domingo, 26 de maio de 2013

Filosofia de albergue

Vicky Valentine deu o rabo e se arrependeu
Era o único buraco virgem em seu corpo
Ellmore aproveitou bem aquele buraquinho
Depois, quando Vicky chorou,
fez de tudo para confortá-la:
"Foi só no cuzinho, bem. Ninguém nota".
"Mas você me arreganhou..."
"Que nada, baby. Só foi a metade..."

...

talvez ainda veja um filme decente,
algum que não tenha mulheres histéricas, nem perseguições,
nem assassinatos, nem GENTE

é, um dia desses vão produzir um filme assim
e, então, tudo ficará em PAZ

Tão pouco tempo no mísero vão da porta


aqueles que escreveram
sobre o que passaram na vida
disseram a verdade,
a sua verdade, pelo menos

foram brutos,
honestos, viscerais,
arrebentaram suas mentes
nas pilastras dos edifícios de negócios,
socaram a cara da Morte até os ossos,
fendendo seus vermes amarelos e cretinos,
levados ao chão e pisados

não fizeram LITERATURA,
esse cão sarnento, repugnante,
não se deixaram levar pela NOVIDADE,
essa puta escrota de 67 anos,
cheirando a alho e com corrimento

enfim, foram simplesmente eles mesmos,
nus

A bomba H explodindo em minha cama


1
Qualquer um pode ser um imbecil, basta existir.

2
Mulheres, bebida e sol. O Paraíso, meu chapa, é AQUI e AGORA.

3
Preliminares são coisas de amador.

4
Às garrafas, e que se foda o resto.

5
O mundo é bem melhor quando fecho a porta.

6
Sempre tive muito respeito pelo dinheiro. Ele é que não vai com a minha cara.

7
Sexo é sumo e suor. O mais é merda, poesia.

8
"Eu não gosto de você, Dusquene. Queria te matar".
"Pegue a senha. Entre na fila".

9
Mulher tem que ter seios empinados, pernas longas e anca firme. Menos que isso...

10
Mulher que não se considera um parque de diversões não é mulher.

Um é algo e nunca

qualquer coisa antes das 19h é uma droga,
um desperdício de tempo,
um trabalho repetitivo para gente que geralmente não merece
nem o nosso olhar, misericórdia alguma.

almas de escritório, seres cartorários, almas mortas,
sem assunto, sem verve, sem gana, educadas demais,
aprazíveis demais, manejando suas gorduras e "bom dias".

é, mas depois das 19h há sempre a possibilidade do drinque
no Steffano´s, longe disso tudo e dos prédios quadriculares.

Dias piores virão?

é melhor você estar preparado,
nunca será calmo demais
nunca

a vida é "som e fúria" como disse o Shakes
e ele estava certo

crianças, mulheres, idosos, homens
são detonados a toda hora,
só não os vemos

neste mesmo instante, enquanto escrevo,
dezenas estão morrendo no Oriente Médio,
na África, e por aí vai

e esse troço de imigração está ficando
sério
e
tudo mais está ficando sério demais
também

bem,
resta ainda uma dose na garrafa,
e algum tempo para esquecer isso também

qualquer dia a coisa acontece na minha frente,
ou na sua

LImpeza

Butchner bebeu o último gole. Arrancou a calcinha de Margot. Botou ela de quatro. Cuspiu no mangalho teso. Ela só pediu: "Vai com calma, amor! Aggghhhhhhhhhh. Seu filho-duma-puuuuta!". Butchner riu seu riso de nove dentes. Tava pagando por aquilo. E queria que fosse cruel.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Enquanto caminho, você vem


gosto de nossas brigas
gosto de ter você por perto
sempre

sempre vou achar que nossos
melhores momentos são nossas brigas
- pois elas realmente são ótimas
e esquentam

gosto desses anos de estrada com você,
você sempre, baby, nunca uma outra
só você

Intervenção


"Então, sr. Dusquene, o que tem a dizer?"

"Que estou seco. Que tal um tinto?"

"Esta reunião é justamente para você diminuir a bebida"

"Pensei que as duas estivessem aqui para uma farrinha particular"

"Concentre-se, sr. Dusquene, somos da Assistência Social. Sua situação é deplorável"

"Não menos lamentável que a do cachorro do vizinho"

"Que tem ele?"

"Sei lá. Sarna?"

"Que tal parar de beber por uma semana?"

"Que tal um dia?"

"É pouco. Quatro"

"Fechamos em dois"

"Tudo bem"

"Mas a partir de amanhã e com uma compensação"

"Qual?"

"Irmos imediatamente para a cama"

"Seu filho-duma..."

Particularidade de uma expulsão do quadro de aviso



estou cada vez mais sem paciência com a humanidade
meu mau-humor crônico pode estar agravando a situação,
mas sinto que a imbecilidade geral está aumentando
como as heras nos muros
como os lodaçais dos trópicos
como as ervas daninhas nos campos abertos

e não tem volta
a estupidez humana é atávica
abrange todas as classes sociais
todas as culturas e religiões
todos os militarismos
rebelar-se é inútil
tentar escapar
também

por essa e outras razões
prefiro comprar uma dúzia de latas de cerveja
e ficar mamando, só, tabulando as teclas do computador,
sem querer encontrar sentido algum para coisa nenhuma

Entre o mundo perdido que eu não tive apenas


1
150 quilos
e comendo amendoins...

2.
Muita gente que eu olho, me enoja.

3.
Não sou um poço de virtudes.

4.
Viver é paciência.

5.
O mundo não se vê num dia.
Vê sim.
É só abrir a janela do quarto, porra.

6.
Ser humano é a mesma impiedade. Aqui, em Pequim ou em Tegucigalpa.

7.
Beber é um modo apenas.
Um entre tantos...

8.
Qualquer pergunta merece o SILÊNCIO.

9.
Qualquer pergunta é INVASIVA.

10.
"Dusquene, o pato que anda".
O Duc.

A merda nossa que vaza todos os dias



o diabo é
o ramerrão
a falta de perspectiva
de grana
as solas dos sapatos gastas
as meias furadas nos dedos e nos calcanhares
o sem saco de
comprar meias e sapatos

o diabo é
o sol, o maldito sol rompante,
o café oxidado
na térmica
de quinta
a danação das ruas
a vontade de ver ninguém
a ressaca bruta
o bolor no armário
e o periquito verde
do vizinho
a pane mental, enfim,
a perda de sensibilidade...

Um é algo e nunca


qualquer coisa antes das 19h é uma droga,
um desperdício de tempo,
um trabalho repetitivo para gente que geralmente não merece
nem o nosso olhar, misericórdia alguma.

almas de escritório, seres cartorários, almas mortas,
sem assunto, sem verve, sem gana, educadas demais,
aprazíveis demais, manejando suas gorduras e "bom dias".

é, mas depois das 19h há sempre a possibilidade do drinque
no Steffano´s, longe disso tudo e dos prédios quadriculares.

E o grande caralho entesado enrugou...


sua calcinha rasgada
me adverte
que você não está nem aí
para porra nenhuma

só quer
beber uma cerveja
e dizer que as contas não
estão pagas
e que chegou
também uns
boletos de Igreja
- jogados no sofá

ligo a TV
para nada
a crise continua eterna
as pessoas não se entendem
e querem que o mundo se entenda?

rio um pouco
emborco mais um gole
arroto e você passa
da cozinha indo pro quarto
- de leve

é, vamos lá

terça-feira, 14 de maio de 2013

Pequena conversa sobre o nada

"Quando você for publicado, todos estaremos mortos, Dusquene".
"É uma possibilidade..."
"E você não se importa? Afinal, você produz muito".
"Se tiver meia dúzia de leitores, terei feito um bom trabalho".
"Você é muito modesto".
"Modéstia é um dos meus pontos fortes".

estamos sós nestes dias
como em muitos outros
passamos nas ruas por gente
que não nos dizem nada
que vai só, também

todos adiando o que realmente
querem fazer: beber, morar perto do mar,
queimar as contas, se livrar do cão,
foder a vizinha

e assim vamos morrendo, loucos, conformados
com o que a vida nos pode dar
e recebemos de mãos abertas
e felizes

Quem cuida dos pobres neste mundo infame?


os hospitais do país são matadouros públicos
onde os pobres chegam para morrer
em macas nos corredores,
em UTIs coletivas e úmidas,
não sanitizadas,
uma morte dolorida, aberta,
programada

como doentes internados não votam
os políticos os esquecem
os governantes os esquecem
os médicos os esquecem
a população os esquecem
o que os olhos não veem...
desaparece
foda-se!

(...)

“Mama Brown foi internada com uma infecção aguda no pâncreas”.
“É? Quando foi?”
“Foi ontem. Morreu hoje, às 10”.
“Puta-que-o-pariu! Mama Brown morreu?”
“Morreu, o enterro é amanhã, às 15h. Cê vai?”
“Sei não. Tenho umas entregas pra fazer...”
“Eu também tenho uns assuntos pendentes...”
“É, vamos ver se dá”.
“É, talvez”.

Pobre Mama Brown... que não tinha um ombro onde encostar a cabeça

Científico como Deus ao sol


1.

- Qual canal você quer? 2, 4, 6, 10, 12 ou 14 ou 16 ou 18, sei lá. Escolhe...

- Você não tem tv a cabo?

- Não. Prefiro ver a porcaria toda que está entorpecendo a cabeça da humanidade... Sentir o perigo que me ronda...

- É, não deixa de ser uma razão...

- Não é?

- É.


2.

- Dusquene, quando você vai deixar de ser um filho-da-puta insensível?

-  Quando você for publicado?

- Nem assim. Escrevo para mim, nem penso em vocês.

- Como assim?

- A humanidade é o povoado de amebas que observo ao microscópio.

- ...

- Científico, não?


3.

- Você tem algum objetivo na vida?

- Ir vivendo... Juntando um troco para a velhice.

- Como?

- Camarada, eu não sei você, mas eu ralo há 30 anos em trabalhos escrotos, mentais, mas escrotos. Um dia vou me aposentar e vou esfriar meus ovos em uma piscina de água bem fria.


4.

-  Abigail, onde estão meus ovos?

- Nas calças!

- Não seja emgraçadinha comigo.

...

qualquer verdade
que seja dita
nesta noite
fria
magoará
tudo em volta

tocará todas as
peças
a garrafa,
os copos,
até mesmo
o nada

deixemos pois
para mais tarde
qualquer
palavra idiota
e
façamos
o que
pode ser feito
num dia de chuva
e vento

Passagem para...



"Senhores usuários, é proibido agachar ou sentar no chão do metrô", diz a voz feminina mecanizada que sai da tubulação.

Mensagem completamente inócua.

Os vagões chegam e partem repletos de gente que não consegue nem respirar. Comprimida até a ponta dos pés. Muitos passam mal, alguns desmaiam, por ficar os 45 minutos da viagem imóveis.

Essa sorte não basta.

Durante o percurso, o sujeito pode se acomodar bem em frente a outro que lê, que reza em voz alta e quer que todo mundo vá junto, no embalo.

Se há um trem para o inferno, é o metrô na hora do rush.

De vez em quando há uma diabinha suculenta, mais é raro. Muito raro.

Baby, ehhh


e fomos,
no turbilhão da vida,
um pouco melhores que muitos,
e muito piores que nós mesmos

nos magoamos,
mas suportamos o ramerrão,
sem uma fresta no muro,
superando um dia após o outro,
até o fim, sob o sol fervente,
na cara, de chapa

é foda,
eu sei, é foda,
e nos fodemos também,
para não perdermos a viagem

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Uma semana de cão


Eu fumava uma carteira de cigarros por dia. Plaza ou Carlton.

Comecei a tossir desbragadamente por uma semana seguida. Uma tosse seca e constante.

Fui no médico. Doutor Medenhorf. Clínico geral.

- Tosse. Respire devagar. Agora tosse.

Medenhorf auscultou meus pulmões com o estetoscópio.

- Hummm. Sei não. A coisa não vai bem para você, rapaz.

Ele preencheu uma guia.

- Tire umas radiografias dos pulmões e volte aqui. E logo!

Sai do consultório já prevendo o pior. A doença maldita.

Fiz as radiografias no mesmo dia de tão ansioso que estava.

Liguei à tarde para a secretária do doutor. No outro dia, às 10 da manhã, eu estava no consultório.

Medenhorf tirou as duas radiografias do envelope duro da clínica.

Pôs no contraluz. Olhou por três ou quatro segundos e disse à queima roupa:

- Nunca vi algo parecido em toda a minha vida profissional...

Olhei para o doutor e depois para as radiografias no contraste.

- O que o senhor nunca viu?

- Seus pulmões estão envolvidos por uma película visível, clara como água. Está vendo?

Ele apontou áreas ao redor dos pulmões que realmente apresentavam um contorno indefinido, esbranquiçado.

- E isso é ruim?

- Péssimo, meu rapaz. Você deve ir urgentemente a um pneumologista. Logo!

Sai mortificado da consulta, com o envelope com as radiografias debaixo do braço.

Marquei a consulta com o pneumologista. Só tinha vaga daqui a uma semana. Não tinha jeito. Mesmo dizendo que era caso de vida ou morte, de pré-enterro, só daqui a uma semana.

Foi uma semana dos diabos. Uma espera cruel, aterradora.

No dia da consulta, lá estava eu no consultório do pneumologista.

A atendente me chamou. Entrei no consultório. Expliquei o caso.Ele me pediu as radiografias e as colocou no contraluz.

Olhou-as por três segundos.

Não aguentei:

- É câncer não é?

O médico me olhou.

- O senhor não tem nada nos pulmões.

- E essa película branca ao redor deles? - apontei.

- O senhor deve ter se mexido um pouco na hora em que as radiografias foram batidas. Noto que o senhor é muito ansioso... Esses contornos são normais... É o estremeção.

Vi sangue. Na minha frente só um nome: Medenhorf.

Agradeci o doutor. E sai dali. Precisava de um telefone público.

Liguei para Medenhorf. A secretária atendeu. Pedi para falar com ele. Caso importante. Ele não atendia ligações, mas, quando a secretária lhe disse quem era, ele ficou curioso.

- Medenhorf falando...

- É você, seu baita filho-duma-puta? Aqui é o Dusquene, o paciente que você enlouqueceu por uma semana dizendo que meus pulmões estavam envoltos por uma película cancerígena...

- Mas eu nunca disse que era câncer. Só imaginei que...

- Pois não imagine, seu traste! Você não sabe a semana dos cachorros que me fez passar. Você não é médico Medenhorf. Você é um sádico, um carniceiro, um carrasco, é isso que você é...

E desliguei, quase quebrando o telefone público.

Depois olhei para o envelope com as radiografias dentro dele.

Rasguei tudo com vontade. E deixei o espólio ali mesmo na rua.

O gari que se fodesse.

...

quando ela
vem
nua, sob o cobertor,
e
pega meus bagos
e sente
o peso
eu sinto
que há justiça
no mundo

Compaixão sempre é uma merda boa


a lua na sarjeta
que mal faz?
aquele poste só, ao longe,
iluminando
que mal faz?
aquele bêbado triste
que ali vai
que mal faz?
os pobres
que mal fazem ao mundo?
só a eles

então, camarada, tenha mais compaixão
não custa nada
tentar
nem que seja com sua mãe ou pai
ou sei lá quem

Um pouco de lama em tudo e todos


1
Não creio em gente, nem que o cachorro não morde. Se tivesse que acreditar em um dos dois, confiaria no cachorro.

2
O que você mudaria no seu passado? Preferiria não ter nascido.

3
A convicção é a receita do idiota. Por causa dessa superstição, ele perde mulher, carro e sanidade. Existir é conviver com o caos.

4
Se eu passei todos esses anos na planície só, porque agora tenho que me importar com uns e outros. Que se fodam!

5
Consciência é necessária para não assassinar o dono do cão, quando se descobre, pelo cheiro, a merda no sapato.

6
Eu sou Otto Dusquene.
Você, quem é?
Uma página em branco.
Um nada consta.

7
"Você se acha muito importante, não é, Dusquene?"
"Não sou pior nem melhor que muitos"
"Ah, um resto de humildade, enfim"
"Também não sou igual"
"Vá se foder, Dusquene!"

8
O ruim é a mocinha tlec-tlec logo atrás de você, saindo do metrô.
É enervante.
Paro pra deixar a vadia passar.

9
Vê se lê Bukowski, Fante, Kerouac,
Esqueça essas merdas, cara!
Sinta o vômito da rodoviária e dos becos.

10
E pra finalizar...
Boceta é a commoditie mais barata do mundo.

A melhor hora da cidade em que ela vive



vejo a cidade morta às quatro horas da manhã
as ruas parecem a pele de um imenso anfíbio negro-cinza
pisada por bêbados erradios e sujos de merda
estou bebendo um tinto de qualidade; e isto é bom
vejo os carros na pista, ao longe, na hora plena
a melhor hora da cidade: quando todos dormem e
e ela, enfim, pode respirar, ficar em paz, livre de
passos, cusparadas, gimbas de cigarro, vômitos...
existe a possibilidade de um assassinato, logo,
mas isso sempre há em qualquer lugar do mundo
nem falo das sirenes de bombeiros e polícias
nem digo do meu incômodo de fazer parte disso...
a minha bebida me basta; nada hoje de rostos
e vozes humanas: só quero esse silêncio, imerso
em álcool, como uma quietude de mim mesmo agora

O estorvo caos em que me há de acalentar


1.
Sou bem normal, olhando a espécie como um todo.

2.
Bebo com certa regularidade.

3.
"Dusquene, aonde vai?"
"Comprar cigarros?"
"Você não fuma há 18 anos".

4.
É preciso deixar o otimismo em grau de latência.

5.
Ah, o sol, o maldito sol... Umidade: 15%.

6.
Não há melhor caminho do que a ida até
a geladeira, quando tem cerveja ou um tinto.

7.
Ser forte é ter paciência.

8.
Aliás, paciência é coragem.

9.
Por que toda mulher feia acha que todos a querem,
a perseguem nas ruas, ávidos pelo seu corpo?

10.
Muitos durante anos só fodem a paciência alheia.

O homem mais feliz do mundo


Slim me contou essa história:

A filha do rei adoeceu. Uma doença incomum, letal. O rei consultou os magos do reino à procura de uma cura para aquele mal. Um deles olhou a jovem princesa inconsciente em seu leito (huum... belas tetas... bem, mas isso não faz parte do negócio) e disse ao rei: "Esse mal só tem cura se a moça se cobrir com a camisa usada pelo homem mais feliz do mundo". Então, o rei perguntou aonde poderia achar o tal homem. O mago não soube dizer.

O rei vestiu-se como um andarilho e saiu cavalgando em desespero, subindo e descendo colinas, serras, montanhas, rompendo vales, até que, no fundo de um desses vales, ouviu uma risada. A gargalhada de um sujeito feliz. Ele foi entrando na mata e topou, numa clareira, com um lenhador, que golpeava toras de madeira com o seu machado. O homem gargalhava de chorar, com três ou quatro crianças, brincando ao seu redor, a uma distância segura dos golpes.

O rei aproximou-se e perguntou ao homem, que usava apenas um jeans surrado (a história não é tão antiga assim e as tetas da princesa realmente eram ótimas), porque ele estava tão feliz, em meio àquele trabalho árduo ao sol. "Ora, meu amigo, faço o que gosto, vivo na natureza, respirando ar puro... Tenho uma mulher maravilhosa, que me serve todas as noites por três vezes, e tenho filhos sadios e robustos como ursos, porque não haveria de ser feliz. Feliz só não: EU SOU O HOMEM MAIS FELIZ DO MUNDO!".

O rei quase se ajoelhou de emoção. E perguntou: "O senhor poderia me emprestar uma camisa?". Ao que o lenhador respondeu: "Camisa? Não tenho. Nunca tive. Para quê...", apontando para a paisagem. E sorriu seu riso alegre e bestial.

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Uma conversa de peso sobre a sucessão dos dias

"Mulheres grávidas são interessantes, Dusquene". "Por que?". "Você pergunta a elas: quantos meses de gravidez?" "E daí?" "Daí ela lhe diz 'quatro meses e duas semanas'". "Sim , e o que tem isso?". "Bem, você fica sabendo então que há quatro meses e duas semanas ela FODEU, FODEU LEGAL". "Como?" "É o único momento que você TEM A CERTEZA ABSOLUTA da foda de uma mulher, tirando os vídeos pornográficos, logicamente. Pense nisso, Dusquene". "Bullford, você é maluco. Suma da minha frente".

...

inevitável é dizermos tudo isso
sem verve, sem pegada
irmos descendo a rua
feito merda escorrendo
sem nada na cabeça
sem vontade ou aflição
duro é levarmos nossas vidas
a conta-gotas
como descongestionantes nasais
é olharmos aquele troço grudado
no sapato e acharmos que aquilo
já nasceu conosco


A pálpebra meio aberta me confunde



eu sou intratável
no trabalho as pessoas me olham de esguelha
pensam que sou um alienígena
e isso é bom

quanto menos contato eu tiver com a Humanidade,
melhor para mim e para ela,
sei que sou uma bolha de raiva
e impaciência

a idiotia das pessoas me incomoda
mulheres grávidas me incomodam
pessoas no metrô me incomodam
o sol entrando pela cortina
me incomoda muito

um dia Dóris me falou:
"Dusquene, você é quase um ser humano"
gostei do elogio,
gosto de Dóris

Limpeza

Butchner bebeu o último gole. Arrancou a calcinha de Margot. Botou ela de quatro. Cuspiu no mangalho teso. Ela só pediu: "Vai com calma, amor! Aggghhhhhhhhhh. Seu filho-duma-puuuuta!". Butchner riu seu riso de nove dentes. Tava pagando por aquilo. E queria que fosse cruel.

Blue Moon



qualquer coisa
que falarmos hoje
é bobagem
frente à lua azul
ao cheiro
do vinho tinto
no copo americano
à dama azul
da noite pobre
de mim
de você
mas cheia
dessa angústia
infinita

qualquer coisa
destoa
na paisagem
saiam homens
e mulheres
que nada valem
que nada têm
a oferecer
que nada prestam
que nada sabem
da lua azul
morta e fria
naquele céu
de ninguém

Cães



é como se fosse uma noite de cães danados
a uivar para a lua
homens e mulheres vão aos bares
a festa se instala
e eu quero estar nela
dentro dela
com um copo
na mão

como cães danados saímos em matilha
e vamos nos mordendo e ferindo
mas sempre juntos

a penúria alheia que avança nas grades


somos feitos de nervos
carnes e ossos tão somente são
alicerce e concreto
somos constituídos é de fiações
por isso, não é errado dizer
"aquele sujeito tem uns fios soltos"

cada vez mais vemos pessoas assim
deprimidas, obcecadas, loucas, suicidas,
vagando pelas ruas,
com todas as suas carências

eu fujo desses indivíduos...
não sei você, amigo
já estou satisfeito com as minhas misérias
não preciso das de ninguém

"Dusquene, eu preciso lhe contar umas coisas..."
"Deixe para amanhã, camarada, hoje eu não estou num dia bom"

domingo, 5 de maio de 2013

Embrulhem o peixe no celofane e deem pro gato



1.
Qualquer mulher é capaz de enlouquecer um homem em dez segundos.

2.
Todo idiota julga-se um gênio. Eu inclusive.

3.
Bukowski não fazia literatura.
Fazia a vida melhorada e, por essa razão, descobriu a América.
E ele também não foi o último beat, cacete.

4.
Escrever é idiotice.
A vida real vale mais do que qualquer ficção.

5.
Ninguém escreve tudo o que pensa ou toda a repugnância que é.  Portanto, escrever é uma forma de modéstia.

6.
Bebendo você diz que só aguenta o mundo com a cabeça feita.

7.
Fidelidade é o maior adultério contra si mesmo. Melhor se você fosse um verme. E você é.
8.
Não compro livros. Os autores que já li são suficientes. Um ou dois escapam. O resto (99%) pode ir para a incineradora.

9.
Estamos presos a uma engrenagem em que homens e mulheres estão se odiando cada vez mais. E melhor.

10.
Ah, o sol. O sol, quentando...

Canto do jovem homem enfermo


lá vai a silhueta de um homem só
carregando o peso de ossos e carnes
passa por prédios e galerias
vai no frio da manhã cinzenta
o homem tem asma, e tosse,
tosse agravada pelo cigarro
é jovem ainda esse homem
e está se formando e está bebendo
e deseja ser um escritor, só isso,
mas o mundo é repugnante e prefere
ler os idiotas, os que vendem,
mas ele ainda escreve muito mal

vai longe agora a silhueta de um homem só
enfrentar mais um dia de trabalho estéril
manchar seus dedos com a graxa roxa dos carimbos
intoxicar-se com vidas imprecisas, sem pauta,
com os risos de tantos rostos felizes e tremendamente sós

O inexplicável momento de nada dizer



A velha Mildred gostava de colocar uns vasos com plantas no parapeito da janela. Gillmore alertava Mildred.

"Qualquer hora um troço desses balança, cai e faz um estrago na cabeça de alguém. Se for comigo, as consequências serão graves...".

"Você está me ameaçando? Vou telefonar para a polícia".

"Dona, telefone para o escambau. Eu já lhe dei o aviso".

Um dia aconteceu. Um dos vasos com gerânios despencou e estatelou no piso da entrada, bem na hora que Gillmore saia pro trampo. O adubo negro do vaso cobriu as barras de sua calça creme e penetrou nos sapatos. Uma merda só. Gillmore olhou para cima e viu Mildred assustada, segurando um vaso que ameaçava cair.

"Eu lhe avisei", disse ele.

Gillmore abriu com força a porta do prédio de três andares, sem pilotis.

O que se ouviu depois foi o baque surdo de porta escancarada a pontapés, os gritos de Mildred e o barulho de vasos se quebrando no 279.

"Você é louco. Um homem insano aqui. Minhas azaleias, meus gerânios! Oh, meus pobres gerânios...".

Mas Gillmore continuava, firme, a destruir os jardins suspensos.

...

Estou bêbado como um louco agora

Cada um com sua merda infanticida



"Como é que você se sustenta?"
Você é o que você fez ou continua a fazer
Bukowski fazia essa pergunta essencial

"Amigo, como é que você paga suas contas?"
Ele dizia que, nessa pesquisa particular,
observou que quem pagava as contas geralmente era a mãe

O cara tem 25, 30 anos e está ali,
sorvendo os pais como canário novo
Um tremendo filho-duma-puta

Os pais ficam ali, olhando de lado,
praguejando ter um filho assim
A mãe quer jogar carteado com as amigas
O pai arrumou uma putinha e quer comer por fora
e Wilson ali, esquentando os ovos no sofá,
vendo o último filme do Woody Allen

Duvido se os pais, mentalmente,
não queimam o dia do nascimento do garoto no calendário
"Merda de dia...", sussura o velho. "Que foi, pai?"
"Nada, continue vendo a porra do filme"

Tédio


todo dia quer morder meu cu
sei disso muito bem
esse sujeito aí na minha frente
- de terno e gravata -
todo sorrisos
pensa que é o deus da engrenagem
o panteão, a glória
só se for nos infernos

um dia igual aos outros
o que me deixa meio perigoso
mais esquivo do que sou

É Dusquene, 46 anos, 27 anos de serviço,
e firme e bom fodedor ainda...
você é um grande cara, Dusquene
pena que poucos saibam disso

todo o dia quer morder meu cu
todo o dia chego
me tranco e escrevo
uma merda qualquer
para espairecer

De homens e apostas

As apostas de Ellfroy sempre davam em nada. No jogo de números havia uma evidente separação entre a Sorte e ele. Um muro armado entre eles, inexpugnável, feito de concreto, um muro perene, eterno. Ellfroy sabia disso e, mesmo assim, jogava seus níqueis em esperanças de antemão perdidas. Talvez fosse um idiota, um viciado incorrigível, um doido apenas. Não importa. O que vale registrar são suas derrotas constantes, implacáveis como um murro de boxer. E ele sabia que iria assim até o fim dos tempos, até a morte do jogo ou da própria morte, ou fosse lá que o viesse primeiro. Aquilo era maior que ele, era maior que seus músculos em contrário, seus passos em contrário, sua negação; algo que sempre o levava à banca, aos números, à perdição. Depois da derrota, da pule amassada, jogada na rua, a raiva, a dor, a angústia, o remorso, tudo num turbilhão, vindo como dose amarga na garganta seca como pó. “Um dia vai dar... Um dia os números caem, precisos... E eu, então,...”. Ficou nisso, indo para o velho cubículo, para os braços de Eleanor.

Uma rodada de uísque,cartas e pragas



"Ninguém morre às sextas-feiras. É um dia ruim para morrer".

"É, eu sei. Mas a esposa de Fred morreu e ele não virá para o carteado".

Dougall resmungou um pouco, se acomodando melhor na cadeira. Prazze ficou puto.

"Acabou com o nosso jogo, porra. Sexta-feira realmente não é dia de entrar no saco".

"É , mas temos que dar os pêsames a Fred".

"Como a mulher morreu?"

"Soube faz dez minutos. Foi assassinada pelo amante".

"Como é? Fred quem lhe disse?"

"Não. Um conhecido. Ela transava com um corretor de seguros há dois anos sem Fred saber".

"E Fred soube?"

"Soube e perdoou a mulher. Aí ela informou ao corretor que não iria mais foder com ele. Trepavam todas as sextas à tardinha, justamente quando Fred vinha pro carteado. Ele sempre confiou cegamente em Irene".

"E daí?", perguntou Prazze a Rufus.

"O amante não se conformou e peineirou ela. Cinco tiros, duas horas atrás. Disse que queria dar a última nela como despedida e peineirou ela num motel da 7ª".

"É, mas isso não é motivo para Fred faltar ao carteado. Porra, essa noite é sagrada, merda!", disse Prazze, resumindo o que todos, na verdade, estavam sentindo.

"Quer saber? Quem é corno que espere. A mulher já está morta mesmo. Vou ligar para o Vicent para ver se ele vem substituir o Fred".

"É. Ótima ideia", disse Dougall.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Na vaga entre rodas passadas no meio-fio

1.
Espere e verá.

2,
Qualquer forma de jogo é um assassinato mental.

3.
Escrever é nada, absolutamente nada.

4.
Saiba esperar a espreguiçadeira. Quem sabe ela vem.

5.
A certeza é a coisa mais incerta que existe.

6.
O óbvio é intolerável.

7.
Preconceito é a maior estupidez do ser humano. Temos que destruir nossos preconceitos, um a um. Preconceito leva a assassinato.

8.
Uma bebida lenta, calma, é melhor que um porre rápido.

9.
Quem ama, retruca.

10.
Viver, quem sabe?


Tristes dias aqueles de maio


Eu separava as planilhas no banco. Agrupava os requerimentos de pequenos empréstimos de acordo com capacidade de pagamento do solicitante. Ou seja, se o sujeito informava uma renda razoável, mais chances ele tinha de conseguir o dinheiro. Era uma merda, porque havia aqueles que nada tinham a oferecer.

Um dia uma velha entrou com dificuldade no banco. Sentou na minha frente. Disse que precisava de um dinheiro para levar o marido ao oculista e comprar uns óculos novos para ele. Havia suspeita de glaucoma.

Pedi a ela algumas informações. Renda não havia. Infelizmente, informei à mulher que o empréstimo não poderia ser concedido. Seus olhos se encheram e as lágrimas começaram a descer. Seus lábios tremiam. "O que eu vou fazer agora, meu filho?". Eu não sabia o que lhe dizer. Eu era estagiário sênior naquela época e não ganhava nem para substituir meus sapatos velhos.

Por fim, não aguentei e menti no requerimento. Coloquei uma renda que achava que seria suficiente para a aprovação do empréstimo pelo gerente. Pedi que ela assinasse uma série de recibos, que bati rapidamente, para que comprovasse aquela renda. Pedi que telefonasse dentro de três dias para ver se o emprestimo havia sido aprovado. Era uma tentativa pelo menos.

Depois de tudo, a velha olhou para mim. Sorriu. Nada disse. Apenas contorceu seu lenço e se foi.

Era uma esperança. Uma esperança apenas, mas nada.

Na lâmina

"Eu tenho 300 milhões de espermatozóides por milímetro cúbico". "E daí, Foster?". "Eu posso colonizar o mundo: EU SOU O PATRIARCA". "O caralho que é. Só na Ásia são 1,3 bilhão de chinas". "Mas eu tenho 300 milhões... O doutor falou que eu sou uma potência viva". "Foster, há quanto tempo você não trepa?". "Há dois meses". "Só fumando esses daí, né?". "É". "Brocha, né?". "É". "Então, vá ali, bata uma e libere os 300 milhões, senão saem pelos olhos".

Febre

A fauna que rodeia o jogo de números é gente dura, sem humanidade. Só está ali pela grana. Quer que todos se fodam. Tudo bem: eu também quero. São seres de cara fechada, que repelem qualquer ato de simpatia. São seres enclausurados, fechados em seu mundo obscuro. São seres imprestáveis, corrompidos. Que não ajudam em nada. É uma fauna realmente medonha. Tomada pelo vício. E eu me pareço com eles... Não. Acho que não, ainda. Ainda consigo controlar a ansiedade. Tenho meus esquemas, perco uns, ganho outros, e isso me salva.

O que nós temos em comum com os outros

Fellow morreu batalhando em cima de Gina, que tinha 150 quilos e gostava de frango frito e linguiças defumadas. Morreu como se estivesse num colchão d´água quente. Um ataque cardíaco fulminante, enquanto tentava satisfazer (COMO!) Gina Upergatte. "Vai, vai, meu amorzinho, mete... Não é aí, aí é minha virilha, mais pro meio... Aí também não". Fellow resfolegava, buscando alcançar a cona, que se escondia no fundo, bem no fundo daquelas carnes. "Como será que ela mija? Por onde sai, meu Deus...", pensou o homem, que lutava uma luta inglória na origem, jamais vencida. Por fim, no embate, o homem tomou fôlego, tentou uma última estocada, mais violenta. A cara ficou roxa, num esgar terrível, e ele desabou sobre a manta de carnes. "Que foi, benzinho? Cansou foi? Trabalha mais na sua Gininha, seu preguiçoso...". E Gina abraçou carinhosamente Fellow morto.

Você e eu, somente

você
é para mim
um espetáculo

tudo
o que você faz
é bom
e
generoso

até as brigas
são esplendorosas

casal que não
briga
não se ama

- você não quer acreditar,
mas é a pura verdade


as unhadas,
a sua cara de raiva...
são marcas em mim


saem, com o tempo,
mas são somente minhas,
de mais ninguém

quarta-feira, 1 de maio de 2013

Tattoo


Um miniconto do Otto Dusquene

Misty começou com uma tatuagem pequena, em forma de uma pequena buceta, no lado direito do pescoço. Na verdade uma daquelas flores que parece uma racha. Achou legal, fez uns ramos do pé da flor até o meio pescoço.

Ficou realmente legal. Mas estranho. Os pais se horrorizaram. Os amigos nem tanto. Acharam bacana o troço. Os ramos da buceta do pescoço pareciam nascer dos peitos de Misty.

Ela resolveu, então, fazer da flor única um bucetal, estendendo o jardim por toda a face direita. A mãe desmaiou. O pai a expulsou de casa. O namorado, que antes apoiara a merda toda, não aguentou o exotismo e deixou Misty com o seu roseiral de tattoo.
O tempo passou. Ela foi ficando cada vez mais esquiva. Passou a andar com pessoas cada vez mais esquivas também.
E, meses depois, ao acordar de uma bebedeira, Misty olhou-se no espelho partido do banheiro de um sujeito qualquer, a quem dera por não ter o que fazer na noite anterior e porque precisava de um lugar melhor para dormir. O que viu não foi bem o que queria. Aliás, não viu nada daquilo que queria.
Queria ver seu rosto antigo. Clamava pelo seu rosto de dez meses atrás. Sem adesivos. Sem carimbos. Sem flores-bucetas. Sem ramos, sem roseiral, sem nada. E começou a chorar convulsivamente, a se desesperar, a morrer por dentro. O que fizera foi um crime contra si, sua real identidade. O seu verdadeiro rosto, nunca mais.
Três dias depois estava morta. Cortara o ramalhete pelo talo.

...


Catchna
Catchna
Seu amor está distante de mim
como Sudeste Asiático
Estou bêbado, falando com a garrafa.
Bêbado, bêbado, bêbado
como um vaca Margot estrangulada
Oh, Margot
puta das mais longas pernas de Paris
Catchna, Catchna, vem para mim...

Um grande amigo do homem


"Onde está Penny? Você viu Penny, mãe?".

"Não". Veja se está debaixo do sofá".

A garotinha saiu gritando "Penny! Penny!"

A mãe ficou na sala. De repente viu uma bola de pelos malhada saltitante.

"Gina, Penny está aqui!".

Gina veio correndo. Viu o minicoelho.

"Ué, mãe, que é aquela mancha em cima dele?

Minnie chegou perto, pegou o minicoelho. Examinou a mancha. Sentiu algo.

Levou o bicho ao nariz.

"É merda!"

Foi aí que Bullford entrou na sala, ainda afivelando o cinto nas calças.

"Seu filho-duma-puta! Cê limpou o cu com Penny, não foi?"

"Que cê queria que eu fizesse? Pedi o higiênico. Você estava demorando... O bicho entrou no banheiro, daí pensei... Por que não? E digo mais: não existe nada tão macio. Um dia você devia experimentar".

Gina saiu da sala chorando.

Penny ficou ali, cochilando na mão de Minnie. 

Blind Date


“Quem é?”

“Aqui é Rajesh Voojoo, secretário do Grande Aranda Kalapajaloo. Informo que o senhor se encontra em atraso com uma mensalidade-doação para nossa entidade”

“Como é? Quem é?”

“É o Rajesh Voojoo, secretário do Grande Aranda”

“Escuta aqui, Voodoo...”

“É Voojoo, senhor”

“Tudo bem. Que seja. Eu não sou filiado a nenhuma seita. Só contribuo com o asilo das putas, quando dou uma”

“O senhor realmente necessita da espiritualidade do Grande Aranda... Venha nos fazer uma visita. Aproveite e traga o carnê para o pagamento da mensalidade”

“Ó cara, vá se foder. Já disse que não conheço nenhum Kapalo...”

“Desculpe. Mas é o Grande Kalapajaloo...”

“Esse mesmo e...”

“O senhor precisa pagar a mensalidade para manter acesa a sua vela da vida. Senão...”

“A vela é grossa, Raj?”

“É. Por que?”

“Enfiei ela toda no cu do Grande Aranda como minha contribuição particular para a ordem”

“Mesmo assim, gostaria de lhe informar que sua mensalidade ficará em aberto em nossos arquivos. Ligarei dentro de uma semana”

“O que? Alô... alô...”

Pensamento


O perigo está
Em não dizer a palavra exata
É não ter opinião sobre alguma coisa essencial
Eu escrevo para ver meus demônios
Não para a posteridade, essa puta,
Mas escrever não deixa de ser uma forma de ação
De rebeldia, de ir além da morte, da dissolução

Cada página em branco que preencho
Fortalece a mim, atiça, anima
Engrossa o fio da vida
E apressa meus dias lentos

Talvez eu seja realmente egoísta
E não queira desaparecer simplesmente, como qualquer um,
Atravessando o neon das ruas como uma sombra
Que não se prende a nada

Vanda Velt


 Vanda Velt, que mulher. Quando ia ou vinha do balcão, os caras uivavam. Aquelas pernas brancas de potranca polonesa, a Vanda Velt. Ela sabia como açular a turba, remexendo os quadris, pisando como tigresa. Era um espetáculo. E gratuito. E a um metro da gente. Deixava qualquer um de pau duro.

“Me faz uma massagem, Vanda? Tenho cãibra...”

“Aonde?”

Eu descia, brincalhão, os olhos pro garoto teso.

“Vá se foder, seu miserável”.

E me atirava na cara, gargalhando, o pano de limpar balcão.

Todos gargalhavam numa confraria.

Naquele tempo, as noites eram excepcionais no Finnegan’s.

Realmente excepcionais.

Havia Vanda Velt.

Que mulher.