bebendo um tinto de qualidade; e isto é bom
vejo os carros na pista, ao longe, na hora plena
a melhor hora da cidade: quando todos dormem e
e ela, enfim, pode respirar, ficar em paz, livre de
passos, cusparadas, gimbas de cigarro, vômitos...
existe a possibilidade de um assassinato, logo,
mas isso sempre há em qualquer lugar do mundo
nem falo das sirenes de bombeiros e polícias
nem digo do meu incômodo de fazer parte disso...
a minha bebida me basta; nada hoje de rostos
e vozes humanas: só quero esse silêncio, imerso
em álcool, como uma quietude de mim mesmo agora

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

A fé desanima, às vezes, só às vezes

"A montanha está em você, Dusquene".
"Que troço é esse?"
"Você precisa trans-cen-der. Ir para a luz..."
"O caralho desse negócio. Sou mais ficar no fundo do bar, bebendo..."
"Deixe eu tocar na sua testa a procura de um sinal".
Olhei seco pro porra-louca, ele entendeu.
"Você está cheio de raiva, Dusquene. Isso é mal..."
"E você está enchendo o meu saco, e isso é bem pior".
Tomei um gole e levantei.
"Será que não há um bar decente nesta droga cidade pra se beber em paz", sai pensando e pisando duro, olhando o cu das donas que passavam.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Lili Bell

Lili Bell, meu amor, não chore
a vida é uma escrotidão sem fim,
mas não dê o braço a torcer,
não mostre a ninguém sua grande mágoa,
senão os abutres caem matando
em cima de sua carcaça
cheia de álcool e dor
nesse quarto de quinta
sob o sol fervente

Aguarde uma boa temporada
que não virá tão cedo - sabemos disso,
envie um postal para a mãe no Alabama
dizendo que está tudo OK, por enquanto,
e que você tentará algo mais por aqui
um sonho qualquer esquecido no fundo da gaveta
ou de um puteiro em cima de um bar

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

O meu companheiro em desagrado

"Pro inferno, Dusquene"
O diabo me intimará
eu continuarei a beber meu drink, ainda em casa,
sossegado

"Já é hora de termos uma conversa séria, amigo"
"O que?! Você está me desafiando"
"Pode-se dizer que sim"
"Você não tem nenhuma carta na manga. Você teve uma vida de merda"
"Mas a sua não é lá essas coisas"
"Eu sou o demo".
"Hum, camarada, perto do que eu já vi nessa vida, você está mais
pra madre Teresa de Calcutá"
"Embrulhe seus troços e vamos"
"Para onde?"
"Para baixo, ora".
"Não dá pra adiar até segunda? Hoje tenho um compromisso com Liv, no Frank's"
"De forma alguma"
"Ela tem uma bela bunda. Cê sabe?"
"Hum... Acho que dá pra negociar um prazo"
"Então, ao Frank´s?"
"É, pode ser, ao Frank's"
Levantamos e saímos, bons amigos

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

A confiança e a serenidade em plena luz, na varanda

"Você não sabe o que fiz ontem, Lilly". "Que foi, Timothy". "Matei um canário". "Como?!". "É, ele fugiu da gaiola, sabe. Foi parar debaixo do sofá". "Mas...". "Minha mãe pediu para eu pegá-lo. Enfie a mão e peguei ele. O canário amarelo, na minha mão". "E como foi que....". "Daí não resisti. Lá mesmo, com a mão ainda escondida, apertei forte". "Seu filho-duma...". "Senti o corpo do bicho endurecer. Morreu rápido, eheh". "E sua mãe, o que disse?". "Quer agora um periquito. Ela não ia muito com canários".

Em que eu coloque e você goze

Otto Dusquene, você está ficando velho, camarada,
47 anos é bastante tempo
na planície

tanto tempo convivendo com gente
e você ainda está vivo, é surpreendente
não ter quebrado

você tem as suas estratégias: o convívio restrito, mínimo,
a falta de amigos, essa é a sua melhor qualidade,
Dusquene

e hoje é sexta-feira e os bares estarão cheios de porra nenhuma
e as mulheres estarão também ali, umas bem feias,
horrendas, indescritíveis e tristes

mas você achará bom o ambiente, com um drinque na sua frente
e uma vaga possibilidade de sair de tudo aquilo, bêbado,
e logo

Lilly Bill

Lilly Bill quis crescer e acabou na sarjeta
Ninguém amava a Broadway como ela
Mas acabou na sarjeta
vomitando sonhos indefesos
enquanto, longe, ouvia-se os gritos
de alguém desafiando o nada

sábado, 8 de outubro de 2011

Um trago a bem do dia triste

tudo isso valeria a pena
se nós soubéssemos
um pouco mais das coisas

ai regularíamos a mão
iríamos mais devagar ou não
- ou beberíamos mais,
quem sabe?

o problema é justamente esse
não sabemos de nada, nada pelo menos que valha a pena,
realmente, saber

só lidamos com contas, caixas, cachorros,
a eterna crise do capital,juros, compras,
mesas de bares

não, mesas de bares são importantes,
de alguma forma

mas não sabemos, enfim, o ESSENCIAL:
por que os dados são lançados
e o valor da aposta de cada um,
nunca saberemos

e o que nos resta?
não sei você, mas vou agora tomar uns tragos no Frank's
apesar dessa chuva grossa que não para de despencar

domingo, 2 de outubro de 2011

Caledônia

Fillgow, o pistoleiro, desta vez cai. Morre na tarde rubra, em meio a cactus e folhetins de cowboys. E então esperaremos que ele renasça nas velhas páginas de gibis esquecidos nos fundos de gavetas.

"Ele não virá, Gillmore".

"Virá, sim".

"O gibi deste mês já foi lançado".

"É uma merda, vou ver com meu pai se ele acha um novo no almoxarifado".

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Um serviço de Billy boy

"Eu ainda mato esse cara. Ainda quebro ele".

"Quem?"

"O Gillmore".

"Que houve?"

"O desgraçado pediu que eu fosse na loja comprar camisinhas tamnho GG pra ele".

"Sacanagem da grossa".

"E ele falou... 'Desse tamanho aqui, ó', na frente de todo mundo. O homem é um filho-da-puta"

"E você foi?"

"Comprei, fazer o que..."

"Mas foi 'Desse tamanho aqui, ó'", e fiz o gesto com as mãos separadas uns 30 centímetros.

"Não fode, Dusquene", e Billy boy saiu caminhando, chateado.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Sobre o chão de Saturno, essa merda...

esta noite
estou triste
as coisas
não fluem
como deveriam

nem as mulheres
de dia
estavam melhores
nas ruas
hoje

e
todos são
indiferentes
a todos

levam suas mágoas
e angústias
presos
como tigres contidos
uma merda...

e vão morrer
disso
aos poucos
sempre

e assim
viveremos
até o fim
sem dar qualquer
espaço ao que
realmente
queremos fazer
ou dizer

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A caminho, mas sempre longe IV

1
"Bigfoot é um tremendo pé de mesa. Acabou com Sally".

2
"A fé de cada um é sempre repulsiva".

3
"Convívio é um estupro".

4
"O cão é o melhor amigo do homem. Se entre ele e o homem estiver um portão".

5
"O cão é o melhor amigo do homem. Diga isso pro carteiro".

6
"Foder cansa, baby. Foder cansa".

7
"Gente séria demais é caso perdido".

8
"Quando vejo alguém ajeitando a gravata, penso que se apronta para o suicídio".

9
"Boxe e futebol americano são coisas pra homem. O resto é esporte".

10
"Ninguém vive impunemente, Dusquene, ninguém".

domingo, 25 de setembro de 2011

Um cão

amo você, baby
como um cão
um cão danado
um cão de rua
triste

um cão cheio de carrapatos
com cicatrizes no focinho
seco e só

amo você, baby
como um cão
parado numa esquina
sarnento, repulsivo,
repleto de pulgas
e triste

amo você, baby
como um cão
manco e débil,
mas feroz

amo você,
ganindo

sábado, 24 de setembro de 2011

Big Joe

a sorte nunca mostrou seu largo rabo de diva para Big Joe
ele sempre suou um bocado para receber muito pouco
Big Joe

era sincero como faca,falava verdades que grudavam nas ruas
bebia em excesso, mas quem, em sanidade, não bebe vendo essa merda toda?
Big Joe

morreu ontem aos 30 anos de colapso cardíaco, num beco qualquer
não encherá mais o saco de ninguém, graças a Deus,
Big Joe

Weekend no Pacífico

ainda terei um
weekend no Pacífico
sob as palmeiras
com o vento no rosto
bebendo drink batido, com limão

mulheres, bebidas, calma
uma espreguiçadeira ao meu dispor
- Você venceu, Duc Dusquene... enfim, você venceu
você, o escritor mais prolífico das Américas
você, o pato, que ninguém dava valor

às vezes estarei sóbrio e ligarei para Joan:
- Baby, estou aqui, à beira-mar, relaxando...
um estúpido céu azul imenso sobre minha cabeça
fecharei, então, os olhos, sentirei o calor e sonharei um sonho bom

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Nem tente - ao velho Buk

cuidado, Dusquene,
você pode entrar na fila de transplantes
cuide de seu fígado, ame seu fígado
idolatre seu fígado, camarada

cuidado, Dusquene,
que a vida pode lhe pegar pelo saco e girar você no ar
como um saco cheio de merda,
cuidado

faça exame de próstata, não descuide
não fique aí, quentando os ovos, rapaz
faça por onde merecer estar vivo,
porra

cuidado, Dusquene,
cuide de seus olhos,
embora você não leia livros imprestáveis,
sem seus olhos como escrever poemas?

cuidado, camarada,
muito cuidado
e nem tente

terça-feira, 20 de setembro de 2011

A merda nossa que vaza todos os dias - escritos de Dusquene (25)

"A porra da minha irmã é uma neurótica".

"É?"

"Todo dia se desentende com o chefe do almoxarife e a sua pressão vai a 22".

"Puta-que-o-pariu... O troço é sério, então?"

"Nada, ela é toda sensível. Se o cara manda ela tirar quatro resmas de papel da segunda prateleira e colocar no carro, para distribuir nas seções da firma, ela já estremece. Pensa que é punição".

"E não é?"

"Nada. Punição quem recebe é o camarada que dorme com uma merda dessas".

Bullford riu, com o cigarro na boca.

"E sua irmã, presta?", perguntou Gillmore, meio receoso.

"Dá pro gasto. Vamos empilhar mais uns sacos e depois vamos ao Joe´s tomar uns tragos".

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Compaixão é sempre uma merda boa

a lua na sarjeta
que mal faz?
aquele poste só, ao longe,
iluminando
que mal faz?
aquele bêbado triste
que ali vai
que mal faz?
os pobres
que mal fazem ao mundo?
só a eles

então, camarada, tenha mais compaixão
não custa nada
tentar
nem que seja com sua mãe ou pai
ou sei lá quem

domingo, 18 de setembro de 2011

A Máscara de Mudaro 3 - Black Lane

Lane tocou a campainha. Um homem de meia idade atendeu.

- Você é Conwey?

- Sim. O que deseja?

- Você tem algo que pertence a um cliente meu.

- O que poderia ser?

- Uma Máscara...

- Então você veio pegar aquele objeto nefasto.

Black Lane achou que o sujeito estava de gozação.

- Escute, camarada...

- Não, não me entenda mal. Eu preciso que você a leve daqui. Imediatamente.


- Por que?

- Desde que essa peça chegou há duas semanas, meu filho sofreu um acidente de carro, o fundo de minha casa pegou fogo, dois ladrões tentaram roubar as poucas pinturas de valor que tenho, e outras coisas mais. Isso não é só coincidência. Aguarde um momento...

Conwey voltou com a Máscara envolvida em uma flanela de algodão.

- Tome. Livre-se dela. Não quero reembolso.

Lane a pegou, desconfiado.

- Fique tranquilo. Você estará protegido, agora.

----

Black Lane foi até a porta.

Willgston abriu. Era o cliente de Lane que encomendara o arfefato a Mucahill.

- Oh, meu Deus, você a encontrou. Teve dificuldades?

- Muitas. Você agora me deve US 5 mil. Deposite nesta conta até amanhã. Não falhe.

- Pode deixar. O que achou dela? Não é magnífica?

- Para mim isso é uma merda, só. Cuidado com ela.

- Por que?

- Um rosto desses eu não queria ter na minha parede.

Lane entrou no carro e se foi.

Willgston ficou no batente da porta, encarando a Máscara. Agora, com nojo.

A perversa hora em que nos encontramos na rua em breu

estou sentado nesta mesa
e vendo as pessoas caminhando
com seus objetivos em mente

no momento, posso observá-las
como peixes num aquário lodoso
vão apressadas
para fechar negócios
encontrar a amante
ou simplesmente beber
como faço agora

as pessoas são cretinas
no geral e perversas no particular
com suas vidas

deixam de ser felizes
- ou pelo menos tentar ser -
para perseguir ninharias,
imbecis, todas elas...

mal sabem que vivem no caos
e que seu próximo passo pode ser
no abismo

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

A Máscara de Mudaro 2 - Black Lane

Num beco da Falcon Street, um homem esperava a saída do último cliente.
Seria ele? Viria por ali?

Um vulto surgiu na escada de três degraus do bar de paredes de tijolos aparentes. Sem dúvida, era ele, pela identificação que Murdoch passara naquele fim de tarde.
---

- Hoje você não canta mais, Murder – dissera o detetive três horas antes - Se você tocar nesse telefone quando eu sair daqui, amanhã não terá aonde se esconder. O troço vai ficar estranho pro seu lado, entendeu?

- Não me ameace, detetive.

- Tome isso como um favor para mim. Mas, por via das dúvidas...

Black Lane arrancou, de pronto, o fio do telefone da parede e destruiu as junções da ponta com o pé.

- Por que você fez essa merda!? Eu não ligaria pra...

- Agora sei que não – disse o detetive.

Abriu a porta e saiu, deixando para trás um Murdoch desolado olhando para o telefone perdido, por hora.
-------

O sujeito caminhou por dez metros.

Ia superar o quarteirão do bar quando foi literalmente suspenso no ar e atirado dois metros para dentro do beco lateral. Bateu a cara numa depósito de ferro para lixo e rolou.

- Oh, meu Deus. Acho que quebrei o nariz... Puta-que-o-pariu.... Quem é...

Na sua frente o vulto enorme, envolto num sobretudo.

- Fildes Gramatius?

- Shhh... Esse não é meu nome nesta vizinhança... Por favor... Aqui sou apenas Joe Smith, que faz bicos como jardineiro... Você acabou com meu nariz...

- Nariz melhora, Fildes. O que não tem jeito é para a vida, que você pode perder agora se não disser com quem está a Máscara.

- Que máscara?

- Você sabe qual?

- Eu não sei de máscara nenhuma?

O vulto negro caminhou em sua direção.

- Espere... Espere um pouco - disse o falso jardineiro - A máscara. É, a máscara. Tem um sujeito chamado Mucahill, ele é traficante e, às vezes, me contata, para uns negócios...

- Que tipo de negócios?

- De venda de objetos raros.

Lane sorriu na escuridão.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

A Máscara Ancestral de Mudaro

Black Lane entrou no escritório de Murdoch Cold.

- Ora, ora, se não é o velho Black.

- Como vai, Murder?

Murdoch se mexeu na cadeira de couro negro e espaldar alto.

- O que você manda, detetive? - disse, sério.

- Preciso de umas informações sobre um tal de Mucahill, David...

- E o que você faria com essas informações?

- Isso é problema meu?

- Bem, a porta está logo atrás de você, Lane. Faça bom uso dela.

- Acalme-se, Murder. Não quero fazer mal a Mucahill. A menos que eu precise fazê-lo...

- O que você quer saber?

- Sei o que ele trafica da África. Quero saber para quem vende?

- Por que?

- Um cliente meu não recebeu uma mercadoria que encomendou há dois meses.

- O que, especificamente?

O detetive falou pausadamente, para checar a reação do agiota.

- A Máscara Ancestral de Mudaro.

Notou que o rosto de Murdoch ficou tenso, branco como cera.

- Peço que saia. Não quero assunto com isso. Esse jogo é arriscado demais.

Black Lane abriu um dos lados do sobretudo, ali havia um 38 prata num coldre.

- E pode ficar ainda pior se o canário não cantar, filho. Já estou sabendo que você financia, por terceiros, as operações de Mucahill na África. Nem tente negar isso.

Murdoch começou a suar frio. Olhou de soslaio para um dos lados da mesa em que estava.

- Nem pense em pegar o berro nessa gaveta, Murder. Vá falando... Me dê a lista dos compradores das peças. Ou dos atravessadores, que seja...

A estante morta neste dia turvo II

1
Certamente nem tudo está perdido, mas caminha para isso.

2
Às vezes o troço está tão ruim que´só nos resta ficar quietos.

3
A lesma e o homem são os únicos animais que deixam rastros por onde passam.

4
Cuidado, você pode ser o inseto no bico do pássaro.

5
Ler faz mal, pelo menos certos livros.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

o fim, agora não seria bom

esse negócio de promessa
- e quanto nos prometemos...
é um troço dos diabos
pois a vida nos pega pelo pescoço
e nos joga em todos os buracos e armadilhas
e vamos escorregando em merda
até o fim

nos transformando
geralmente em pessoas piores
do que aparentemente pensamos ser
- e bebendo para esquecer
o que somos

isso vale para qualquer hipótese
da profissão ao casamento
do trabalho ao lazer
da bebida à abstinência
até o fim
o fim
de nada

a penúria alheia que avança nas grades

somos feitos de nervos
carnes e ossos tão somente são
alicerce e concreto
somos constituídos é de fiações
por isso, não é errado dizer
"aquele sujeito tem uns fios soltos"

cada vez mais vemos pessoas assim
deprimidas, obcecadas, loucas, suicidas,
vagando pelas ruas,
com todas as suas carências

eu fujo desses indivíduos...
não sei você, amigo
já estou satisfeito com as minhas misérias
não preciso das de ninguém

"Dusquene, eu preciso lhe contar umas coisas..."
"Deixe para amanhã, camarada, hoje eu não estou num dia bom"

domingo, 11 de setembro de 2011

...

vocês que caíram
defenderam um modo de viver
o modo de vida livre
vocês que caíram
são hoje bandeira e legado
vocês que caíram
são o espírito da América

sábado, 10 de setembro de 2011

A loucura desaba sempre no meio da noite fria

sonho poucas vezes e ontem sonhei que estava no corredor de um supermercado
ia tranquilo empurrando o carro, dobro um dos corredores e lá está ela: uma alienígena, oferecendo copinhos de uma marca de café

a alienígena tinha um olho retangular enorme, me perguntou:
"Gostou da viagem sr. Dusquene?"
"Que viagem?"
"Para Altam, logicamente"
"Que conversa é essa? Estamos nos ..."
a linha fina que era o lábio da alien se expandiu, um risinho talvez
(não sei como, mas eu sabia que era fêmea)
- quando ela falava a linha ia para os lados e só
tinha dois braços como nós, mas verdes e que acabavam em pinças roxas
não vi pernas, bem que tentei, o tórax, sem seios, ia direto ao chão
"Bem, o senhor pensa que está na Terra, mas está em Altam"
"Dispenso o café, quero um uísque puro duplo"
"Não há bebidas alcoólicas neste planeta"
"Ótima droga de notícia. Vou fundar a Máfia por aqui. Como é seu nome querida?"
"Styxxx"
"Sei, pornô"
"Como?"
"Deixa pra lá, Styll. Posso lhe chamar de Styll, não posso? Quando sair do serviço você não gostaria de me mostrar o seu planeta?"
"Adoraria"
"Certo. Vou dar um giro pelos corredores. Que horas você sai?"
"Daqui a 582 horas?"
"O que?!"
"Nosso dia aqui dura 1.385 horas terráqueas".
"Eu preciso realmente de uma bebida agora, Styll. Vou procurar o Al do pedaço e fundar aquela sociedade de que lhe falei"

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

A merda nossa que vaza todos os dias - escritos de Dusquene (24)

é como se fosse uma noite de cães danados
a uivar para a lua
homens e mulheres vão aos bares
a festa se instala
e eu quero estar nela
dentro dela
com um copo
na mão

como cães danados saímos em matilha
e vamos nos mordendo e ferindo
mas sempre juntos

A ela

baby,
essa garrafa de tinto
nos convida a uma celebração
são tantas brigas, e isso é muito bom
aquece a alma, a vida

baby,
quem não ama não briga
quem não ama não se importa
e eu me importo muito com você
mesmo

eu,
eu queria ter um pouco mais de grana
para a gente fazer o escambau – e muito mais

baby,
só nunca se esqueça
que eu te amo

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

enquanto caminho, você vem

gosto de nossas brigas
gosto de ter você por perto
sempre

sempre vou achar que nossos
melhores momentos são nossas brigas
- pois elas realmente são ótimas
e esquentam

gosto desses anos de estrada com você,
você sempre, baby, nunca uma outra
só você

US$ 15.000.000.000.000, até o fim do ano

todo mundo se escorando no erário público
vamos pegar mais US$ 600 bilhões
emitamos títulos
quem paga? o erário

precisamos de US$ 300 bilhões para obras,
mas sem remanejamento orçamentário ou cortes...
quem vai pagar? o erário

o erário - essa caixa sem fundo
na qual o governo e a população enfia braços e mãos
arrancando maços e maços de dólares

um país que deverá US$ 15 trilhões até o final do ano deveria ter um pouco mais de respeito com o próprio dinheiro e não pensar no imediato, mas a médio e longo prazos

a geração de empregos talvez melhore com grandes investimentos governamentais em obras públicas - seguindo a cartilha de Keynes

mas o problema da dívida colossal de US$ 15 trilhões do Tio Sam passa por contenções orçamentárias profundas, pelo resgate maior de títulos públicos, para, lá na frente (dez anos, talvez), haver um crescimento mais robusto do PIB

mas quem será o primeiro abnegado a retirar o braço da garganta da caixa amiga?

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Black Lane - Capítulo 1, 2 e 3


Capítulo 1


Bateram na porta. Um sujeito trombudo entrou.

- É Black Lane?

- Acho que sou. Não tem mais ninguém na sala, não é?

- Tenho um serviço pra você, a mando de Maddox.

- Quem é Maddox?

- O chefão. O grande cara. Nunca ouviu falar de Maddox?

- Por que deveria?

- Tudo na cidade é controlado por ele. Do submundo às corporações e grandes firmas.

- Sei. Tudo bem. Qual é o serviço? Tempo é dinheiro, filho.

O brutamontes cerrou os olhos e disse:

- Ele quer que você arroche um sujeito que lhe deve US$ 30 mil.

- E por que você não faz isso mesmo por mim?

- Maddox não quer que seja uma coisa de dentro, entende.

- E por que Maddox está correndo atrás de US$ 30 mil se ele é, como você diz, o dono da cidade?

- Questão de princípio... Quem deve a ele, paga, de um jeito ou de outro.

- Vou pensar na proposta. Quanto levo nisso?

- US$ 10 mil.

- Considere o serviço feito.

- Não quer saber quem você deve apertar?

- Quem?

- Julie.

- Uma mulher!

- Não, é um homem, apesar de ter esse nome...

- Pior para Julie. Considere o serviço feito.

- Ele é da Gangue dos Cinco Estrelas.

- Aí a coisa complica. Encarar Julie, tudo certo. Mas o resto da turma...

- Bem que Maddox falou que você poderia recuar quando soubesse...

Black atalhou.

- Não sou covarde. Sou racional. Aliás, como é mesmo seu nome?

- Vicky.

- É, pelo visto você não pode mesmo ridicularizar Julie.


Capítulo 2


- Quero todas as informações sobre Julie. Preciso de um endereço.

- Kingsley, n. 189. Ele é um sujeito recluso, mas um dia pediu emprestado a Maddox. E ninguém deve a Maddox sem pagar.

- Acho que você já disse isso. O que mais você pode me dizer, Vicky?

- Por favor, me chame de Penido. Meu sobrenome...

- Realmente, se eu tivesse um nome desses eu não gostaria que me chamassem assim.

- De que? De Penido?

- Não, de Vicky.

O sujeito olhou Black Lane com má intenção.

- Acalme-se grandalhão, com o endereço já dá para começar... Avise a Maddox que quero US$ 5 mil adiantados. Depois que eu receber os US$ 30 mil de Julie vem os outros US$ 5 mil.

- Nada de adiantamentos, Lane . Recebemos os US$ 30 mil e lhe damos os US$ 10 mil. Afinal, você pode não ter sucesso. Mais uma coisa...

- O que é?

- Julie é o líder da Gangue dos Cinco Estrelas.

- Porra, esse troço está cada vez mais complicado.

Vicky ficou encarando. Sabia que o detetive estava cogitando se deveria pegar o serviço.

- Devo aumentar o preço.

- Sem essa. Paramos nos US$ 10 mil. Um terço é bom demais para você. Queremos o dinheiro por questão de princípio e...

- Sei, sei...

O velho detetive divisou o escritório. O arquivo escangalhado, com gavetas que mal encaixavam. A estante caindo aos pedaços. O piso que não via uma limpeza e cera há dois anos. O estofamento do sofá creme parecendo marrom de tanto uso e gordura, pois, além de escritório, aquilo era a sua casa. O frigobar sempre vazio...

- Fechado - disse por fim - Considere o serviço feito.

Pela primeira vez o detetive viu Vicky sorrir, levemente.

- Não vai ser tão fácil assim. Não tão fácil assim...

Abriu e bateu a porta do escritório, deixando Lane lá dentro, pensativo.


Capítulo 3


No dia seguinte, Black Lane colocou, por precaução, o 38 prata no coldre afivelado no ombro e peito. Vestiu o paletó azul escuro. Ajeitou a gravata. E fechou o escritório.

Dirigiu até a Trocadero e depois virou à direita, seguindo para o norte. Meia hora depois estacionava a cem metros do n. 189 da Kingsley.

- Bela casa você tem Julie.

Lane saltou do caro. Abotoou o paletó e caminhou até lá.

Tinha 61 anos. Mas ainda era um sujeito forte, que intimidava.

- Acho que não terei problema. Seja educado, Black Lane. Educação é tudo e um pouco mais nessas horas. Rígido, mas educado.

Subiu dois lances de escada e tocou a campainha.

Um minuto depois, um grandalhão, até parecido com Vicky, se mostrou no batente da porta.

- Quem é você? O que deseja?

- Preciso falar com Julie. Com urgência. É um recado do Sam.

- Não conheço nenhum Sam...

- O tio...

O pontapé foi certeiro. A muralha dobrou os joelhos, segurando os bagos com as duas mãos. O detetive o escorou na parede.

- Desculpe, filho. Mas você não me deixaria entrar mesmo. Economizamos tempo. Doe muito, mas é só colocar gelo depois.

Lane vasculhou o gigante, estava desarmado. Melhor.

- Desculpe novamente, filho – uma coronhada na nuca, o segurança apagou.

O detetive prosseguiu, passando por um vestíbulo até uma sala ampla, toda branca.

À direita, sentado em um largo sofá, estava Julie. Acariciava um yorkshire e via um programa qualquer na TV. O cachorro olhou curioso para Lane, porém não latiu. Melhor.

Julie, um branquelo louro de quase dois metros de altura, vestido todo de vinho, até os sapatos, fez menção de se levantar.

- Não faça isso – o detetive levou à mão ao paletó – Sente. Preciso de um favor seu, Julie.

- Eu não sou Julie.

- Não minta. Só um cara chamado Julie poderia ter um yorkshire de estimação e se vestir dessa forma.

Julie resignou-se:

- O que você quer?

- Que me empreste US$ 30 mil.

- Como?

- Maddox, lembra-se.

- Ahh, então tudo se explica...

- É, Julie, tudo se explica. E não me interessa muito você ser o chefão da porra da Gangue dos Cinco Estrelas. Enquanto eu possuir esse três oitão –
Black Lane tirou o revólver do coldre e apontou – Realmente pouco me importa.

- Calma aí. Como é seu nome?

- Nem queira saber. Levante as mãos, Julie, nada de apertar botões embutidos no cu de Ludmila, ou em qualquer outra parte.

- Quem é Ludmila?

- A cachorra aí do seu lado.

- É macho. Seu nome é Fulldrow.

- Para mim parece fêmea. E ter cara de Ludmila.

Pela primeira vez o cão latiu.

- E você fique quieto. O dinheiro, Julie? AGORA...

- Eu não tenho toda essa grana aqui.

- Tem sim. Caras como você sempre têm algum cubículo atrás da estante. Mostre o cofre.

- Você é um homem morto, seja quem for? Sabe disso, não sabe?

- Muitos já disseram isso. AONDE, Julie?

- Ali, atrás do vaso com flores. Tem um fundo falso, que corre para o lado.

- Vá na frente.

Depois de empurrar o vaso e o fundo falso.

- Abra o cofre e se afaste. Fique do meu lado direito. Qualquer movimento brusco, Fulldrow ficará sem dono.

Cofre aberto.

- Ora, ora, Julie. Ser chefe de gangue compensa não. Embora o crime... Conte esse dinheiro e ponha US$ 30 mil no envelope.

Black Lane foi colocando maços de notas de cem no vão da estante ao lado.
Julie começou a contar.

Feito o embrulho.

- Fico lhe devendo um envelope.

- Você não terá uma vida longa com ele e seu conteúdo.

- Também uns poucos já disseram isso, Julie. Venha cá.
Outra coronhada. E o tinto desabou.

Lane fechou o cofre. O cachorro continuava olhando. Cachorro estúpido.

Agora o problema era entregar o dinheiro sem ser assassinado por Maddox, Vicky ou Julie e os Cinco Estrelas. Ele não era o único culpado. Afinal, Maddox fora o mandante. Não sabia se Julie e sua turma teriam coragem para peitar Maddox, o dono do pedaço. Isto porque Julie parecia realmente dever ao figurão... Mas a gangue certamente iria querer acertar as contas com o executor da cobrança.

- Bem... – o detetive olhou pro envelope, conformando-se – Nunca gostei de Midrosville mesmo.

Entrou no carro, passou num posto, encheu o tanque e voou para a rodovia federal mais próxima.

domingo, 4 de setembro de 2011

Janso

já fui um rato de bar, confesso
eu e Janso
e outros, e muitos

Janso já morreu
negócio feio
começou a vomitar a bebida
apagou retornando
pro cubículo onde morava
morreu dias depois

tinha o riso fácil
grande sujeito o Janso
bom de papo e de gole
faz falta nesta mesa agora

Quem poderia dizer o que foi dito sob a marquise

1
É fácil identificar um idiota. Tem a certeza da segurança do chão sob seus pés.

2
Não escreva para ninguém. Nem para você.

3
Uma mulher inteligente pega cerveja pro sujeito no congelador.

4
A merda não é crescer, é o que fazemos da vida depois disso.

5
A velhice não chega a ser um mal, quando morremos.

6
"Não posso viver sem você, Fred. Me leva junto".
Mas quando Marion caiu na cova do marido começou a berrar:
"Me tirem daqui! Me tirem daqui!".

7
Dusquene, você realmente não presta. Concordo.

8
Os números não estão a meu favor. Aliás, nunca estiveram.

9
A convicção nas coisas é o maior erro que podemos cometer.

10
Não me encare. Não estou legal.

sábado, 3 de setembro de 2011

A caminho, mas sempre longe III

a droga do sol na cara de novo
é, Dusquene, você tem du-ra-bi-li-da-de
essa carcaça já aguentou muito tranco,
porres e ressacas assassinas,
são 47 anos na estepe,
camarada

pé no freio agora, que seus músculos não são mais os mesmos
já é outono para você, Dusquene, para os de sua geração
e o sexo também não é lá essas coisas, mas ainda é bom
ainda não preciso da pedra azul

a estepe é a rotina, que dissolve carnes e pretensões
- por incrível que pareça, hoje tenho dois pares de sapatos novos
essa a maior novidade da semana

por aqui a umidade do ar se mantém em 10 por cento
e os efeitos do vinho são potencializados
mas o tinto está do meu lado agora, grande companheiro
é, Dusquene, você tem du-ra-bi-li-da-de,
até quando... bem...



Black Lane

Bateram na porta. Um sujeito trombudo entrou.

- É Black Lane?

- Acho que sou. Não tem mais ninguém na sala, não é?

- Tenho um serviço pra você, a mando de Maddox.

- Quem é Maddox?

- O chefão. O grande cara. Nunca ooviu falar de Maddox?

- Por que deveria?

- Tudo na cidade é controlado por ele. Do submundo às corporações e grandes firmas.

- Sei. Tudo bem. Qual é o serviço? Tempo é dinheiro, filho.

O brutamontes cerrou um pouco mais os olhos e disse:

- Ele quer que você arroche um sujeito que lhe deve US$ 30 mil.

- E por que você não faz isso mesmo por mim?

- Maddox não quer que seja uma coisa de dentro, entende. Sou ligado a ele, na verdade, sou seu irmão.

- E por que Maddox está correndo atrás de US$ 30 mil se ele é, como você diz, o dono da cidade?

- Questão de princípio... Quem deve a ele, paga, de um jeito ou de outro.

- Vou pensar na proposta. Quanto levo nisso?

- US$ 10 mil.

- Considere o serviço feito.

- Não quer saber quem você deve apertar?

- Quem?

- Julie.

- Uma mulher!

- Não, é um homem, apesar de ter esse nome...

- Pior para Julie. Considere o serviço feito.

- Ele é da Gangue dos Cinco Estrelas.

- Aí a coisa complica. Encarar Julie, tudo bem. Mas o resto de seus colegas...

- Bem que Maddox falou que você poderia recuar quando soubesse...

Atalhei.

- Não sou covarde. Sou racional. Aliás, como é mesmo seu nome?

- Vicky.

- É, pelo visto você não pode mesmo ridicularizar Julie.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Uma notícia nada ruim na noite lenta

Entre no escritório. Vi Janso com a camisa empapada de sangue.

"O que aconteceu?”

“Fumava um baseado. Era curto. Vance pediu um tapa e eu neguei”.

Notei a mão esquerda enrolada em uma toalha.

“Como e por que?”

“Uma tesoura. Tinha uma mulher comigo, mas ela não precisava vir com tudo”.

Pela primeira vez vi o rosto de Janso Rubiratti nublado, vertendo ódio. Parecia tramar um assassinato.

“E onde está Vance?”

“Foi comprar uns troços na farmácia pro curativo”.

E completou: “Vamos ao Frank beber um uísque, pra acalmar”.

Apontei para sua mão ferida. Ele olhou o embrulho.

“O curativo que se foda”, disse.

E saímos pro Frank, com a toalha vazando.

A rombuda face de um mal que persiste

eu não tenho escolha
todo o dia me levanto, vou trabalhar
e dou de cara com uma multidão
que eu não queria ver

os rostos me deprimem
a sensação de inutilidade de suas vidas me deprime
a vaga lembrança neles de algo vago me deprime
até mesmo a suposta confiança que aparentam de querer prosseguir

caminho entre pessoas como mais um sacrificado,
fodido, malbaratado, estúpido ser das massas
penso: "bem, pelo menos, é sexta, não os verei por dois dias..."
não deixa de ser um alento, ainda com a possibilidade dos drinks no Salute a vida já não é tão ruim

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

O fato é o mesmo e sem razão alguma V

não briguemos mais por causas risíveis
a vida é maior que isso, baby
- ou talvez seja justamente isso
não percamos mais tempo remoendo o nada
que isso nada vale e perderemos um tempo
que poderia ser compartilhado com um drink
e uma boa conversa, leve, no sofá
eu massageando seus pés, você sentindo cócegas,
eu bebericando e você me contando, dizendo feliz,
notícias que eu não escuto

Um século nesta noite estranha

falo de coisas sem sentido
para que você entenda
falo de fatos que não ocorreram
porque estão em mim e em mais ninguém
para que você compreenda que a vida
é difícil, baby, e somos pessoas muito complicadas
eu briguento e cheio de manias, você louca e ansiosa

falo de coisas que nem mesmo vi ou vivi,
mas que sei, sei muito bem, pois com 47 anos
parece que já percorri um século

e, se você não buscar me entender
nem acreditar no que eu juro que vivi e senti,
está tudo muito bem,
mas você não serve para mim

Acomodação

Marilou tentou acomodar as coisas com Frank
começou a trabalhar como diarista em duas casas
suas costas doíam e ainda tinha que levar umas cervejas para Frank toda noite, e Frank não tolerava atrasos ou faltas
"Cadê minha cerveja, vaca?"
"Não deu pra trazer hoje. Só vou receber amanhã o pagamento da quinta-feira".
"Você é uma imprestável mesmo. Se eu não vir cerveja nesse frigo amanhã, o negócio vai feder para você".
E Marilou sabia que federia, e bastante.

Desproteção

"O que você fez no dia do furacão, Hunter?". "A coisa tremeu um bocado lá em casa, mas acho que bebi". "Bebeu? Você é maluco, beber numa situação dessas". "Mas o que eu poderia fazer. Não sai de casa. Então emborquei uns drinks". "Mas e se a coisa ficasse feia pro seu lado?" "Mas não ficou. Deu até para apreciar o bater da tempestade por uma greta do compensado". "Você protegeu as janelas e portas, então?". "É claro. Mas depois fui beber". "Você sabe a conta do prejuízo?" "US$ 7 bi e meio". "É, um troço sério". "É, John, sério".

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Sem título XXIX

deitaremos cansados de nossas vidas
apegados a antigos hábitos e tiranias
faremos da velha casa um lar
os filhos crescidos, independentes

e veremos, enfim, nossos sonhos dissipados
e passaremos mais uma vez por bancas de revista,
sapatarias, bancos, iremos ao supermercado e
passearemos, agora velhos, por rótulos e enlatados novos

é a mínima ascensão que nos aguardar,
muito além da voz pastosa da funcionária da mesa ao lado,
que não para de falar de coisas tolas, nauseantes

e iremos assim até o final do dia, do mês, do ano,
até o final dos tempos, em demência e compaixão,
cheios de lembranças de sonhos não resolvidos

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Upperfuração

Irene avançou por nove estados e inaugurou um novo tempo para a costa leste norte-americana. A tragédia pluriestadual. A tragédia que atinge um terço do país. A tragédia do trauma terrível e que, na lembrança, sobressaltará corações e mentes de 60 milhões de indivíduos a cada final de agosto. Irene é um nome eterno agora. Um nome de uma nova era, a era dos upperfurações.

Bullingan

Bullingan tinha um olhar pornógrafo
as mulheres se sentiam nuas diante dele
cada cruzar de pernas, cada nuance de quadril
Bullingan captava, apreendia, catalogava

as mulheres ficavam desesperadas, levando a mão
no meio das pernas, escondendo as mamas
mas muitas gostavam do olhar sacana de Bulligan
se havia as incomodadas, havia as lisonjeadas,
cheias de malícia e que estufavam as carnes para que
Bullingan pudesse apreciar melhor a paisagem

Bullingan tinha um olhar pornográfico
mas era impotente e só e bancário e nunca forçou nada
com Sally, Debra, Suzzy, nada com ninguém,
tinha um olhar pornográfico e só

domingo, 28 de agosto de 2011

A estante morta neste dia turvo

1
A merda é estarmos todos vivos ao mesmo tempo.

2
Ninguém merece o que não tem.

3
Sofrer? Vá à África veja o que é sofrimento.

4
Toda mulher é um estado de espírito estranho.

5
Morrer é melhor do que estar meio vivo.

6
Katrina, Irene... Ah, as mulheres de minha vida!

7
Foder às vezes não é melhor do que coçar o saco.

8
Vou quentando...

9
Toda mulher é um tédio depois de duas horas.

10
Dusquene, um dia a sorte lhe cai nos joelhos.

Sem título XXVIII

Glen chegou na rodoviária morta de forme
Mas quem a comeu foi a cidade dos Anjos
Glen queria uma vaga de atriz
mas o que conseguiu mesmo foi ser atriz pornô
Glen mudou de nome, juntou o nome de duas placas e fez um novo
Glen hoje faz e tem o que gosta: sexo e dinheiro
E Bill, o marido abandonado no meio-oeste, que se foda...

sábado, 27 de agosto de 2011

Uma boa hora para ir a lugar algum

posso perder, mas vou tentando
apesar de todos os revezes, das probabilidades contrárias
você é um homem comum, Dusquene, você não pode muito
mas o jogo prossegue, os dados continuam a rolar,
a sorte está no ar, um dia vou sentir seu cheiro
e não o da merda cotidiana

mas, se tudo der errado, se a sorte fraquejar e não conseguir me alcançar,
sempre haverá a possibilidade de ouvir Satisfation
a música do século 20 e 21, a tradução dos nossos últimos 40 anos
sempre ótima, com uma bebida na mão melhor ainda

bem, Dusquene, não custa parar agora e conferir o resultado...

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

A fé inabalável na velha amizade

Burns tinha um olho de vidro. O cara que fez a prótese sacaneou com ele. Fez o olho um pouco menor que o globo ocular.

Era constrangedor conversar com Burns. Ele me via no bar, arrastava a cadeira e sentava.

- Como vai, Dusquene?

- Tudo bem. E com você?

- Vou indo.

A conversa seguia. Eu pedia mais um drink. Burns outro. Sei lá, o músculo ocular relaxava depois de umas doses.

- O olho caiu, Burns.

- O que?

- O olho...

- Caralho! Aquele filho-duma-cadela me paga...

E a coisa ia assim, mais meia hora:

- De novo, Burns.

- Ahh?

Eu apontava para o meu olho esquerdo, que seria o olho direito falso de Burns, em imagem invertida.

- Porra, que merda! Desculpe, Duc.

- Não se preocupe. Não tem um jeito de colar?

- Você está brincando comigo, não é?

- Sei lá. Não entendo dessas coisas - eu disse - Esquece - e pedi outro drink.

A coisa foi abaixo novamente.

Dessa vez o olho de íris marrom escuro rolou pelo tampo da mesa e foi parar no chão.

- Passou perto de sua mão. Podia ter segurado.

- Desculpe, Burns, mas agarrar olho de alguém é demais para mim.

E levantei com meu drink.

Burns me olhou puto.

- Você é um cretino, Dusquene.

- Para algumas coisas realmente sou.

Antes de me dirigir ao balcão, lhe disse:

- Se eu fosse você recolheria logo esse olho. O proprietário gosta de passar um esfregão e...

Vi o olho restante de Burns aflito perscrutando o chão.

Um modelo de ser humano como crosta

já é ruim ter de levantar às 7 da manhã
e, como se isso não bastasse,
é preciso enfrentar a massa humana
a fila disforme de rostos, bundas, barrigas e quadris
gente compartimentada, o pior da terra

impossível não olhar a minha, a nossa conformação física,
que não é, de modo algum, das melhores

ontem mesmo um sujeito de 130 quilos ocupou dois bancos do metrô
fiquei olhando de cima e pensei em lhe sugerir uma cirurgia bariátrica,
mas fiquei na minha, só observando o mamute lendo jornal:
"Afinal, Dusquene, você não é páreo para confrontar tudo isso se algo der errado"

Magnolia

Magnolia tinha quase 160 quilos e arfava. Todos a olharam quando entrou no vagão. Vestia uma camisa amarela Dogs, jeans enormes e chupava umas balinhas, para segurar a fome até o almoço, acho. Dos lados das axilas as marcas de sudorese.

"Mag", disse uma magricela que a acompanhava, "não vai se sentar?". Mag fez menção de sentar ao meu lado. Mas meu olhar a intimidou, acho.

OK, JFK

Aquela frase do Kennedy “não pergunte o que o seu país pode fazer por você, mas o que você pode fazer pelo seu país”, ou algo parecido, realmente ninguém levou a sério. Hoje os Estados Unidos devem US$ 14,3 trilhões, todo o seu PIB, com a farra impulsionada nos anos 80. Todo mundo mandou o Tio Sam segurar o sobretudo. Babau JFK.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

sem a menor importância

há pessoas sem a menor importância para a paisagem
no conjunto, são as que nada almejam ou as que estão contentes com a sua rotina
são pessoas inexistentes por si
que nada dizem a que vieram, apenas ocupam espaço
e eu as vejo todos os dias nas ruas, nos edifícios, no trabalho
e penso: "como pode? e há um cu nisso"

são pessoas que exalam cheiro de criança recém-nascida
ou seja, o cheiro inconfundível de uma espécie de conformismo,
dos que se sentem seguros neste mundo louco,
e eu as vejo todo santo dia e continuo a pensar: "e há um cu nisso".

Sem título XXVII

foi no dia do terremoto
as pesssoas saíram dos prédios
e olhavam para cima
e pensaram em atentados terroristas
Virgínia tremeu, 5.8 e mais tarde 4.5
na escala Richter, ou algo parecido
a Costa Leste abalada, o fim dos tempos
danos na Catedral de Washington
quem sabe o terremoto não é um aviso?
políticos comecem a se mexer
resolvam o déficit público anual
ponham o mundo em movimento de novo
porque os grandes bancos
estão anunciando demissões
porque a Europa patina em dívidas
como o próprio Tio Sam; sei que a margem
de manobra é pequena, mas deem um jeito, OK

enquanto isso os tremores mexeram
o limão na vodca de muitos

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Canto do jovem homem enfermo

lá vai a silhueta de um homem só
carregando o peso de ossos e carnes
passa por prédios e galerias
vai no frio da manhã cinzenta
o homem tem asma, e tosse,
tosse agravada pelo cigarro
é jovem ainda esse homem
e está se formando e está bebendo
e deseja ser um escritor, só isso,
mas o mundo é repugnante e prefere
ler os idiotas, os que vendem,
mas ele ainda escreve muito mal

vai longe agora a silhueta de um homem só
enfrentar mais um dia de trabalho estéril
manchar seus dedos com a graxa roxa dos carimbos
intoxicar-se com vidas imprecisas, sem pauta,
com os risos de tantos rostos felizes e tremendamente sós

Fence Boulder

Eu não mexeria com Fence Boulder se fosse você, amigo
Fence já retalhou cinco sujeitos no Colorado
Fence se inspira no sol, na terra e no ar
e vive de acordo com o instinto, o que é ruim
Fence não quer conhecer ninguém ou ter companhia
Fence é rude porque nunca bebeu na vida
o velho Fence Boulder do Colorado

Ele foi visitar Maryanne e ela não estava em casa
Ela escreveu que não aguentava mais a solidão e se foi pro Alabama
encontrar um homem bom, protestante e sincero
Fence Boulder cuspiu de lado e não deu muita importância
teria as mulheres que quisesse, sempre ou não

Eu não mexeria com Fence Boulder agora se fosse você, amigo
Esse homem sabe o que quer da vida, e sujeitos assim são perigosos
Ninguém sabe muito bem o que fazer, mas ele realmente sabe aonde deseja ir
e isso, de certo modo, será temerário para uns e outros que atravessarem seu caminho


domingo, 21 de agosto de 2011

todos os sonhos morrem às sextas-feiras

A velha Mildred gostava de colocar uns vasos com plantas no parapeito da janela. Gillmore alertava Mildred.

"Qualquer hora um troço desses balança, cai e faz um estrago na cabeça de alguém. Se for comigo, as consequências serão graves...".

"Você está me ameaçando? Vou telefonar para a polícia".

"Dona, telefone para o escambau. Eu já lhe dei o aviso".

Um dia aconteceu. Um dos vasos com gerânios despencou e estatelou no piso da entrada, bem na hora que Gillmore saia pro trampo. O adubo negro do vaso cobriu as barras de sua calça creme e penetrou nos sapatos. Uma merda só. Gillmore olhou para cima e viu Mildred assustada, segurando um vaso que ameaçava cair.

"Eu lhe avisei", disse ele.

Gillmore abriu com força a porta do prédio de três andares, sem pilotis.

O que se ouviu depois foi o baque surdo de porta escancarada a pontapés, os gritos de Mildred e o barulho de vasos se quebrando no 279.

"Você é louco. Um homem insano aqui. Minhas azaleias, meus gerânios! Oh, meus pobres gerânios...".

Mas Gillmore continuava, firme, a destruir os jardins suspensos.

sábado, 20 de agosto de 2011

O inexplicável momento de nada dizer

A velha Mildred gostava de colocar uns vasos com plantas no parapeito da janela. Gillmore alertava Mildred.

"Qualquer hora um troço desses balança, cai e faz um estrago na cabeça de alguém. Se for comigo, as consequências serão graves...".

"Você está me ameaçando? Vou telefonar para a polícia".

"Dona, telefone para o escambau. Eu já lhe dei o aviso".

Um dia aconteceu. Um dos vasos com gerânios despencou e estatelou no piso da entrada, bem na hora que Gillmore saia pro trampo. O adubo negro do vaso cobriu as barras de sua calça creme e penetrou nos sapatos. Uma merda só. Gillmore olhou para cima e viu Mildred assustada, segurando um vaso que ameaçava cair.

"Eu lhe avisei", disse ele.

Gillmore abriu com força a porta do prédio de três andares, sem pilotis.

O que se ouviu depois foi o baque surdo de porta escancarada a pontapés, os gritos de Mildred e o barulho de vasos se quebrando no 279.

"Você é louco. Um homem insano aqui. Minhas azaleias, meus gerânios! Oh, meus pobres gerânios...".

Mas Gillmore continuava, firme, a destruir os jardins suspensos.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Blind Tom

Blind Tom tocava música de ouvido
Blind Tom ouvia a música e reproduzia na hora
Blind Tom tinha deficiência mental
Blind Tom, depois de tocar, batia a cabeça na parede até sangrar
Blind Tom era negro e pobre
Blind Tom realmente existiu
Blind Tom morreu com seu dom
que de nada lhe valeu,
pois jamais soube que fazia
essa mágica

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A lua sob os escombros do meu ser, linda como a queda de

a lua vai nos deixar um dia
daqui a bilhões de anos, dizem
mas, agora, olho para ela
e ela é minha

a lua e suas rugas fundas...
é, eu estou mais uma vez bêbado
e o poema sai assim mesmo
cheirando a tinto barato
e seco

emborco mais um gole da garrafa
- o caralho as boas maneiras
só eu, a garrafa e essa lua absurdamente fêmea
mulher canalha, traçoeira
mulher que eu tenho
mulher, porra,
mulher


quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Sem título XXVI

estou mal para escrever um poema, qualquer poema
realmente não quero escrever sobre nada hoje
nada que faça sentido para qualquer um

as muralhas das cidades são um poema a céu aberto
seus edifícios espelhados, as ruas em tumulto,
o trânsito infernal, a umidade de deserto,
a fuligem, o desespero, o desarmor, a urgência irrefreável,
o cansaço presente em tudo, nos cartazes
nos comerciais, nos noticiários...

qualquer poema, portanto, seria mais um entre milhares, entre milhões
seria cair na rotina, como cerveja choca em garganta seca
enfim, algo sem propósito, sem endereço, sem pegada,
e eu não desejo nenhum mal para vocês:
nem o mijo do cachorro do vizinho,
nem um mau poema

A solidão de um homem acompanhado

"Você pensa que é melhor que eu, Dusquene?". Eu olhei para o bebum. Virei o rosto e voltei a beber o uísque. "Estou falando com você, seu pulha". Continuei bebendo. "Você é uma craca no mundo, Dusquene". Virei de novo e voltei a encarar o sujeito. "Dusquene, eu vou morder seu cu um dia desses". E eu ouvindo aquilo. O cara estava bêbado, certamente. "Você é um bosta, Dusquene. Uma grande bosta!". Definitivamente o sujeito queria briga. "Vá se foder, Duc. Seu escritor de quinta categoria. Seus escritos são um estorvo para a humanidade". Não aguentei mais. Entornei a dose e sai do bar, prometendo nunca mais beber diante de uma parede espelhada.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Fante, Fante, todo Fante

1933 was a Bad Year
Bukowski resgatou essa novela incrível
Fante no manuscrito
esse livro de Fante inédito até 1985
O Braço inédito, o arremesso feroz
os sonhos de uma América em plena Depressão
tudo tudo todo ali
naquele livro maravilhoso

eu sou, quem não é, Dominic Molise,
dos Molise, de Roper, Colorado
Santo John Fante, Santo Fante
que mostrou o texto real, verdadeiro

você me fez querer ser Santo,
Santo, Santo, Fante heroi da América
"enfim, encontrei um grande homem,
alguém que não teme a emoção"

Fante redescoberto por Buk
Fante Santo Arturo Santo Santo Bandini
1933 was a Bad Year
só foi para você, Dom Molise,
para quem lê é a América, ingênua,
e fiel a seus filhos

domingo, 14 de agosto de 2011

Miragem de uma vaca na estrada do desconhecido

a semana é sempre em perspectiva
pode ser uma droga - e geralmente é -
ou nela chegar a Fortuna, essa prostituta linda,
e ela poderá finalmente mostrar a calcinha para você

confie, Dusquene, aprenda com os dias ruins
dias de insolação, urticárias e dor,
de suor esfalfante, de pragas e insânias
de nada

lembre-se que haverá sempre a possibilidade
do tinto e do relax, da sorte sentar em seu colo

"E aí, mulher, como você cê chama?"
"Rebecca Money".
"Sobrenome interessante, Reby, Aceita um copo?"

E ela aceita e ela põe a língua fria na sua boca
e, com a mão macia, pega o mangalho, já teso.
"Hoje a sorte sorriu pra você, Duc".

E ela sorri aqueles belos dentes de pérola
na moldura do carmim intenso.
"É, baby, eu merecia um descanso das trincheiras".

"Então, Reby, como vai ser? Onde assino para receber a grana?"
E ela me mostra um pergaminho antigo,
retirado da liga preta de sua perna direita.
Ela toda de seda azul, perfeita, maravilhosa...
"Aqui, no pontilhado".

Ao colocar a caneta na linha indicada, eu noto
a expressão no meio do texto, diminuta, mas logo acima.
"e assim ele concede sua alma".
"Porra, de novo essa história de alma, Reby".

Mas quando eu levantei os olhos a puta havia sumido.
E eu ali, no quarto, segurando a caneta verde-enxofre
com o zíper aberto e o pau penso.

sábado, 13 de agosto de 2011

A merda que vaza aos sábados, incapaz

1
"Vó, a senhora ainda trepa?"
"Não. Mas ainda chupo".

2
A finalidade de toda mulher é fazer um homem infeliz.

3
Quem sai aos seus, geralmente degenera.

4
"Filha, que cê quer de aniversário?"
"Umas bolinhas interessantes que vi outro dia".
(...)

5
Um homem largado na planície, é assim que me sinto o tempo todo.

6
"Os velhos têm ainda o que esperar da vida...".
"É, diabetes e morte".

7
Ninguém é decente as 24 horas do dia. Nem quando dorme.

8
Pobreza não é um estado de espírito, é de bolso.

9
Foder é essencial. Ter filhos, totalmente desnecessário.

10
Uma grande mulher geralmente escolhe um péssimo homem.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Sem título XXV

as ruas são ásperas e isso é salutar, necessário
porque, bem ou mal, nos tornam rijos
preparados, alertas

eu já trabalhei em muito emprego
vagabundo, tedioso, enfrentei barras,
mas valeu a pena, sempre vale

isso me fez criar um crosta, uma espécie de proteção,
o que não é insensibilidade, mas lógica
- é, posso dizer assim

o homem que caminha solitário na planície,
o sujeito que bebe e já conversou com suicidas
tem realmente uma defesa a mais -
será? Bem...

não sei, mas me vejo mais preparado,
com uma pegada melhor, um jogo mais ligeiro,
com mais raiva e serenidade, talvez

as ruas moldam a personalidade de quem as aproveita,
fazem do ser humano algo melhor ou pior, é certo,
e quem não convive e não aprende com elas
meio que não se forma todo verdadeiramente

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Um quadro feito da beleza que não existe em qualquer lugar

essa mulher é a beleza passando
diante de meus olhos cansados
ela me daria um bocado de trabalho
mais eu a faria feliz

eu lhe ofereceria um drink e lhe daria um beijo na nuca
falaríamos de pássaros, peixes e cães
eu perguntaria sobre a sua vida
ela me diria pouco
eu pouco falaria
também

eu guardaria a sua beleza triste, mas voluntariosa
nesse quadro impressionista
do meu amor de ontem
que ontem vi

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Um conversa de peso sobre a sucessão dos dias

"Mulheres grávidas são interessantes, Dusquene". "Por que?". "Você pergunta a elas: quantos meses de gravidez?" "E daí?" "Daí ela lhe diz 'quatro meses e duas semanas'". "Sim , e o que tem isso?". "Bem, você fica sabendo então que há quatro meses e duas semanas ela FODEU, FODEU LEGAL". "Como?" "É o único momento que você TEM A CERTEZA ABSOLUTA da foda de uma mulher, tirando os vídeos pronográficos, logicamente. Pense nisso, Dusquene". "Bullford, você é maluco. Suma da minha frente".

A pálpebra meio aberta me confunde

eu sou intratável
no trabalho as pessoas me olham de esguelha
pensam que sou um alienígena
e isso é bom

quanto menos contato eu tiver com a Humanidade,
melhor para mim e para ela,
sei que sou uma bolha de raiva
e impaciência

a idiotia das pessoas me incomoda
mulheres grávidas me incomodam
pessoas no metrô me incomodam
o sol entrando pela cortina
me incomoda muito

um dia Dóris me falou:
"Dusquene, você é quase um ser humano"
gostei do elogio,
gosto de Dóris

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Eu e ela em meio ao tédio infinito

o risco é sempre estarmos vivos
e nos aborrecermos mutuamente
- o que é sempre inevitável

é nos detestarmos mais a cada dia,
a cada gesto, a cada olhar, a cada visita, no caos
de tudo e todos

estamos de saco cheio
uns dos outros,
admitamos...

fora os parentes, os vizinhos,
os cachorros mijadores e cagadores,
as mulheres que vivem vidas por meio de novelas,
fora a maldita velha que tosse e tosse e tosse
enfim, fora a grande bola de merda
feita de tudo isso e
que sempre vem
em nossa
direção

por isso, baby,
fique um pouco quieta,
só olhe aquela grande lua e
estas bebidas em nossas mãos
vazias de carinho

The good mother

“O que é isso, Fred?”. “Não é nada, mãe”. “John, venha ver o que Fred tem nas duas mãos!”. “Mãe, não chame o pai, que eu levo uma surra”. “O que você bem merece, seu indecente”. Por fim a mãe se acalmou. “Jogue isso no latão dos fundos. Tire a gosma das mãos e da boca e venha jantar”. Às 21h, com o jantar terminado e John vendo o noticiário com Fred na sala, a mãe foi sorrateiramente tirar o objeto jogado pelo garoto na lata do lixo. Aquele cone de duas polegadas teria algum proveito.

Bill Jean

Por que Bill Jean seus olhos estão vidrados?
Por que seu pai lhe deu tantas surras?
Por que falhou a promessa da boa infância?
Por que a morte chegou tão prematura, vã?
Por que essa claustrofobia em ruas estreitas?
Por que não existe qualquer fé em seu coração?

Por que Bill Bean? Por que?
Por que um muro tão alto, cinzento, chapiscado e frio?
Por que Hiroshima não ocorreu em seu bairro?
E por que seu pai lhe deu tantas surras?
E por que sua mãe olhou para o lado e chorou, um pouco?

O mundo é muito injusto Bill Jean,
muito, muito injusto,
mas você tem certa culpa
por ter nascido num lugar tão ruim
é, Bill Jean, não chore agora,
mas você tem


sábado, 6 de agosto de 2011

No more, no more

"Mulher feia está no último lugar da cadeia alimentar, Duc" (...) "O caralho que é assim. Não quero mulher feia na minha pintura. De jeito nenhum" (...) "Deixe disso, Dusquene...Tá, algumas se maquiando, passam. Mas a maioria deveria ser sacrificada. Só representam cagadas a mais no vaso" (...) "Não. Eu não acredito em compaixão. Só sexo, sexo pesado, mano. Nada de papai e mamãe comigo. E com as feias, não dá, não rola" (...) "Vá se foder, Dusquene, respeite minha mãe"

Por que eu me sinto tão mal

estamos meio perdidos nessa terra de ninguém
sem objetivo algum
só quentando o rabo no sofá
e esperando que algo aconteça
ou um copo de cerveja nos chegue às mãos

é um troço esquisito esse tédio
não sei o que vocês fazem
para confrontá-lo
- eu escrevo poemas
e tenho uma novela "Moto Continuum"

realmente não sei mais o que eu posso fazer
ou querer, ou ter, sei lá
as coisas precisavam fluir mais rapidamente
eu precisava querer mais até
- porém não quero nada,só quentar ao sol de agosto

é difícil não ter uma meta,
mas qualquer meta e merda dá na mesma
no final tudo fica extremamente ridículo
e sem sentido, de qualquer forma

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Diário de um esquecimento

as pessoas me incomodam
só de vê-las passo mal
sinto náusea

é um negócio meio doido
mas realmente eu não gosto de gente
prefiro ficar na minha
vou ao bar pela bebida
não para di-a-lo-gar

vão todos se foder
- e que eu me foda também

aquela piranha não me dá há meses
mas vive no motel com um outro qualquer
- é, Dusquene, você vai de mal a pior

é foda
gente é foda

Aquilo que é bom e nem é tanto II

Eu não suporto mulheres que falam demais. Acho que um dos requisitos essenciais de uma mulher é falar na medida certa. Tinha uma dona no meu terceiro emprego no almoxarifado da Ummus que não parava a boca. Era um troço medonho ver aqueles lábios finos se movimentando. A mulher dava um leve "bom dia" e daí começava falando dos últimos acontecimentos políticos, da trama dos seriados da TV, da merda do presidente, da lata de lixo que ruiu de velha, do cachorro do vizinho que latiu a noite toda, de mariscos e polvos, das adolescentes que abrem as pernas por nada, etc, etc, etc.

Gillmore ficava só olhando Wilna falar. Jurava pra todo mundo que ia fazer aquele canário calar. Eu fiquei na minha, mas anotei a ameaça. Gillmore não aguentava mais. Trabalhava numa mesa ao lado de Wilna e era ele quem recebia o maior impacto.

Num final de expediente, lá pelas 21, sirenes de polícia e o escambau no pátio. No final da última fila de prateleiras do setor encontraram Wilna toda ensanguentada, com Gillmore sentado a seu lado, escorado na parede, com uma espécie de cano de metal nas mãos.

Ele simplesmente olhou para os policiais e falou. "Eu amo essa mulher. mas ela não para de falar. Quebrei-lhe os dentes".

E Wilna ali, babando sangue, sem dizer uma única palavra.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Aquilo que é bom e nem é tanto

todos os bares estão fechados
todas as gargantas estão secas
e o tédio ronda
esta segunda-feira

a TV novamente não tem nada que preste
e ainda tenho quatro cervejas a meu serviço
e não há por que não bebê-las

a maquinaria da noite
envolve luzes de postes longínquos
como borrões impressionistas
e os bares mantêem-se fechados

só há a certeza da terça-feira
e que o fim de semana avança
- e eu que detesto todos os fins de semana
que são como bocas velhas
fluindo seu esgoto sem dentes

é...
só me resta cair de pau
nessas garrafas
e rezar para amanhã ser
um bom
e rápido dia

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Poema da morte prematura

ei, baby,
vamos pegar as flores
que secaram antes das lágrimas

vamos andar nos campos
vamos correr para a última estrada
onde não tem mais coisa alguma de ninguém

ei, baby,
que tal fazermos algo que valha a pena
morrer em uma tarde de junho está fora dos planos

ei, baby,
então vamos fazer uma coisa louca
que tal sermos felizes, um pouco, só um pouco, agora

domingo, 31 de julho de 2011

Algo que pensei e por que não dizer?

Se o inferno me espera, quero ficar mais um pouco
Até que o desamparo de minha pobre alma acabe
Entre as pernas de uma mulher de coxas claras, macias
Entre gemidos e bebidas e pássaros longe, muito longe...

Otto Dusquene

Uma rodada de uísque, cartas e pragas

"Ninguém morre às sextas-feiras. É um dia ruim para morrer".

"É, eu sei. Mas a esposa de Fred morreu e ele não virá para o carteado".

Dougall resmungou um pouco, se acomodando melhor na cadeira. Prazze ficou puto.

"Acabou com o nosso jogo, porra. Sexta-feira realmente não é dia de entrar no saco".

"É , mas temos que dar os pêsames a Fred".

"Como a mulher morreu?"

"Soube faz dez minutos. Foi assassinada pelo amante".

"Como é? Fred quem lhe disse?"

"Não. Um conhecido. Ela transava com um corretor de seguros há dois anos sem Fred saber".

"E Fred soube?"

"Soube e perdoou a mulher. Aí ela informou ao corretor que não iria mais foder com ele. Trepavam todas as sextas à tardinha, justamente quando Fred vinha pro carteado. Ele sempre confiou cegamente em Irene".

"E daí?", perguntou Prazze a Rufus.

"O amante não se conformou e peineirou ela. Cinco tiros, duas horas atrás. Disse que queria dar a última nela como despedida e peineirou ela num motel da 7ª".

"É, mas isso não é motivo para Fred faltar ao carteado. Porra, essa noite é sagrada, merda!", disse Prazze, resumindo o que todos, na verdade, estavam sentindo.

"Quer saber? Quem é corno que espere. A mulher já está morta mesmo. Vou ligar para o Vicent para ver se ele vem substituir o Fred".

"É. Ótima ideia", disse Dougall.

sábado, 30 de julho de 2011

ainda terei um dia de sorte

ainda terei um dia de sorte
um dia os números irão colar em mim
como percevejos ou pulgas

e eu abrirei um champanhe
e brindarei comigo mesmo:
- Dusquene, você venceu!

colocarei uma boa grana no banco
comprarei uns troços
talvez até um livro
- um livro? de quem? para que?

comprarei uma espreguiçadeira
e colocarei no meio da sala
que terá também um frigobar
e ficarei, ali, quentando ao sol
- Afinal, Dusquene, você venceu!

talvez até compre um binóculo
para espreitar a vizinhança
ou a lua ou a ponta do meu caralho
- Porra, Dusquene, afinal você venceu!

mas enquanto os números não caem no meu colo
é melhor eu acordar, me vestir e encarar Wilson,
o maldito chefe com cara de águia da expedição

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Cada um com a sua merda infanticida

"Como é que você se sustenta?"
Você é o que você fez ou continua a fazer
Bukowski fazia essa pergunta essencial

"Amigo, como é que você paga suas contas?"
Ele dizia que, nessa pesquisa particular,
observou que quem pagava as contas geralmente era a mãe

O cara tem 25, 30 anos e está ali,
sorvendo os pais como canário novo
Um tremendo filho-duma-puta

Os pais ficam ali, olhando de lado,
praguejando ter um filho assim
A mãe quer jogar carteado com as amigas
O pai arrumou uma putinha e quer comer por fora
e Wilson ali, esquentando os ovos no sofá,
vendo o último filme do Woody Allen

Duvido se os pais, mentalmente,
não queimam o dia do nascimento do garoto no calendário
"Merda de dia...", sussura o velho. "Que foi, pai?"
"Nada, continue vendo a porra do filme"

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Sem título XXIV

vá aos lugares sórdidos de sua vida
enfrente os seus demônios logo, homem
afaste todos os seus medos
diga um "foda-se" ou deixe tudo como está

mas, finalmente,
caminhe do lado da calçada que você realmente quer
com destino a um bar ou outro lugar qualquer
se achar algo melhor

mas vá, não espere mais, vá logo,camarada,
que a vida é rápida como um ladrão
e as bebidas e as mulheres não estarão sempre
disponíveis para você

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Um estranho caso de amor ao meu lado

Abri a porta. Na minha frente estava Walker, meu vizinho.
"E aí, Walker?"
"Só vim lhe informar que comprei uma boneca de plástico".
"Como é?".
Walker tinha 55 anos e me encarou com os olhinhos maliciosos.
"Caso cê queira pra alguma coisa".
"Tudo bem, Walher. Se eu precisar bato na sua porta".
"Fiz uns ajustes nela".
Fiquei curioso.
"Que ajustes?".
"Uma boca. A mulher veio sem boca. A merda dessas encomendas pelos Correios. Imagine, Dusquene... Como uma puta paga um boquete sem boca?"
"Realmente é um problema".
"Ela já me pagou sete boquetes desde sexta-feira".
Walker riu, mostrando os dentes amarelados.
"Se precisar, eu e Amber estamos à disposição".
"Se eu precisar, Walker, só vou precisar da Amber".
"Tudo bem, Duc. Tamos aí".
Quando Walker abriu a porta para entrar no 413, vi de relance sua amante estirada no sofá. Era uma loura de belas tetas.
Fechei a porta e volte pro quarto.
Marion dormia na cama.
Uma boa bunda sob os lençóis.
Pensei em fazer alguma coisa com aquilo.
Depois lembrei que Amber era mais ativa.
Marion tinha me agraciado no máximo com uns quatro boquetes na vida.
Já Amber...
Walker era um sujeito de sorte.

terça-feira, 26 de julho de 2011

O caralho que eu acredito, se mexe Sam

Os Estados Unidos devem US$ 14,3 trilhões
Mas ninguém quer realmente apertar o cinto
Ninguém quer realmente cortar gastos
Só elevar o teto da dívida
Acrescentar e cortar o mesmo, dá zero pelas minhas contas

"Tudo bem. Aumente aí. Ponha o teto em US$ 16,3 trilhões"
"E prometa cortes"
"Tá bom que eu acredito. Sociedade perdulária..."

Quando é que o Tio Sam vai começar a pagar o que deve?
Quando vai reduzir drasticamente o seu déficit?
Quando é que Sam, como disse Ginsberg,
Vai mandar seus ovos para a China?

Foi China que o Gins falou? Não foi?
Acho que foi Índia...
Bem, se não foi, está dito

O lado negro de um moribundo bebum

A merda de sentar todo o dia numa mesma mesa de escritório é que você podia se deparar com Sonja. Ela falava mecanicamente. "Por favor, sr. Dusquene, o senhor poderia agregar essas planilhas de auxílio doença às que o senhor já tem para calcular?". "Tudo bem, Sonja, coloque". "O quê?". "Coloque do lado desse monte aí na sua frente". "Gostaria, por obséquio, que o senhor desse prioridade a essas planilhas, porque são de funcionários nossos". Ergui os olhos. "Sonja, aqui não tem como passar a fila", falei consciencioso. Ela encheu o peito. "Senhor Dusquene, o senhor é um funcionário exemplar. Realmente exemplar". "É, Sonja, eu procuro ser. Que tal almoçarmos hoje, hein?". Sonja tinha belas tetas e pernas e um traseiro que deveria aguentar bem o mangalho. Ela topou.

Um troço sério da infâmia acesa

Ninguém pode começar um romance se trancando num apartamento para escrever. Isso é neurose. É doentio. Escrever deve ser um troço automático. Vivencial. O cara que elabora demais o texto pode ganhar no estilo, mas o que produzirá morrerá na estante fria.

Prefiro escrever o que me vem na cabeça na hora, porque sei que essa é a minha verdade, mesmo que momentânea. Não adianta o cara sentar no computador e pensar: "Hoje vou escrever o grande poema americano do século" ou "Começarei hoje uma novela espetacular".

Não falo daqueles escritores que fazem uma grande ficção. Não. Falo dos escritores comuns que pouco têm a oferecer, além de uma dura realidade, de sacanagem e poemas com mulheres e bebidas, como eu.

Afinal, o troço bom é isso mesmo.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Sinceramente

sinceramente
eu não acredito em nada do que vocês dizem
eu não vou mudar meu jeito de viver
eu não vou andar do outro lado da calçada
eu não vou fazer nada disso
não vou seguir o plano B ou C
nem vou gravar o terceiro álbum
sinceramente

eu não quero nada disso
palco, fama, dinheiro ou gozo
eu só quero é ficar na minha
sem olhar o mundo da vidraça
quero só matar o tempo
fazer coisas que vocês julgam idiotas
coisas que jamais fiz e que lamento

sinceramente
eu não acredito em nada do que vocês dizem
eu não vou mudar meu jeito de viver
eu não vou andar do outro lado da calçada
eu não vou fazer nada disso
não vou seguir o plano B ou C
nem vou gravar o terceiro álbum
sinceramente

eu não quero romper a aurora
palco, fama, dinheiro ou gozo
eu só quero é ficar na minha
sem olhar o mundo da vidraça
quero só matar o tempo
fazer coisas que vocês julgam idiotas
coisas que jamais fiz e que lamento

sábado, 23 de julho de 2011

To Amy

eu já me recuperei, baby
não precisa mais cuidar de mim
fique tranquilo, vá, siga a vida
vá em frente e nem me olhe
antes de dobrar a esquina

eu já me libertei, fique tranquilo,
vá, siga a vida, deixe que eu cresça
sem você ou caia de vez no nirvana
mas eu preciso de um espaço
e você não pode me seguir

vá, baby, vá
e nem precisa me olhar antes de dobrar a esquina

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Grande pequeno homem

grande pequeno homem que anda na rua
você aí, meu chapa, que jamais irá à Europa
você, que gosta dos bares e detesta TV
você, que não tem qualquer paciência ou chance
grande pequeno homem

você sabe que joga contra dados viciados
você, que não tem qualquer controle sobre a dívida,
você, atirado no buraco do cu da crise americana
grande pequeno homem que, aos berros,
vomita por todos os poros

grande pequeno homem que atravessa a rua,
depois de empacotar mil mercadorias em um supermercado
e tomar vários tragos no bar e ainda levar uma garrafa,
você merece um pouco de serenidade,
um pouco que seja, fugir de tudo,
se desvencilhar do abrangente nada
da torpeza humana

a minha solidariedade não importa, não vale coisa alguma
não resolve os seus problemas,nem os meus,
mas, sei lá, eu precisava dizer estas palavras

Paisagem fosca em meio ao clarão

ando pela rua e vejo o que vejo,
subo as longas escadas do Marítimo,
só me resta beber urgentemente
enquanto as vagas seguem em melancolia

ah, um bar, um fim de tarde,
mulheres com belas pernas chegando
e um copo com uísque e gelo suficientes

a vida pode ser até tolerável,
pode ser até decente
para um homem,
quando ele não agoniza
em um escritório,
queimando num trabalho
ordinário

- Garçom, mais um aqui.
- Certo, Sr. Dusquene.

agora, depois de duas horas,
o sol desce no horizonte,
ligo para minha fonte para
saber o que deu no primeiro prêmio

tudo laranja-amarelado
gostei do bar, realmente gostei,
fica sobre uma plataforma,
sem prédios em volta,
bom para beber
na véspera de uma folga,
que bem mereci

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Sem saída num dia quente de maio

"Sei de umas coisas, mas acho que não vou lhe dizer, Dusquene". "Ah é? O que é, mano?". "Eu converso com o Grande Deflorador todas as noites". "E o que ele lhe diz?". "Que todas as mulheres me pertencem". "É". "E que ele somente permite que os outros as desfrutem - ou melhor, fodam - para a propagação da espécie. Mas todas me pertencem. É certo". "Então, obrigado por me emprestar a minha mulher". "Tudo bem. Mas cuide bem dela, um dia você terá que devolvê-la a mim. E quero receber o produto em bom estado, OK?". Olhei pro sujeito mais diretamente. Seus olhos estavam baços. Não sabia se ria ou lhe dava um murro. Por via das dúvidas, fiquei com a segunda opção.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Annie

Annie
Seu passado não é bom
Seu futuro é meio cinza
Os sonhos já se foram e você...
Oh, Annie, por que a vida cobra um preço?
Por que as coisas não se resolvem
Como num lance de dados?

Annie
Você queria pisar em conchas frias
Você insistia em ver o mar, só isso
E ninguém a levou para navegar, ninguém...
Oh, Annie, por que a vida cobra um preço?
Por que, pelo menos, não é sempre julho?
Oh, Annie, por que?

Annie, é agora?
Qual caminho você deve seguir?
O que você pretende fazer com o resto dos seus dias?
Falta muito amor, Annie, quando falam com você
Eu sinto, falta muito amor quando falam com você

A caminho, mas sempre longe II

pegue firme com a vida, camarada
se ela é uma vadia com você
a sacaneie também
tenha saídas
não facilite as coisas
para ela não morder seu rabo

ou melhor facilite para o seu lado
que é o que importa
não discuta, não reclame,
siga em frente confrontando
a cara da prostituta
para que ela aprenda com quem está falando

fale grosso, não chore, não implore
beba no gargalo, mande meio mundo se foder
é uma boa mecânica, um modo de,
mas não pare
não desista
nunca

diabetes, pressão alta ainda vai,
mas se você pegar um câncer daqueles,
aí, meu chapa,
game over

sábado, 16 de julho de 2011

Alma que embota o grande falo

1
Você fez por merecer a mulher tem.

2
Um cachorro é sempre um cachorro. Uma pessoa eu não sei o que pode vir a ser.

3
Qualquer bebida é melhor que nada. Desde que tenha álcool.

4
"Você precisa de um psiquiatra, Dusquene",
"É. Eu, você e metade do planeta".
"Mas no seu caso é evidente".
"Não force, baby".

5
Muitas mulheres destróem seus homens. Fazem com que eles se transformem em amebas, em seres débeis, emasculados.

6
Casamento é a pior coisa que existe antes do divórcio.

7
Qualquer mulher falando é um ser em caça.

8
Quando uma mulher gosta de outra algo está errado.

9
Ler é mortal para qualquer escritor.

10
TV aberta é sinal de insanidade.

Um pouco de culpa e um dólar apenas

as pessoas são premiadas
de muitas maneiras
e você, Dusquene?
papando mosca...

bebe uma cerveja,
é, esta noite o bar está legal,
aparentemente

até o momento
o copo enchendo e esvaziando na boa
ninguém veio puxando conversa,
enchendo o saco

alguns conhecidos apenas,
"e aí, Dusquene?", dou um "Olá, amigo"
ninguém vem sentar na mesa,
isso é legal

a vida pode ser boa
é só você confrontar a pressão dos idiotas
e deixar rolar com a bebida,
fico de olho

as mulheres dos bares
têm longas estórias tristes, de solidão,
e ancas e seios sexys,
mas hoje não, não vou investir,
não quero ouvir e foder nenhuma delas
quero apenas, e somente, beber

é isso

terça-feira, 12 de julho de 2011

Sem título

o negócio é material
acidentes acontecem a qualquer um
se você tem dinheiro, resolve
se não tem, se ferra
se você tem dinheiro, tem dentes
se não, entra na fila da sopa

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Show time

O cantor de rock do momento ia fazer um megashow. “O cara é bom, cê tem que assistir”. “É, talvez”. “Vai passar na TV a partir das 2 da madrugada”. “Como é o nome dele?” “É K..................”. No apartamento, liguei a TV, fui abrindo umas cervejas e deixei rolar. O troço tava demorando, abri um tinto e continuei deixando rolar. Finalmente o show começou. Jorros enormes de fumaça vermelha, azul e violeta no palco. Luzes girando loucamente, um barulho dos infernos. Entra, enfim, um sujeito esquálido, buço louro e começa a cantar espalhafatosamente uma música escrota. E eu lá, esperando o K................. E o sujeito ali berrando coisas, rebolando, acabando com o microfone e os meus tímpanos. “Porra, cadê o K.................., essa merda aí só deve estar esquentando o público pro cara. Só pode ser”, eu pensei. Quinze minutos depois aparece no pé da tela a legenda “K.................. in concert”. “Puta-que-o-pariu, não pode ser...”, eu disse, “O povo está comendo bosta”. Tive ganas de ligar pro cara que me dera a dica. Mas desliguei a droga da TV e fui dormir. Pelo menos eu estava bêbado. Pelo menos isso.

domingo, 10 de julho de 2011

Pin-ups

eu quero aquelas mulheres
todas elas
pin-ups

mulheres feitas de sonho,
mulheres que não existem mais,
mulheres que dão um alento a um homem,
repouso para o velho Dusquene de guerra

eu quero todas as pin-ups,
e ninguém mais as merece do que eu
ninguém merece mais suas cores vivas,
seus cafés bem quentes,
ninguém merece mais a comodidade

eu quero todas as pin-ups
embrulhem todas elas e mandem lá pra casa

Ao fazer das coisas vãs

Lucy Red
Onde está você?
Onde a luz neon na calçada?
Que vaga de mar levou seu corpo

Lucy Red
Onde a felicidade amarela faz pouso?
Por que não pular todo um século?
Onde o mar é azul que espanta?

Lucy Red
Meu ser marinho e lindo
Meu destino, Lucy
Sob o sol

Nós dois
Bem longe das coisas tão normais
Nós dois, nós

sábado, 9 de julho de 2011

Tenha fé, meu filho amado

Ruby tirou com cuidado o pássaro ferido da caixa. Tinha uma asa quebrada. Ele o encontrara num jardim a três quarteirões, se debatendo. Um gato já vinha em sua direção, quando Ruby o tirou do chão. O gato parou e pareceu dizer "ei, cara, esse lanche é meu". No caminho, Ruby o colocou numa caixa de sapato jogada no lixo.

Em casa, Ruby colocou uma tala e enfaixou a asa do animal. Depois, foi procurar umas coisas no fundo da estante. Voltou com um bom pedaço de isopor e os troços. Pegou o pássaro e o colocou sobre o isopor. Prendeu o corpo da ave com um pano ligado a alfinetes. Com o pássaro imobilizado e piando, Ruby com o alfinete que sobrara começou cuidadosamente a furar seus olhos.

Sem título XXIII

não force a fechadura
pare de escrever seus poemas
jogue fora todo o material
trepe mais, beba mais, esfole a mão,
mas pare

você não tem chance alguma, desista
o mundo já está um troço estranho
não é preciso forçar a mão,
camarada

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Sem título XXII

Marion é a melhor puta da cidade e ama.
Lucy perdeu o marido pras garrafas.
Vicky bombou os seios e quase morreu.
Laura virou evangélica, mas peca.
Marilou, bem Marilou é Marilou.
Sondra escontrou um amor de esquina.
Barbara continua servindo no Finnegan´s.
Gia, sempre que pode, dá.
Hannah mudou de nome e de cor.
Samantha caiu na bebedeira.

E tudo continua na mesma, mas as mulheres estão aí,
forçando a barra, legal...

O que devemos fazer para não perder a sanidade

"Ei Lou, minhas bolas estão murchando". "Deixe disso, é só imaginação sua". "Mas é verdade, meu saco está mais leve". "Isso não existe". "Até Marion notou. Ela pesou com a mão, e viu que o troço está mais leve, é sério". "Você precisa de uma segunda opinião, mas não a minha... Vá ao médico". "Eu não tenho plano de saúde". "Vá ao posto". "Lá nem chegarão a olhar..." "Quer saber? Corte e jogue fora". "É uma opção, mas não agora. Quando as bolas chegarem ao tamanho de ervilha, quem sabe?".

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Mad Love

Ninguém é bom o bastante para você
Ninguém cospe um sonho tão grandioso
Ninguém é suficiente para amar você como uma perdida
Ninguém lê o seu horóscopo e faz revelações
Como vai ser seu dia a dia? E seu segredo desprezível...
Ninguém conhece ainda as palavras mágicas
Que farão você cair dessa nuvem
Para se transformar realmente numa mulher

Mas você, garota, vai sofrer muito
Se não for na minha mão, será na mão de outro
Você vai fazer tudo o que eu quiser (mas não serei seu dono...)
E vamos viver um amor bem vagabundo
Só para quebrar o gelo

Eu não tenho amigos, nem paradeiro
Não tenho um sonho, nenhum, nem durmo
Mas amo você como um cão danado, como um cão errante
Eu leio como ninguém seus desejos tão secretos
Eu já estou no seu dia a dia. Meio indefinido...
Você tem agora quem conhece as palavras mágicas
Que farão você cair dessa nuvem
Para se transformar realmente numa mulher

Mas você, garota, vai sofrer muito
Se não for na minha mão, será na mão de outro
Você vai fazer tudo o que eu quiser (mas não serei seu dono...)
E vamos viver um amor bem vagabundo
Só para quebrar o gelo

Sob o sol em tudo que há de vida

quem viu Marion?
as buscas continuam
no Finnegan´s ninguém sabe
seus amigos pedem notícias
ela não andava bem
ela comia pouco
ela se drogava
ela pouco ria
agora

quem viu Marion?
sob as estrelas mortas
no Manny´s ela não passou
seus amigos estão preocupados
ela não se controlava
ela não andava legal
ela tomava "pico"
ela pouco ria
demente

quem viu Marion?
quem precisa saber?
Marion é nome de flor
em terreno ermo

domingo, 3 de julho de 2011

O fato é o mesmo e sem razão alguma IV

1
Próximo, ninguém é decente.

2
Eu não acredito que estamos rumando para o nada, um dia de cada vez. EU SEI...

3
Tenho prevenção com pessoas visionárias. Milhões de pessoas morreram devido a mundos projetados.

4
Fuja de qualquer pessoa que lhe cause desconforto. Você não é responsável pela insanidade de ninguém. Às vezes, nem pela sua própria.

5
Mas não pense que liberdade é passar a mão na bunda do guarda.

6
"Em que ano você nasceu, Dusquene?".
"....".
"Um ano ruim para nascer".
"É, realmente, idiotas nascem todo ano".

7
Não gosto de me corresponder com ninguém. Digo o que penso e pronto. Sou avesso a debates.

8
Quem ama mãe e pai ao extremo não sabe o mal que faz a si mesmo.

9
Um pouco mais de concreto na construção a cada dia, digo frieza, não insensibilidade.

10.
Na vida, nunca encontrei uma falha nesse maldito muro. E olhe que eu procurei...

A caminho, mas sempre longe

gente demais atrapalha
não, gente atrapalha
pessoas são um turbilhão de vontades
de pretensões, de ideais, de planos,
que tornam a vida um inferno

devemos nos afastar das pessoas
fugir para um campo aberto
andar solitariamente,
se em algum lugar isso for possível,
para sentir a possibilidade
de um mundo sem gente
sem o palavrório sem sentido
sem os conflitos e as ambições
sem as risadas tolas
sem as ironias e os sarcarmos
sem as falsidades inatas
sem, apenas sem
só isso

sábado, 2 de julho de 2011

Sem título XXI

eu não sou ofensivo
apenas relato o que vejo
as pessoas que vejo,
as circunstâncias, as banalidades
da vida

e o que vejo é triste
as pessoas são previsíveis, comuns
buscam sempre as mesmas coisas
reclamam do governo, dos impostos, de tudo,
mas esperam receber os mesmos benefícios do vizinho
ninguém se atreve

o mundo está repleto de animais vazios,
perambulando por calçadas cheias,
rindo o riso covarde dos vencidos

vou seguindo também, porque meu caminho é este
mudar daria muito trabalho, um trabalho que eu não quero ter
agora

O vento bom que vem do oeste

Mildred tinha 75 anos. Era casada com Willbur, de 84, há 57. Thompson, de 67 anos, entregava correspondência para Mildred e Willbur há 40 anos. Um dia, no aniversário de Mildred, Thompson disse que faria uma coisa diferente e que Willbur não ligasse, afinal eram velhos conhecidos. Então, pôs as mãos suavemente nos braços de Mildred e lhe deu um beijo leve na boca. Todos riram, velhos conhecidos riem sempre. Willbur, rindo por trás dos óculos grossos, pediu que Thompson aguardasse ali. Todos continuavam rindo. Willbur voltou com a arma em punho e atirou a queima-roupa em Thompson. Mildred gritou. "Você nunca prestou, piranha". A perícia encontrou muitas cartas chamuscadas. Mas os endereços ainda eram legíveis.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Ao rés-do-chão sobre a planície de invertebrados

1
No fim da vida todo velho vira um idiota.

2
Certeza mesmo é que estamos todos fodidos.

3
Cada vez que vejo um casal na rua vejo um divórcio em andamento.

4
A merda é vivermos tanto, a infância deveria ser eliminada.

5
“Cê tá bem, Duc?”
“Fui fundo nos copos. Tô soltando uns arrotos”
“O que cê quer que eu faça?”
“Que tal comprarmos umas cervejas para dar fim a isso?”

6
Caralho é uma boa palavra. Pinto é que é indecente. Se minha mulher disser “mete o pinto”, eu brocho na hora.

7
Já vi muita coisa sobre a terra, menos o diabo em pessoa.

8
Toda cicuta para Sócrates é pouco.

9
Se foder é a única perversão permitida por Deus, para procriação, podemos dizer finalmente que Deus é foda!

10
Sou Otto Dusquene, meu amigo, e escrevo algumas coisas, reais, bem reais... Os outros fazem literatura. Passo longe.

Atenção: isto não é para ser feito, é só ficção, delirante ficção

Farrow pegou um rato e jogou num barril enorme. Deixou ele lá, com um pedaço de queijo mofado, e foi procurar um gato. Pegou o gato e jogou no barril. O gato abocanhou num piscar de olhos o rato. Ficou olhando. Queria saltar e fugir, mas Farrow tampou o barril com um compensado pesado e duro, que estava ao lado. Chamou um vizinho e pegou emprestado Adolf, um pitbull. Abriu um tanto o barril e o cão entrou. Foi um barulho dos diabos. Farrow e seus amigos jamais, jamais vão esquecer da cena que viram quando o barril foi aberto.

Sem título XX

mantenha sempre portas abertas, camarada
deixe sempre saídas se o sistema falhar
é o conselho que eu lhe dou

tudo bem,
pense no erro possível,
na vida provável, no cão, na mulher,
mas deixe espaço para a falha
para a consumação
para o caos

porque um dia, quem sabe, você precisará utilizar a saída esquecida
se o mundo blefar
e você, enlouquecido,
perder todas as fichas
na mesa

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Ao povo de lugar nenhum, só, com um lamento

as pessoas são capazes de tudo
li que um sujeito espatifou uma poodle na cabeça da mulher
essa foi uma das notícias mais bizarras
da qual tomei conhecimento
logicamente, ela (a mulher) deve tê-lo irritado bastante,
e a pobre da cadela estava ali por perto...

ninguém sabe quando a fúria vai emergir do lodo
só vemos seus efeitos quando já é tarde demais
não falo de assassinatos, falo do ódio diário
que não chega a matar, mas causa um problema dos diabos
e sequelas também difíceis de esquecer

também não falo da fúria previsível do sujeito que chega em casa
e, bêbado, espanca a mulher e marca os filhos, para sempre
essa violência, com ajuda policial e da Justiça,
pode ser estancada

falo do ódio que as pessoas têm de si mesmas,
daquilo que fizeram de suas pobres vidas,
ódio que explode internamente no bar, na rua, no trabalho, no trânsito,
depois de ter mudado o homem num monte de merda,
num ser sem voz ou dignidade, por anos a fio,
inescapavelmente

Pocker

Duas da manhã. Dunway abriu lentamente a porta de casa. Um homem entrou. Ele apontou o local. E ficou aguardando na sala, durante meia hora. Depois de tudo terminado o homem deixou a casa. "Quites?". "Tudo certo".

Sondra acordou feliz. Olhou para o marido e disse: "Perdeu de novo? E não tinha como pagar... Mas dessa vez, posso lhe garantir, valeu a pena. Bela cravada, meu bem". Dun enxergou Sondra com um olhar assassino. Ela começou a cantarolar um hit dos anos 70.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Vaga para deficiente físico

um homem andou pelas calçadas da cidade, ninguém soube
um homem esteve presente nos principais acontecimentos, ninguém notou
um homem sentou em bares pustulentos, bebeu, berrou, e daí?
um homem trepou, mijou, cagou, e não era para ninguém ter visto mesmo
um homem balançou na mureta de um viaduto, burramente, alguns se espantaram
um homem relaxou, mas sofreu muito também, às vezes, quem viu
um homem trabalhou - e trabalha - sol a sol por 28 anos, foda-se
um homem leu os poucos autores que valiam a pena e se retirou para o nada
um homem bebeu todas as bebidas pensando não ser necessário tudo isso
um homem viu suicidas saltando de edifícios, se enforcando ou metendo uma bala no crânio
era eu este homem, era qualquer um, era você
ninguém nem aí