segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Sobre o...

tomasse primeiro o remédio amargo, depois a bala de hortelã
é assim que vai ser
o "abismo fiscal" virá
porque tanto democratas quanto republicanos acham as medidas necessárias

domingo, 23 de dezembro de 2012

Sonho de uma noite incandescente

Ellroy colocou a barba de Noel
tomou um gole de uísque
peidou
Fez "ohohohohoh" no vaso
limpou a punheta 
e foi pro pátio do shopping

A mulher de Elllroy tinha 
largado ele com os dois meninos
ele conseguiu ir levando
bem ou mal as crianças
receberam alguma instrução
um era porteiro em um grande hotel
o outro trabalhava com alguma
coisa meio escusa

os dois não o visitavam há cinco anos
foda-se, Elllroy
ohoh 

ele sorveu mais um pouco,
da garrafa, num intervalo,
seus olhos doentes,
injetados de choro frio
de sede

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

É Natal, e o que tenho com isso?


Sempre fico na minha nessa época. Costumo nesse período me embebedar de vinho, muito vinho. Tinto, branco, o que vier goela adentro. Me dá engulho todas aquelas crianças sorridentes, felizes com seus pais, com suas árvores, seus presentes, com o seu novo bicho de estimação. E Noel de escroto cheio.

Fico realmente triste no Natal. É uma época melancólica. A não ser pelo vinho. Lembra coisas que não tivemos quando crianças ou não fizemos quando adultos. Aquelas lojas decoradas, as luzes piscando, cegando, o troço todo em um movimento contínuo e inadiável.

As pessoas ficam alucinadas nessa época. Andam frenéticas pelas ruas, atrás das últimas possibilidades - entenda, descontos -, arrastam uma urgência, um ódio interno e seus filhos pelas mãos. Têm que atender as exigências sociais, as obrigações imprescindíveis. Comprar o peru. Encomendar o assado, a ceia. Reencontrar parentes tediosos, que não viram durante o ano inteiro. As velas. A porra da bosta das velas para os candelabros! Quem usa candelabros hoje em dia... A raiva latejando, gotejando pelos poros. As lojas. O supermercado. As filas. O calor dos infernos.

Mas comigo não.

Isso não me pega.

Eu sou Dusquene, o escritor, meu chapa. O grande Otto Dusquene. E pulo fora disso.

Foda-se papito!

P.S.: Fui a uma festa de uma amiga de Gill. Fiquei tão bêbado de vinho que saí quase carregado. Gill dirigindo. Num determinado momento da festa vi uma dona de 150 quilos, toda de branco, recostada num sofá, levantando no alto da cabeça um cacho de uvas Niágara. Desciam em sua bocona as pobrezinhas.

Cutuquei Gill, já bêbado:

- Porra, tá vendo aquilo, parece NERO!

E daí?

chegaram as drogas das festas de fim de ano
a mesma urgência em tudo
o peru, as lembranças, a porra da árvore, o rolo compressor
do comércio

me deixem em paz!
não preciso de nada disso
as pessoas estão perdendo seus empregos
porque as outras pessoas estão
se convencendo de que não precisam
de muitas coisas que são fabricadas

em 2013
prometo só comprar o básico
para me manter longe das pessoas, e vivo,
não irei a bares, somente o necessário
para um drinque, dois, talvez

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Por que me sinto tão mal em meio a isso


não farão falta
vocês que palmilham nos monturos
vocês que estão nas sombras
que se arrastam e tentam e gritam
não farão falta, vocês,
vocês, mentes mortas desde antes do início
assombroso do crepúsculo nos bares,
que riem de nada e de tudo e de nada novamente
cheirando ao fétido, ao indefensável, ao termo
não farão falta nem aqueles
que se julgam imprescindíveis,
nem os que trabalham na solução da eterna
crise global que consome a todos
e que se esvai em milhões de milhões
de milhões de palavras nas redes sociais
não farão falta porque nem sequer existiram
sobre a terra e os bêbados não falam nos seus
nichos sobre coisas que não existem ou não lhes
dizem respeito ou enfumam os bares com o
cheiro de bebida barata
não, não farão falta nem se Deus se lembrasse
de vocês como os mecanismos da agonia perene
da noite lenta avançando sobre a cidade, o céu da cidade, o céu...
quem são vocês que atormentam as calçadas com suas vidas miseráveis
de serem vividas porque a vida é realmente algo como som e fúria,
e dor e entropia, consumação
não farão falta nem no último momento
quando o tempo parar, quando o tempo, o tempo, parar na morte
haverá apenas um fio dágua descendo a rua,
lentamente,  contornando
seus pés

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Luto 2

qualquer dia desses
as crianças, e seus pais, terão vez
e irão dizer AO GOVERNO:

LIMITE A VENDA DE ARMAS, imponha regras severas

dirão antes que as primeiras estejam mortas
e seus pais, ÓRFÃOS

Luto

Um enraivecido, um qualquer compra naturalmente duas, três, quatro armas
e destroça uma centena de famílias

sábado, 8 de dezembro de 2012

Para o bem e para o mal, iremos

1.
Quanto mais as mulheres ficam nuas, mais o aquecimento é global.

2.
Somos farpas e lodo, distribuídos para todos os lados.

3.
Nome?
- Dusquene...
Só isso?
- Isso basta.

4
Um bom drinque numa bela piscina,
isso é VIDA!

5.
Sempre que podemos, somos piores.

6.
Melhor a farpa no dedo do outro.

7.
Ah, o sol. O maldito sol...

8.
Ressaca é lodo. Às vezes...

9.
"Dusquene, você nunca será famoso".
"Eu não quero ser famoso, só quero vomitar um pouco...
Me deixe em PAZ!"

10.
"Vá se foder".
"Obrigado".

...

não faço de conta
o que eu não sou,
mas sou de carne e osso
e nervos e tudo o mais
que forma o homem

ah, o homem
essa doidice de coisas
carcomidas, esse ajuntamento
de restos e memórias

somos todos
muitos de muita coisa
é a nossa tragédia
é a nossa vida
a vida vivida
de cada um
que temos em
nós

somos, na verdade,
frágeis atropelos e,
em essência,
somente a espécie
mais vitoriosa
sobre a terra

nada mais...




segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Ambiência

1.
As ruas são desesperadoras, muitas vezes.

2.
Todo homem tem que estar prevenido em qualquer ambiente.

3.
Viver é temer, para os fracos.

4.
Muitos pensam que a maior conquista é ter dinheiro e não fazer nada. Isso não serve para mim.

5.
Qualquer amor verdadeiro é meio lerdo.

6.
Ninguém ama tanto que um dia não possa amar um pouco menos.

7.
Viver é um fato. Sonhar é demência.

8.
Amo cerveja, e daí?

9.
Que que é?

10.
"Dusquene, vou te matar um dia/".
"Entre na fila mais uma vez, baby".


quarta-feira, 28 de novembro de 2012

A falta que vocês me fazem num dia nublado



sento no banco do ônibus
sou como penicilina, as bactérias fogem de mim
ninguém senta ao meu lado
o pessoal do trabalho sabe como eu sou
e eu agradeço a eles por isso
por me favorecerem com o seu desinteresse

sinto-me tremendamente agradável
dá até para fechar os olhos e pensar na boa vida
na vida que eu poderia ter e FELIZMENTE não tenho,
graças a Deus

bom mesmo é afogar o ganso,
tomar uma bela cerveja gelada de qualidade,
peidar sem ninguém dar por isso,
viver, enfim,

mantenho os olhos fechados
um idiota ameaça sentar ao meu lado
não, desistiu, sabe bem a bactéria o mal
que o antibiótico causa

sábado, 24 de novembro de 2012

Inauguração de mim mesmo em tudo

não iremos nos ver
muito agora
enquanto estivermos tristes
e for Natal
não se mate, amigo
não se mate
é uma época melancólica
para muitos
que estão sós
nos apartamentos
dos bairros cheios de coisa alguma
como se nada mais pudesse
ser dito, com significado
ou não

mas, nem tente,
nem olhe a árvore branca
com os pingentes azuis, verdes, vermelhos
e a estrela de prata e o peru na mesa
cuja coxa quase engasga
a gorda toda de roxo
ao seu lado
na poltrona

apenas
ria de tudo isso, comova-se e ria
leve a taça de tinto até a boca
beba um bom gole
e sorria



quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Eu só e minha alma cheia de tanta poeira a caminho

A força do homem
vem da sua mortalidade,
é dela que ele vive, ama, ousa e enlouquece,
se sujeita a tanta descortesia,  por si mesmo, por álcool,
mulher, prole, carro, posição social, essa vigarice toda,
que inferniza o mundo e mata o capim

é foda,
e não tem jeito,
e você está nessa até o nariz, camarada,
enquanto você viver nas cidades desenvolvidas do Ocidente, vai engolir, engolir até vomitar,
vomitar, até precisar se encher da droga de novo,
e assim vai

quando morreremos disso?
ninguém saberá até que se dê.
eu com minha garrafa, na escada, debaixo do poste,
esperando o quê, aquele bêbado-profeta
de que falei, prevendo o fim do mundo,
dormindo mais tarde, sob os jornais,
sempre no amanhã,
que vem,
até que...



Coincidências que não gosto

A chapeleta saiu e fez "plock". 
Fizemos a higiene com as toalhas.
"Você me comeu como ninguém, Duc. Enfiou o pau com fibra", falou Vicky Vance.
"È que não fodo há um mês, baby. A nata tava acumulada. Sabecomoé...".
"Mas você tem entusiasmo, mesmo com essa pança toda. Tá claro que gosta de mulher. Tem uns que só se lambuzam. Até metem a língua, mas não fazem a coisa certa. No clitóris...".
"É. É preciso prática".
"Cê nunca é fiel às suas mulheres, não é?"
"Às vezes, fodo com uma muitas vezes. É o máximo que consigo".
"E na velhice, como será?"
"Porra, esse papo está me enchendo, uma merda só...".
Levantei da cama e peguei duas cervejas. Ela tinha TV, liguei. Melhor do que nada.
Tinha um jogo da NFL.
Vi.

sábado, 17 de novembro de 2012

De alma partida mas com uma fé infinita


li no jornal que um cara bateu na mulher
com a primeira coisa que lhe veio à mão:
um poodle branco

Gillmore bateu forte duas vezes com Tiffany na cabeça de Sheylla
no segundo golpe a cadela morreu, o cérebro partiu
o cara foi preso por maus tratos a animal e agressão

Sheylla, com um enorme hematoma no olho direito,
perdoou Gillmore e enterrou Tiffany no quintal dos fundos
numa bela cerimônia, mármore perfeito

os vizinhos compareceram, todos

Dog, brave, dog

estou bem, baby,
só não quero ser mais um cão vadio,
quero que você seja a minha dona,
me salve do abandono,
que cuide de mim

você faria isso por mim,
por esse cão vadio, sedento, poeirento,
que lhe quer um bem danado?

Cão, cão, cão, um cão apenas,
que deseja por coleira,
por enquanto



segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Passagem fosca em meio ao clarão


ando pela rua e vejo o que vejo,
subo as longas escadas do Marítimo,
só me resta beber urgentemente
enquanto as vagas seguem em melancolia

ah, um bar, um fim de tarde,
mulheres com belas pernas chegando
e um copo com uísque e gelo suficientes

a vida pode ser até tolerável,
pode ser até decente
para um homem,
quando ele não agoniza
em um escritório,
queimando num trabalho
ordinário

- Garçom, mais um aqui.
- Certo, Sr. Dusquene.

agora, depois de duas horas,
o sol desce no horizonte,
ligo para minha fonte para
saber o que deu no primeiro prêmio

tudo laranja-amarelado
gostei do bar, realmente gostei,
fica sobre uma plataforma,
sem prédios em volta,
bom para beber
na véspera de uma folga,
que bem mereci

Vaga para deficiente físico


um homem andou pelas calçadas da cidade, ninguém soube
um homem esteve presente nos principais acontecimentos, ninguém notou
um homem sentou em bares pustulentos, bebeu, berrou, e daí?
um homem trepou, mijou, cagou, e não era para ninguém ter visto mesmo
um homem balançou na mureta de um viaduto, burramente, alguns se espantaram
um homem relaxou, mas sofreu muito também, às vezes, quem viu
um homem trabalhou - e trabalha - sol a sol por 28 anos, foda-se
um homem leu os poucos autores que valiam a pena e se retirou para o nada
um homem bebeu todas as bebidas pensando não ser necessário tudo isso
um homem viu suicidas saltando de edifícios, se enforcando ou metendo uma bala no crânio
era eu este homem, era qualquer um, era você
ninguém nem aí

...

sempre há a possibilidade do despejo na Espanha,
da máfia nas ruas de Chicago, da abdução em Pascagoula,
do riso em Paris, da bonomia também em Paris,
da merda em New York ou New Orleans, novamente,
da democracia na Rússia, da solidão em Pequim,
e assim vai, por aí

então, não fique muito tranquilo, camarada,
não recolha muito os punhos,
talvez você tenha ainda que brigar
por muita coisa, ou coisa alguma

DAY BY DAY

o problema é que
ninguém liga para o dia de amanhã
a sociedade norte-americana é perdulária
- talvez venha daí a sua riqueza,
sua urgência de viver,
seu desassombro financeiro
"Ora, US$ 16 trilhões em dívida federal, não é nada".
"O governo que pague. Que se vire..."
"O GOVERNO É VOCÊ, MEU CHAPA!"
Não sou eu quem digo, é o GOVERNO.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

As fezes que várias vezes vomitei

1.
Todo homem tem a mulher que merece.

2.
A fidelidade é um negócio torpe, obscuro.

3.
Os rostos no metrô me esmagam. Passo mal com eles. São caras idiotizadas, idiotizantes.

4.
Todo discurso é uma enganação. Qualquer pulha discursa e pode convencer.

5.
A felicidade é algo que só Deus conhece, de fato.

6.
Beber é um ato de convencimento.

7.
O homem só existe por ser inquieto. Está na essência do homem importunar seu semelhante, diariamente.

8.
Em termos de mulher, o homem está sempre DEFASADO.

9.
Qualquer cachorra é uma possibilidade.

10.
"Dusquene, você é genial".
"Às vezes, baby".

 


Filosofia de albergue

Vicky Valentine deu o rabo e se arrependeu
Era o único buraco virgem em seu corpo
Ellmore aproveitou bem aquele buraquinho
Depois, quando Vicky chorou,
fez de tudo para confortá-la:
"Foi só no cuzinho, bem. Ninguém nota".
"Mas você me arreganhou..."
"Que nada, baby. Só foi a metade..."

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

...


Amanhã vai dar Obama, camarada,
ou me mudo pro Alabama.

Noite de gato ensopado

Para entusiasmar Marion, vesti minha sunga Playboy de seda. Um colosso. Dentro dela, é claro. Meu obelisco do Egito passava, uns cinco centímetros, da borda da sunga, quando vi Marion de lingerie novinha em folha. Aquela égua, linda, loura, carnuda como anca de búfala. Fui me aproximando. Subi na cama e o obelisco venceu a seda, que escorregou no pau. O troço roxo desceu, apontou para Marion como uma seta de "Siga adiante".

Eu ri. Ela gargalhou. Que foda, meu bom Deus. Que foda seria aquela.

Como compro sapatos

Sempre comprei meus sapatos. O homem que não compra seus próprios sapatos não é digno de viver sobre a terra. Tenho um método para comprá-los. Deixo a coisa ficar bem gasta, em petição de miséria. O solado esburacado. Então, entro na loja, escolho um par, invariavelmente preto. Calço. Vou pelo conforto. E nada de fivelas e tremeliques. Coisa de veado. Sapato seco, discreto, forte, para bater. Pago e já vou calçado com o novo. Deixou o par velho e roto na caixa, para que a atendente jogue fora, ou enfie aonde couber. Nem me despeço dos velhos amigos. Que eles se fodam, não fizeram mais do que a obrigação de me servir. Paguei por isso.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

É o slogan até o Natal

Quem ama NY, limpa NY

...

O que falar de Sandy?
E de Katrina?
Mulheres INESQUECÍVEIS
podem falar que Sandy não passou de tempestade...
Para mim foi furação, mano
US$ 50 bilhões em prejuízo...


domingo, 21 de outubro de 2012

Um dia fenomenal em Kansas

um dia o porre foi tão bruto
que guardei a carteira no congelador
do refrigerador
acordei tonto, tropeçando na cadeiras,
uma dor de cabeça infernal,
fui até o banheiro,
vomitei,
depois vi minhas calças
jogadas no corredor do apê,
o alarme acendeu,
fui direto nos bolsos:
- Cadê a porra da carteira? Oh, meu Deus, não faça isso comigo...
Revirei o apartamento como um insano,
procurando a droga da carteira,
tirei almofadas, botei o rosto nos fundos do
armário, observei se debaixo do tapete tinha algum monte,
olhei até na privada, para ver se não estava entupida,
com a ponta do objeto pra fora. Nada.
Aproveitei e caguei para regular os nervos,
me acalmar, respirar.
- Caralho, fui roubado ou deixei a carteira cair do bolso,
em todo o caso, FODEU!
me lmpei e fui até o refrigerador,
uma cerveja talvez melhorasse as perspectivas,
fui, imaginando os documentos que teria que tirar 2ª via,
peguei a Bud e, não sei o porquê, resolvi olhar o congelador,
E LÁ ESTAVA ELA, A MALDITA DA PORRA DA CARTEIRA!!!
A segurei com fervor, tremendo, como se tivesse
em minhas mãos os pregos da Cruz de Cristo.
Beijei o troço petrificado,
sorvi um longo gole da cerva,
e, relaxado, coloquei  a carteira aberta,
ao sol,
e, bem, tudo voltou a ser a maravilha de antes,
um vida que não era das piores.



sexta-feira, 19 de outubro de 2012

...

A merda é não ter quem fale por você; não meu amigo, a merda é o discurso unitário, doido. Como qualquer discurso, fique prevenido, sempre, é fascista.

Meu ódio ou um pouco mais que isso


Minha antipatia
Não é com você, meu amigo,
Não tenho pessoalmente nada contra sua estampa,
Minha antipatia é com o mundo,
Sou contra aquilo que nele existe e se perpetua

Minha antipatia não tem a nada a ver com você,
Não me interessa saber o que alguém faz da porra de sua vida,
Daquilo que nela existe e fede

Minha antipatia é desprezo puro,
Tangível, inabalável, crescente, meio doido, como a doidice do apostador,
Só os idiotas riem de idiotas, nos bares (hoje rirão juntos),
Prefiro ficar apenas bebendo, conversando com os toleráveis,
Não, não estou também falando de você agora, camarada,
Falo do que vejo e escrevo sobre o que não gosto,
É só

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O que guardo em mim e é um pouco humano


1
Sempre que eu vejo a miséria humana, me surpreendo como podemos ir cada vez mais baixo.

2
Existir não é nenhum problema. O problema é a carga que nos colocam sobre os ombros para isso.

3
Deus não estava de bom humor quando me fez.

4
Sinceramente, sou até um sujeito legal, quando não encontro pessoas.

5
A melhor bebida é sempre a penúltima da penúltima.

6
Foder não é para amadores.

7
Casal que trepa unido, divorcia.

8
Ninguém fica feliz no Natal.

9
No Natal, quem paga o pato é o peru.

10
"Acima de seis, é suruba", me disse Sarah Lee.

Um fato diário de mim mesmo

Os sujeitos ficam sentados no bar, esperando o resultado. Quando o resultado sai, olham as pules e grunem "Que merda! Os números que deram não se encaixam no meu sonho. Não mesmo...". E jogam novamente, na mesma esperança vã de ganharem algum para a bebida, para comprar um charuto do bom, para beber um uísque de responsabilidade.  Vão todos num mesmo prato da balança, que inevitavelmente pende para o prato da banca. Às vezes, sobra um para algum. É a festa. O sopro de Deus no talonário das pules. "Willfred ganhou na milhar. 14 mil. Esse Willfred tem o cu pra lua!". Mas na grande parte (na maioria mesmo!) dos sorteios a banca sagrasse vitoriosa. A banca, meu camarada, é o verdadeiro Deus, que permite que você receba um alento ou vá sofrendo, grunindo e rasgando pules verdes e amarelas pelas calçadas da Pomerode.

domingo, 14 de outubro de 2012


Hanna comeu meia pizza gigante. E disse:  - Mais tarde farei um lanchinho.
Allfie olhou para ela com cara de nojo.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

A hora em que não dormimos sós de nenhum jeito

Bill tomou uma tragada e foi cagar. Millie estava na sala com o pequeno John no colo, pronto para fazer no resto da tarde o papel da boa esposa. Iria fazer o café dentro de 30 minutos. Bill iria comprar pão e leite. Comeriam em comunhão e ficariam felizes como bons americanos. Aí Millie viu uma propaganda chamado a América para conhecer o Hawaii.

- Bill, por que nunca fomos ao Hawaii?

Saindo do banheiro, Billie respondeu:

- Por pura falta de grana, baby.

- Um dia vamos, não vamos?

- Esperemos o Jonhnny crescer? - disse o marido olhando para o final da propaganda na TV sobre o 50º estado.

- Você sempre adiando meus sonhos...

- Porra, agora seu sonho é o Hawaii? Por causa desta bosta de comercial? Ontem não era Paris?

- Era. Mas mudei.

- É... ao invés de cruzarmos o Atlântico, cruzemos o Pacífico...

- Você não gostaria?

- Gostaria é de ver a NFL agora. Sossegado... Com um cerveja na mão, depois da semana que tive nos Correios...

- Pro caralho as suas conveniências, Billie - disse Millie, levantando-se com o pequeno John no colo, que já chorava.

- Quer saber. Cê não sabe que o Hawaii era uma colônia de leprosos, ou coisa parecida. Depois do Elvis ir até lá e dizer "Aloha" é que virou essa merda toda...

Mas já era tarde, Millie já se trancava no único quarto do apê com John.

Ah, o Hawaii.

Conformação

"Cê viu sua mulher transando com o cara e não deu a mínima?"

"Para que? Dizer que me importo?"

"Cê não ama ela?"

"Só, às vezes, quando ela não me constrange..."

...

enquanto ela ainda dorme...


estamos muito sós a qualquer hora
mesmo com quilos de ideias na mente
mesmo com o rugir da estupidez planetária
mesmo com essa bagagem de vida
mesmo com tudo isso – e um pouco mais

preciso desse isolamento?
preciso mesmo é da sala do apê iluminada,
dos móveis práticos, maleáveis,
de uns tira-gostos me esperando,
umas latas de cerveja no congelador,
preciso um pouco disso tudo

bom mesmo é voltar para casa
ver Gill dormindo tranquila
ronronando seu ronco
de gata em lençol
de linho

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Mother, father, sweet home


"Mamãe, aí o gatinho, aí..."

"O gatinho vai atrás de quem, Liza?"

"O gatinho? O gatinho, assim, ó..."

"Não é o cachorro?"

"Não confunda a menina, Eldon"

"Mamãe, o gatinho? É, o gatinho... Aí a gatinha foi..."

"Tá vendo, ela já sabe das coisas"

"E o ratinho, Liza? Onde está o ratinho?"

"O gatinho? Tá ali... O gatinho? É... O gatinho? Aí ele foi... Aí, a gatinha...".

"Pelo visto isso vai até amanhã", disse Eldon, voltando a ler o jornal.

"Deixe a menina, Eldon"

"O gatinho? O gatinho foi... dormiu..."

...

3

Bullgreen encontrou
Genie molhadinha da cintura para baixo
... na piscina

...

2

Megg Lee
foi ao bosque
encontrar o lobo mau
que não quis conhecê-la
por medo da herpes genital

...

1

eu,
esse ponto em meio a milhões,
nesta cidade pavorosa em que pessoas se levantam de suas camas
para fazer alguma coisa que só importa a elas, que somente elas julgam NECESSÁRIA,
e não medem esforços para atingir, bem, isso já é um fator a se levar em conta,
quando formos bater a contabilidade

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

...

qualquer coisa é um tiro no saco,
viver é um tiro no saco,
detesto cada vez mais as pessoas,
são repugnantes, em essência,
todas pensando nas suas felicidades,
em ter momentos agradáveis, em viajar
para qualquer canto para conhecer
pessoas agradáveis, beber, descansar
numa espreguiçadeira branca, de neve 

sonhando bolas deletérias
de nada, nada em suas mentes,
como um peixe enfermo num aquário,
tomado pelo lodo grosso e nauseante
das irritabilidades, da falta de humor,
da sensaboria que tomou conta de 
suas vidas, há muito tempo

qualquer coisa que se diga agora é,
sim, um tiro no saco de Deus,
que o velho está cheio dessa droga, 
duvido que não



 


sábado, 6 de outubro de 2012

Cotidiano


encontrar culpados é fácil
mas a situação se complica
quando o ambiente é o mesmo
quando as caras e os corpos
são os mesmos e as expectativas
diminutas

certamente isso não ajuda muito...
enquanto o preço da gasolina não se estabiliza

então,
suamos nossos trocados, tentamos tomar fôlego,
escapar da ARMADILHA, do GRANDE MAL,
do MONSTRO cotidiano do TÉDIO

inventamos histórias, escrevemos,
conversamos, trepamos,
mas nada disso importa muito
até nossa morte

então,
esgotadas todas as chances,
rasgado o pano verde, perdidos os dados,
nos damos por vencidos
e vamos ao primeiro bar para o último drink,
com o pouco de hombridade
que nos resta

enquanto ela ainda dorme...


estamos muito sós a qualquer hora
mesmo com quilos de ideias na mente
mesmo com o rugir da estupidez planetária
mesmo com essa bagagem de vida
mesmo com tudo isso – e um pouco mais

preciso desse isolamento?
preciso mesmo é da sala do apê iluminada,
dos móveis práticos, maleáveis,
de uns tira-gostos me esperando,
umas latas de cerveja no congelador,
preciso um pouco disso tudo

bom mesmo é voltar para casa
ver Gill dormindo tranquila
ronronando seu ronco
de gata em lençol
de linho

Escadas rolantes fazem mal aos olhos


Sou obrigado a ver dezenas de bundas murchas, ignóbeis, toda vez que subo uma escada rolante. Por isso, deveriam ser proibidas. Não as bundas, mas essas escadas. Não quero vê-las (as bundas), mas elas ficam enfileiradas e em ascensão na minha frente. Não há como não notar. Temos que cuidar dos nossos olhos assim como cuidamos dos genitais. Podemos sujá-los às vezes, mas não toda hora. E escadas rolantes sempre oferecem um espetáculo constrangedor.

O formato é variado. Existem os de bunda chapada ou reta, de bunda meia bomba, de bunda meia-taça (em que os pomos caem de repente e ficam ali, pendurados, como massa desprendendo) e os bundões - ou quase isso. Há também o bundão cavalar, megalômano, indecente. Tem de ser de ferro a privada para aguentar um desse tipo.

Todos os dias na volta do metrô sou forçado a me deparar com essa tragédia móvel. Mas há um consolo. Algumas mulheres têm atrás o que muitas vezes lhes falta na frente. E disso eu gosto.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Um é algo e nunca

qualquer coisa antes das 19h é uma droga,
um desperdício de tempo,
um trabalho repetitivo para gente que geralmente não merece
nem o nosso olhar, misericórdia alguma.

almas de escritório, seres cartorários, almas mortas,
sem assunto, sem verve, sem gana, educadas demais,
aprazíveis demais, manejando suas gorduras e "bom dias".

é, mas depois das 19h há sempre a possibilidade do drinque
no Steffano´s, longe disso tudo e dos prédios quadriculares.





A merda nossa que vaza todos os dias


o diabo é
o ramerrão
a falta de perspectiva
de grana
as solas dos sapatos gastas
as meias furadas nos dedos e nos calcanhares
o sem saco de
comprar meias e sapatos

o diabo é
o sol, o maldito sol rompante,
o café oxidado
na térmica
de quinta
a danação das ruas
a vontade de ver ninguém
a ressaca bruta
o bolor no armário
e o periquito verde
do vizinho
a pane mental, enfim,
a perda de sensibilidade...

Catálogo das mulheres que não tive


ela é sexo puro
um ser alado e portentoso, essa mulher...
suas asas são suas omoplatas
- sempre considerei as omoplatas femininas como asas
em nascimento

ela se volta
um instante e sorri
só assim sinto que nem tudo está perdido
que talvez valha a pena colocar a mão na merda
e revolver o limbo à procura da pérola

só assim
penso que exista vida
pelo menos nela
em seu corpo esguio, louro, branco

então, a minha dureza, meu egoísmo
meu ódio por tudo, a minha falta de fé
em relação à humanidade
quase chegam a desaparecer
quando ela surge na calçada
e logo desaparece
numa maldita
esquina
que não deveria
nunca
estar ali

Sensação de merda no sapato esquerdo


é preciso sinceramente que haja algo melhor que isso,
do que observar esses rostos óbvios, frequentes,
à espera do próximo pagamento,
do próximo telefonema,
da próxima viagem interestadual,
do próximo fim de semana,
do próximo reality show,
para que eu consiga me apossar
das sobras de mim

não quero ter contato com 99% da humanidade
mas estou cercado desses 99%
sou um ser solitário e mal-humorado
não me dou bem com gente
só com cervejas e jogo de números

a cada dia a tensão aumenta
não consigo sequer olhar para seus rostos...

mas sempre há a perspectiva
da próxima viagem interestadual,
do próximo fim de semana,
do próximo reality show,
do próximo telefonema,
para que, enfim, esses 99%, envolvidos pelas novidades,
desapareçam por algumas esplendorosas horas

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Entre o mundo perdido que eu não tive apenas

1
150 quilos
e comendo amendoins...

2.
Muita gente que eu olho, me enoja.

3.
Não sou um poço de virtudes.

4.
Viver é paciência.

5.
O mundo não se vê num dia.
Vê sim.
É só abrir a janela do quarto, porra.

6.
Ser humano é a mesma impiedade. Aqui, em Pequim ou em Tegucigalpa.

7.
Beber é um modo apenas.
Um entre tantos...

8.
Qualquer pergunta merece o SILÊNCIO.

9.
Qualquer pergunta é INVASIVA.

10.
"Dusquene, o pato que anda".
O Duc.


Ei, cara, vá para o inferno... e leve sua mãe


Eu não ando legal, mano
Não brinque comigo
Não ando bem nessa selva de pedra
Realmente não estou confortável

Eu deixei de fumar há onze anos
E por isso ando nervoso,
facilmente irritável

Hum.... Huuummm...
Mas aquela dona de peitos imensos
Aquilo está me deixando easy
É, legal,

Isso, e o uísque,
A minha fé nos homens é mínima, risível
Mas não a maldita sorte dos diabos
Quem sabe? Vamos apostar um pouco...
Leve

Muitos são a pior imagem de si mesmos
ééé -
e não podem ir mais fundo no poço,
pois já estão nele
até o umbigo
ou em um nível
mais abaixo
cheirando bosta

domingo, 30 de setembro de 2012

Particularidade de uma expulsão do quadro de avisos


estou cada vez mais sem paciência com a humanidade
meu mau-humor crônico pode estar agravando a situação,
mas sinto que a imbecilidade geral está aumentando
como as heras nos muros
como os lodaçais dos trópicos
como as ervas daninhas nos campos abertos

e não tem volta
a estupidez humana é atávica
abrange todas as classes sociais
todas as culturas e religiões
todos os militarismos
rebelar-se é inútil
tentar escapar
também

por essa e outras razões
prefiro comprar uma dúzia de latas de cerveja
e ficar mamando, só, tabulando as teclas do computador,
sem querer encontrar sentido algum para coisa nenhuma

O que rescende a fósforo e gás


essa fortaleza foi erguida aos poucos
ao longo dos anos na planície
ouvindo o ranger da maquinaria
vendo a moedura de carnes e ossos
presenciando o amargor do povo

minha rigidez,
meu escárnio, meu desprezo
foram construídos lentamente
vendo o que fazem os homens
para se manter com o nariz
acima do nível da merda

essa construção
do que hoje eu sou
foi feita de sensibilidade cortada
em tiras, jogadas ao chão

assim,
se sou o que sou agora,
é porque vocês me fizeram pior do que eu
me imaginava

Um pouco de lama em tudo e todos


1
Não creio em gente, nem que o cachorro não morde. Se tivesse que acreditar em um dos dois, confiaria no cachorro.

2
O que você mudaria no seu passado? Preferiria não ter nascido.

3
A convicção é a receita do idiota. Por causa dessa superstição, ele perde mulher, carro e sanidade. Existir é conviver com o caos.

4
Se eu passei todos esses anos na planície só, porque agora tenho que me importar com uns e outros. Que se fodam!

5
Consciência é necessária para não assassinar o dono do cão, quando se descobre, pelo cheiro, a merda no sapato.

6
Eu sou Otto Dusquene.
Você, quem é?
Uma página em branco.
Um nada consta.

7
"Você se acha muito importante, não é, Dusquene?"
"Não sou pior nem melhor que muitos"
"Ah, um resto de humildade, enfim"
"Também não sou igual"
"Vá se foder, Dusquene!"

8
O ruim é a mocinha tlec-tlec logo atrás de você, saindo do metrô.
É enervante.
Paro pra deixar a vadia passar.

9
Vê se lê Bukowski, Fante, Kerouac,
Esqueça essas merdas, cara!
Sinta o vômito da rodoviária e dos becos.

10
E pra finalizar...
Boceta é a commoditie mais barata do mundo.

sábado, 29 de setembro de 2012

Baby, éhhh

e fomos,
no turbilhão da vida,
um pouco melhores que muitos,
e muito piores que nós mesmos

nos magoamos,
mas suportamos o ramerrão,
sem uma fresta no muro,
superando um dia após o outro,
até o fim, sob o sol fervente,
na cara, de chapa

é foda,
eu sei, é foda,
e nos fodemos também,
para não perdermos a viagem
 

Reflexão num dia de tempestade


a vida é passageira, homem,
mas parece que já vivi um século
no meio do turbilhão há quase cinco décadas
e hoje estou melancólico, triste mesmo
quero meus bons tempos de volta
mas sei que jamais os terei
e terei que seguir em frente
mesmo assim
bem ou mal
em frente
sempre

creio sinceramente
que os bons tempos já passaram
e realmente estou chateado por isso
era um tolo, mas havia sempre a possibilidade
do ouro na moldura dos dias que viriam

o que me resta agora é engasgar com o metal na boca seca
revirar no sofá, confrontar essa angústia no peito
e o maldito sol que desponta
atrás da persiana

Passagem para...


"Senhores usuários, é proibido agachar ou sentar no chão do metrô", diz a voz feminina mecanizada que sai da tubulação.

Mensagem completamente inócua.

Os vagões chegam e partem repletos de gente que não consegue nem respirar. Comprimida até a ponta dos pés. Muitos passam mal, alguns desmaiam, por ficar os 45 minutos da viagem imóveis.

Essa sorte não basta.

Durante o percurso, o sujeito pode se acomodar bem em frente a outro que lê, que reza em voz alta e quer que todo mundo vá junto, no embalo.

Se há um trem para o inferno, é o metrô na hora do rush.

De vez em quando há uma diabinha suculenta, mais é raro. Muito raro.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Um turbilhão ipsis litteris

1.
Os caras realmente durões não leem nada.
Eu leio,
Logo, sou uma bosta.

2.
Mas existe outro tipo de dureza,
que é aguentar o ramerrão
por 30 anos,
aí tenho algum valor,
só assim.

3.
Se o barbante não aguenta o peso, é melhor nem tentar.

4.
Estamos sempre correndo para ficar no mesmo lugar em que estamos.

5.
Qualquer palavra é um vazio completo em si mesma.

6.
Perder é uma forma de se achar um pouco. De testar limites.

7.
Sou um fraco de nascença.

8.
Qualquer idiota pode ser mais idiota do que você pensa.

9.
Um sujeito que não tem nada a perder é uma ameaça social.

10.
Hitler não tinha.



Sondra Coxmoney


Eu via Sondra Coxmoney levantar a bunda da cadeira e algo em mim se erguia também. Aquela mulher era um assombro, o ideal de qualquer homem. E estava ali, à mão. Eu adorava suas saias justas, seus peitos, suas pernas, tudo nela era SEXO, do mais alto nível, se é que isso existe.

"Sondra, você me mata um dia desses...", eu brincava e piscava.

Ela ria. Eu também. E assim ia.

Até que um dia eu não aguentei mais.

"Que tal uma escapada na hora do almoço".

"Não posso, Otto, já tenho compromisso".

"Fica para outra vez".

"É, quem sabe?".

Ela encheu a garrafa no bebedouro, sorriu e saiu rebolando sua anca de égua. Eu fiquei ali, vendo aquilo, parado, com a vara querendo romper a cueca.

Deu a hora do almoço. Eu sai. Segui pela galeria até o restaurante a quilo mais próximo. Dez metros à minha frente vi Sondra andando, presa na cintura de uma loura. Pareciam se divertir bastante.

É, Dusquene, não se pode ter tudo na vida, nem Sondra.

No vácuo daquilo que nos tornamos sóbrios


as pessoas afiam suas garras
em outras pessoas
é seu modo de ser
cumprem um requisito intríseco da espécie
precisam rebaixar
para se sentirem iguais
necessitam da ironia para sobreviver
morder a mão que as alimenta
só para registro
distração
ou posse

isso vai num crescendo
e afeta a todos da roda
- é o caralho esse sistema,
mas evolutivamente funciona:
elimina os fracos

quem não aguenta o ramerrão
a pressão da máquina
se fode
enlouquece,
se mata
ou se transforma
em algo pastoso e vil

milhões de pessoas
caminham pelas ruas sem sonho
ou perspectiva,
geralmente se aferram à primeira
tábua de salvação que aparece,
uma religião, uma seita doida, um vício, esporte,
qualquer coisa serve...

então a estupidez da vida se multiplica
e toma de assalto todos os transeuntes
até ouvirmos a frase definitiva
- que ouvi esta semana...

uma mulher se jogou do 10º andar da Blackshoes street,
o corpo estatelou a menos de dez metros de velho Jo
que, sentado, continuou a beber calmamente seu trago
e apenas comentou, segundos depois,
"não disse que ela ia furar a fila? eu falei..."

Um troço rombudo


"Lucy, quer ver meu caralhal?"
"O que?"
"Tenho uma plantação de caralhal. Tenho só a espiga matriz. Quer ver ela?"
"Se quiser me mostrar?"
"Quero".
"Então mostra".
"Ó".
"Porra, seu caralhal é enorme, Jimmy".
"Com este caralhal levo você pro céu".
(...), disse Lucy

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

a cidade morre ao longe


ainda estranho
a falta de humanidade
estranho a insensatez que há em tudo
e esse silêncio,
em tudo

os gatos não fazem mais barulho nos telhados
suas brigas sexuais me acalmavam
não ouço mais os gatos
só o depressivo ladrar dos cães
ao longe

longas madrugadas
e nunca reparei no céu
estrelas são luzes mortas
gosto de apreciar os ruídos da cidade insone

sei que os hospitais estão repletos
sei que os bares estão cheios de não profissionais
sei que os vagões do metrô ainda funcionam
sei que nos becos há assassinatos e roubos
sei de tudo isso

só não sei que fim levaram os malditos gatos

No more, Blackbird


nem sempre vou bem comigo mesmo
geralmente isso acontece a maior parte do dia
e quando não tem qualquer bar por perto
a coisa fica realmente tensa

vejo tanta gente medíocre passeando com os seus carrões
gente que nunca leu Bukowski, Fante, Kerouac, Corso
gente de grandes bundas gordas arrotando o último
benefício ganho
gente podre
em si
gente

nem sempre acontece de eu querer sair à rua
- isso sempre ocorre, geralmente quando acordo
mas há a obrigação do trabalho insosso,
envolto no dia abrasivo, solar

meus pés doem,
meus ossos doem,
o estômago, os rins, o pâncreas,
as articulações cansadas do mesmo moto continuum
de 27 anos

tudo somado hoje
não dá sequer uma sombra de homem,
que se mescla a pessoas satisfeitíssimas
com suas novas aquisições e empregos fáceis,
igual entre os parvos

Butterfly


uma borboleta negra e laranja
pousou em mim
uns podem ver nisto
um milhão de significados

para mim
aquilo não passa de
duas folhas que balançam
- comida de pássaro

entenda
não há significado algum
no aterrissar de um inseto
em você
ele apenas queria
sorver uma gota de suor de seu braço,
talvez

pare de ver nos acontecimentos
presságios erradios
tome um trago
trepe

meus olhos céticos
observam com a mesma dura indiferença
o propósito que somente os iniciados enxergam

A ela


Nunca farei você chorar
Nossas brigas são nada
O mundo é bosta
Para o que fomos,
Somos e seremos,
baby

Você é o meu amor de ontem,
De hoje e sempre, sempre
Você me embarga a voz,
Me faz querer ser humano,
Só um pouco

Não me importa, só você e o tinto agora,
Você sempre foi – e será – o meu melhor
O melhor que consegui na vida,
O melhor caminho,
A maior alegria,
Meu bem

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Intervenção


"Então, sr. Dusquene, o que tem a dizer?"

"Que estou seco. Que tal um tinto?"

"Esta reunião é justamente para você diminuir a bebida"

"Pensei que as duas estivessem aqui para uma farrinha particular"

"Concentre-se, sr. Dusquene, somos da Assistência Social. Sua situação é deplorável"

"Não menos lamentável que a do cachorro do vizinho"

"Que tem ele?"

"Sei lá. Sarna?"

"Que tal parar de beber por uma semana?"

"Que tal um dia?"

"É pouco. Quatro"

"Fechamos em dois"

"Tudo bem"

"Mas a partir de amanhã e com uma compensação"

"Qual?"

"Irmos imediatamente para a cama"

"Seu filho-duma..."

Um evento natural no Grand Hotel


Fred: Oh, meu Deus... O que é isso! Você quase decepou a minha glande! Puta-que-o-pariu!

Melissa: Desculpe (cuspindo saliva e sangue)... Eu não tive intenção.

Fred: Eu lhe disse pra tirar a porra desse aparelho ortodôntico antes do boquete! E agora? Pegue uma toalha... Oh, Deus...

(Melissa corre para o banheiro. Volta com uma toalha de rosto).

Fred: Sua cadela! Olha a enxurrada... Tem que ser de banho. De banho! Ligue pra emergência!

Melissa: O que?

Fred (já agachando): A emergência!

Melissa: Mas, e a toalha?

Fred: Esqueça a toalha. Ahhgg...Oh, meu Deus! Não para de sangrar. Estou ficando tonto... O que você está fazendo?

(Melissa, olhos assustados, girando a chave e abrindo a porta).

Fred: Aonde você vai? Volte aqui, vadia... Estou vendo negro.

Sete horas depois Fred foi achado morto, estendido sobre o carpete. Segurava os colhões, num mar de sangue. O tampo da glande do lado.

Uma ansiedade que me anima


se ela vier é porque quis
estarei aqui esperando no apartamento
o gato passará no patamar da janela
anunciando sua chegada
mandarei que ele desça

então, eu me levantarei
abrirei a porta e uma cerveja
e esperarei sua chegada
aguardarei um pouco mais
e fecharei a porta
se ela não vier...

sempre fui avesso a esperas
mas, por ela, farei um esforço
mas depois de dez minutos
voltarei a colocar meus pés
sobre a mesa de centro
coçarei meu saco
e abrirei outra cerveja
talvez não nessa ordem

Não pode a covardia agora, não agora


talvez eu faça um poema
que não fale de bêbados e bares
dos vencidos, dos desprezados,
do horror de crianças abusadas
em rodoviárias,
em obras inacabadas

um poema
que não fale da catequese
dos profetas de metrô tentando a todos com a conversão,
no último minuto da volta do relógio,
vaticinando momentos catárticos,
inesquecíveis

talvez não fale da grande dor
que é padecer na miséria dos cortiços urbanos
- 30 mil pessoas somente em (...) - ,
sabendo-se sem saída, com seus filhos,
filhos muito pequenos,
tão vulnerados,
em plena noite de Natal
em qualquer região
em qualquer cidade
em qualquer rua
em qualquer beco
em qualquer escada
ou vão

mas, então, do que falar na porra, no caralho deste poema?
às vésperas de perus e presuntos em mesas fartas, decoradas,
e tão distantes... deles

domingo, 16 de setembro de 2012

Científico como Deus ao sol

1.

- Qual canal você quer? 2, 4, 6, 10, 12 ou 14 ou 16 ou 18, sei lá. Escolhe...

- Você não tem tv a cabo?

- Não. Prefiro ver a porcaria toda que está entorpecendo a cabeça da humanidade... Sentir o perigo que me ronda...

- É, não deixa de ser uma razão...

- Não é?

- É.


2.

- Dusquene, quando você vai deixar de ser um filho-da-puta insensível?

-  Quando você for publicado?

- Nem assim. Escrevo para mim, nem penso em vocês.

- Como assim?

- A humanidade é o povoado de amebas que observo ao microscópio.

- ...

- Científico, não?


3.

- Você tem algum objetivo na vida?

- Ir vivendo... Juntando um troco para a velhice.

- Como?

- Camarada, eu não sei você, mas eu ralo há 30 anos em trabalhos escrotos, mentais, mas escrotos. Um dia vou me aposentar e vou esfriar meus ovos em uma piscina de água bem fria.


4.

-  Abigail, onde estão meus ovos?

- Nas calças!

- Não seja emgraçadinha comigo.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

O profeta nosso de cada dia


Ele passava quase todos os dias pela avenida, no meio da noite, gritando a plenos pulmões que o mundo iria terminar em poucos dias. "Vocês vão ver seus palermas. Ficam ajuntando dinheiro sujo, escroto debaixo do colchão... VOCÊS NÃO TERÃO TEMPO DE GASTÁ-LO!"

Alguém gritava de um dos apartamentos.

"E o que você nos aconselha, Sulffock? Que a gente dê a grana pra você?".

Sulffock, de barba longa e cinzenta, roupas puídas, olhava para cima, tentava em vão achar o remetente da mensagem no meio das luzes acesas.

Não conseguindo, berrava:

"DEEM SEUS RECURSOS AOS POBRES DE ESPÍRITO! PARA QUE POSSAM SANAR SUAS MISÉRIAS E NECESSIDADES FÍSICAS ANTES QUE VENHA A CALAMIDADE TAMBÉM SOBRE ELES".

Um outro gritou.

"Acabe com essa gritaria, seu alucinado. Todo o dia é essa porra! São quase 11 da noite. Tem gente que precisa trabalhar amanhã. Vê se arranja uma sarjeta pra você se encolher e dormir".

"FALOU A VOZ DE UM PECADOR EMPERDERNIDO!", malhou Sulffock, desta vez identificando o dono da voz e apontando para uma das janelas onde se encontrava um gordo de 130 quilos, de camisa branca.

O cara ficou puto.

"FIQUE QUIETO! NÂO SE MEXA! VOU AÍ PRA LHE MOSTRAR O QUE É UMA CATÁSTROFE IMINENTE!", disse e saiu da janela.

Depois de procurar Sulffock durante meia hora pelos becos e vielas do quarteirão, o homem o encontrou dormindo como criança, numa manjedoura feita de pilhas de jornais velhos, que ele catava de dia para ganhar a vida e manter toda a vizinhança informada sobre os futuros e inadiáveis acontecimentos.

Dias nossos que não temos porque não são realmente


os domingos são sempre dias mornos
entristecedores
são intervalos reais
entre a folga e a semana turbulenta

domingos servem mais a entidades preguiçosas
não aos homens
é como se houvesse uma quebrar no tempo
ou melhor, um soluço,
para então voltarmos à realidade de nossas vidas
insignificantes
comuns como um abrir de padaria

não gosto dos domingos
creio que 90% do Ocidente estão comigo
são dias realmente estranhos
nem úteis
nem agradáveis
plenamente

além disso, muitos bares fecham nesses dias
piorando a situação
agravando demais
a minha situação

A miséria que nos une na latrina


estamos sempre querendo
coisas que não são nossas,
sentimentalmente falando

o pouco - ou muito -
que conseguimos
não nos basta
a química não bate
a contabilidade não bate
nunca estamos felizes,
mas apenas
levemente satisfeitos

a essência do ser humano
é a incompletude
do amor
do vício
do sexo
da fuga
de deuses
e de tudo o mais

e, porque estamos
compreensivelmente sós,
mesmo num estádio de futebol,
nos damos ao prazer
de uma infelicidade mínima
mas permanente

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Uma semana de cão

Eu fumava uma carteira de cigarros por dia. Plaza ou Carlton.

Comecei a tossir desbragadamente por uma semana seguida. Uma tosse seca e constante.

Fui no médico. Doutor Medenhorf. Clínico geral.

- Tosse. Respire devagar. Agora tosse.

Medenhorf auscultou meus pulmões com o estetoscópio.

- Hummm. Sei não. A coisa não vai bem para você, rapaz.

Ele preencheu uma guia.

- Tire umas radiografias dos pulmões e volte aqui. E logo!

Sai do consultório já prevendo o pior. A doença maldita.

Fiz as radiografias no mesmo dia de tão ansioso que estava.

Liguei à tarde para a secretária do doutor. No outro dia, às 10 da manhã, eu estava no consultório.

Medenhorf tirou as duas radiografias do envelope duro da clínica.

Pôs no contraluz. Olhou por três ou quatro segundos e disse à queima roupa:

- Nunca vi algo parecido em toda a minha vida profissional...

Olhei para o doutor e depois para as radiografias no contraste.

- O que o senhor nunca viu?

- Seus pulmões estão envolvidos por uma película visível, clara como água. Está vendo?

Ele apontou áreas ao redor dos pulmões que realmente apresentavam um contorno indefinido, esbranquiçado.

- E isso é ruim?

- Péssimo, meu rapaz. Você deve ir urgentemente a um pneumologista. Logo!

Sai mortificado da consulta, com o envelope com as radiografias debaixo do braço.

Marquei a consulta com o pneumologista. Só tinha vaga daqui a uma semana. Não tinha jeito. Mesmo dizendo que era caso de vida ou morte, de pré-enterro, só daqui a uma semana.

Foi uma semana dos diabos. Uma espera cruel, aterradora.

No dia da consulta, lá estava eu no consultório do pneumologista.

A atendente me chamou. Entrei no consultório. Expliquei o caso.Ele me pediu as radiografias e as colocou no contraluz.

Olhou-as por três segundos.

Não aguentei:

- É câncer não é?

O médico me olhou.

- O senhor não tem nada nos pulmões.

- E essa película branca ao redor deles? - apontei.

- O senhor deve ter se mexido um pouco na hora em que as radiografias foram batidas. Noto que o senhor é muito ansioso... Esses contornos são normais... É o estremeção.

Vi sangue. Na minha frente só um nome: Medenhorf.

Agradeci o doutor. E sai dali. Precisava de um telefone público.

Liguei para Medenhorf. A secretária atendeu. Pedi para falar com ele. Caso importante. Ele não atendia ligações, mas, quando a secretária lhe disse quem era, ele ficou curioso.

- Medenhorf falando...

- É você, seu baita filho-duma-puta? Aqui é o Dusquene, o paciente que você enlouqueceu por uma semana dizendo que meus pulmões estavam envoltos por uma película cancerígena...

- Mas eu nunca disse que era câncer. Só imaginei que...

- Pois não imagine, seu traste! Você não sabe a semana dos cachorros que me fez passar. Você não é médico Medenhorf. Você é um sádico, um carniceiro, um carrasco, é isso que você é...

E desliguei, quase quebrando o telefone público.

Depois olhei para o envelope com as radiografias dentro dele.

Rasguei tudo com vontade. E deixei o espólio ali mesmo na rua.

O gari que se fodesse.








segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Da minha janela fria


você só conhece a cidade quando ela adormece
às 3h da manhã
quando chega perto
olha pela vidraça e vê carros esporádicos
passando sob os postes de luz laranja
vê o asfalto como uma enguia reta e cinza
indo e indo e indo

a longínqua sirene dos bombeiros
os gritos dos bêbados e suas brigas
o sexo dos gatos nos telhados
são esses os verdadeiros ruídos da cidade

não a loucura diária
não o café da manhã
não o jornal fresco
não os passos dos homens e seus trabalhos
não a normalidade aparente

cidades são como crimes a céu aberto
com seus prédios e sarjetas
hospitais e necrotério
guaritas e cancelas e becos

são
momumentos pagãos
a um deus qualquer
dê a ele você o nome que quiser
mas são um tributo a um deles - Moloch, talvez -
isso eu sei que são

O que fazem os homens às quintas


Wilbur caiu doente
A doce Mary cuidava dele
Mas Wilbur piorava
nas mãos de Mary
Por que?
Ninguém sabia
Mas quando Mary
tocava Wilbur
ele esfriava
e não queria negócio

Mary se conformou
até certo ponto
até que descobriu
que Wilbur comprara,
há seis meses,
Lola Rodriguez,
uma boneca inflável,
que ele amava mais que Mary

Os jornais noticiaram
no dia seguinte
o assassinato a faca de Wilbur
e o picotamento,
até as tripas,
de Lola Rodriguez,
pobre coitada

sábado, 8 de setembro de 2012

A derrocada de um pequeno homem


- Ehhe. Ehhhehhheeh.

Olhei. Era um velho, chamado Sigmour.

- Que foi? Não vai com a minha cara? - perguntei.

- Eu já tive mais mulher que você, Dusquene.

- Bom pra você – eu disse e beberiquei meu gim.

- Guardo o nome de todas as mulheres que fodi neste caderno. Ehhhehhhh.

Sigmour balançava uma agenda ensebada, ou algo assim.

- Como é que é, seu maníaco?

- Tá tudo aqui. Nome, local, horário da trepada.

- Você precisa ir ao psiquiatra, Sigmour. E isto é pra já.

Sigmour abriu o livro.

- Ahh, tive mais mulheres com “V”: Victoria, Vance, Vanda...

- Wanda não é com “w”? – perguntou um dos clientes que acompanhava a conversa.

- As minhas são com “V”. Tive três VANDAS.

Sigmour abriu seu sorriso desdentado. Tinha uns 70 anos.

- Me orgulho muito deste livrinho.

- Deixe-me ver os nomes – disse o cliente.

- Isto não é para seus olhos, filho – disse o velho.

- Queime ele - eu disse – ou passe os nomes a limpo. A agenda está porca, imunda. Acho que você não consegue ler os nomes que estão aí.

Sigmour ficou puto.

- ISTO É MINHA VIDA, DUSQUENE. ISTO É TUDO O QUE ME RESTA NESTA MERDA DE VIDA. NÂO ME VENHA COM BRINCADEIRAS!

No que ele falou a agenda veio abaixo. Esfarelou-se.

As folhas espalharam-se pelo chão do bar. Caíram aos pés das pessoas.

E estavam todas em branco.

Sigmour olhou as folhas jogadas pelos cantos. Sua boca começou a tremer. Depois seus braços e pernas. Depois ele inteiro.

Via diante de mim o desmoronar de um pequeno homem. De uma ilusão.

Fiquei triste. Mas não podia fazer nada.

Aliás, fiz. Levantei Sigmour do chão.

Paguei a ele uma bebida forte. E continuei a beber meu gim.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Sempre há uma possibilidade de escapar do inevitável


No futuro, homens se deslocarão em grandes cilindros. Explico. Você será acondicionado em uma cápsula com espaço para uma, duas, quatro, dez pessoas. E, a partir de um poderoso sistema de sucção e propulsão magnética, será jogado numa espécie de autopista. Chegará assim por exemplo, de forma programada e numa velocidade espetacular, no local de trabalho, a 200/400 km de distância.

“Oh, meu Deus, vomitei todo o almoço”.

“Frank, cadê Jezebel?”.

“Sei lá, deve ter embarcado na pílula errada...”

“PARA ONDE, FRANK? MINHA POODLE ESTÁ PERDIDA! VOCÊ TEM DE ENCONTRÁ-LA!”.

“PUTA-QUE-O-PARIU, MARTA! SÃO TRINTA E DUAS OPÇÕES DE EMBARQUE NA CANCELA TRÊS. COMO VOU SABER ONDE A CACHORRA SE ENFIOU?!”.

“FALE COM O MONITOR DO SETOR, POR FAVOR...”.

Não adiantou. O monitor tinha mais o que se preocupar. Disse que não vira animal algum perdido nas imediações. Só restava comunicar ao Setor de Achados e Perdidos.

Para lá se dirigiram.

“Mas vocês cuidam de coisas vivas, não?”.

“Se não forem muito agressivas...”, disse o sonolento rapaz da recepção.

“Ela morde, às vezes...”, atalhou Frank.

“FRANK!”

“Se tentar morder vai pro CEO direto”, emendou o garoto do balcão.

“CEO? Mas o que é CEO?”

“Centro de Eliminação de Objetos... Objetos que estão com defeito são descartados na fornalha”.

“O QUE?! VOCÊS NÃO DIFERENCIAM COISAS INANIMADAS DE VIVAS”.

“Não temos tempo pra isso, madame. O trabalho aqui é corrido. Vazou, explodiu, enguiçou, mordeu... Vai pro fogo na hora”.

“SEUS BRUTOS! QUERO VER O GERENTE DESSA ESPELUNCA AGORA! EXIJO VER O RESPONSÁVEL!”, esbravejou Marta.

Seguiram um dos auxiliares por um corredor longo e escuro. No final do mesmo, o rapaz apontou uma porta de vidro, onde se lia:

“SR. HUMBOLDT CABLE. Gerente-titular do SETOR B-3 de Achados e Perdidos. Proibido terminantemente entrada de animais. QUALQUER UM!”

“Outro dia inesquecível...”, disse um conformado Frank, girando a maçaneta para a passagem da mulher.

Às vezes é apenas um momento


é fácil perceber a rua sem saída
quando damos de cara com o muro
quando o estacionamento do supermercado
está lotado

é fácil ver quando as contas vencem
quando o saco de lixo vaza
o ralo entope
a merda flui

quando o cachorro fez as necessidades no carpete
quando vai ser um dia daqueles
e quando a dona de bunda e coxas tensas
está também num daqueles dias
eh, sei não
fico quieto
bem quieto

é
é fácil
realmente
perceber as coisas
palpáveis, concretas
de aço

mas como não conseguimos compreender
com a mesma exatidão e urgência
A DOR DO OUTRO

se a solidão e a desistência
- e o suicídio -
estão bem ali
escancarados em cada rosto

Otto Dusquene, agora

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

As ruas

as ruas estão aí
e temos que fazer alguma coisa com elas,
temos que deixar nossa impressão nelas,
nossos passos trôpegos,
nossas histórias vagas, remotas,
nossa miserabilidade por inteiro

temos que olhar para elas
e elas precisam devolver o olhar
- e saber que estamos nelas
e elas em nós

temos que dizer a que viemos:
vomitar em seus becos,
mijar, cuspir nas calçadas,
penetrar em
suas entrâncias,
sentir seus cheiros,
bons e ruins,
beijar o sovaco,
fazer sexo com elas,
esporrar nos rostos
dessas safadas

as ruas estão aí para isso
para serem apreendidas
e vividas

Enquanto calço os sapatos


quando calço os sapatos
sinto-me entregue
num cansaço corporal secular

tenho quase 50 anos...
mas sinto como se já tivesse vivido bem mais
as pessoas já não me interessam
sei muito sobre elas
e isto as torna, para mim,
aquilo que se põe no bueiro

raras são as vezes que suporto
seus olhares, seus andares,
é como se caminhassem para o nada
mas procriando feito porcos

creio que o homem está numa encruzilhada
e não decidiu que caminho seguir
parece que tudo já foi dito, feito,
revirado
não há mais boas-novas
nem a mínima perspectiva de uma bomba atômica
que pudesse dar fim a tudo

Otto Dusquene

Sortilégio


ela às vezes me olha da escada
quando estou descendo
estanca
não dura muito
mas tem algo ali
pelo menos
ancas e pernas isso tem
um par de olhos tristes
uma boca
um delírio

gosto quando ela encurva
as costas
gosto das roupas justas
da fala
do drink maneiro
bem servido
uísque
depois vodca com limão
depois mais vodca
legal

ela
tem um presságio
de que nada vai acontecer
e eu já estou abocanhando
um dos peitos
tirando a calcinha
pra enfiar o mangalho

Um pouco de decência faz muito bem


gosto de ficar “quentando” ao sol
me faz bem
tenho sangue “frio”
sou um anfíbio
réptil, sei lá

deixo a cerveja
na mesa
na sombra
e sento ao sol
e estico as pernas brancas
de cera
é bom

tem o toldo verde do bar
que faz um ambiente
meio marítimo
isso também é bom

dá uma certa decência
uma pausa
no desconforto

e tem as mulheres
com seus rabos incríveis
passando diante de mim

elas fingem que não me notam
mas eu sei que enxergam
“esse cara quer enfiar
sua trolha em mim,
cafajeste”

gosto, realmente gosto de ficar
mamando uma cerveja
“quentando” ao sol

Otto Dusquene, o DUC

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Big Lane

Big Lane pesa 140 quilos e adora churros, fritas e carnes bem e mal passadas
Big Lane passa pela Pomerode e Blueshoes atacando os carrinhos de hotdogs
Big Lane é esse monstro ocidental que deixa os africanos na penúria
Big Lane é essa fome insaciável por ovos, hambúrgueres, queijos, salsichas, amendoins e barras de chocolate
Big Lane é a América Unida devorando o mundo
"América, quando você mandará seus ovos para a Índia?", perguntava Ginsberg
Nunca, nunca, jamais...
Por Big Lane, não

Minha preferência por aeroportos


Gosto de aeroportos. Dão distinção às pessoas. Gosto de me sentir distinto, às vezes. Chegam com suas bagagens, de táxi. Ajeitam as malas nos carrinhos e partem rumo a não sei onde. Avião é um negócio confortável. Tem o uísque, as aeromoças de taileurs com seus cabelos presos. Tudo muito distinto e sexy, legal, huumm...

Só não aprecio os solavancos. As turbulências fazem coisas horríveis com nossos estômagos, principalmente quando já existe meio litro de scoth dentro dele. Realmente, turbulências encurtam o buraco do cu, dão tensão. "Vai cair, meu Deus, agora cai".

Certo dia peguei um avião. Todos os passageiros colocaram o cinto por solicitação da aeromoça gostosa. O tempo começou a correr e nada de o avião embicar. Uma senhora, já velha, na poltrona atrás da minha, perguntou:

- Que houve? Por que não sobe?

Ai não resisti e comentei alto com o gordo sentado ao meu lado:

- Parece que estão retirando a carcaça de um falcão maltês que, desavisadamente, foi sugado e se esfarelou em uma das turbinas no vôo anterior. Vamos ter de decolar com uma só turbina. O que é preocupante...

Dei uma espiada para trás.

A velha me olhava com os olhos esbugalhados,a boca semiaberta. Por fim, gaguejou:

- Mas isso é possível? Viajar com apenas uma turbina?

- Voaremos de banda, minha senhora - eu disse e me virei, pensando "Dusquene, seu bom filho duma puta, você ainda vai matar alguém".

Os Porquês


por que essa urgência, essa premência
                                        para magoar?
por que as ruas estão cheias de sonhos mortos
            que esbarram em pessoas tristes?
por que essa falta de?
por que a ficha jamais cai na máquina?
essa fatalidade...
          por que essa falta de qualquer coisa?
tanta ironia e impiedade
por que essa carência de sentimento?
ei,
ninguém sabe a quantidade certa de uísque
                     que traz a tal felicidade?
será que ninguém vê o que acontece nas ruas?
E por que tantos pobres e,
                                     principalmente,
por que tão poucos ricos
            com suas piscinas, carros, mulheres, 
    e garagens (quero o meu quinhão deste sonho)
              e possibilidades
                              e tudo o mais?
                           por que esse
abandono
              e essa insônia rubra?
porra,
por que ninguém me diz
                                 nunca
"vai cara, você consegue".

O IDIOTA


Ninguém está a salvo de um idiota. Eu não estou. Você não está. Ninguém está. O idiota se apodera, se avoluma. Torna o dia mais difícil de ser suportado do que já é. Empesteia o ar. Mata a pouca esperança que ainda existe.

E eles se propagam que nem moscas. Estão em toda a parte. Cientes de sua estupidez, mas, nem por isso, deixando de defecar sobre nossas cabeças.

Otto Dusquene

Tédio, essa enguia


Eu não escrevo para você, camarada. Eu escrevo para mim. Para algo fazer sentido, um pouco pelo menos. Para não morrer de tédio, essa enguia, e poder suportar o ramerrão. O baque cotidiano.

Distraio-me com o jogo. Mas os números não colaboram. Mudo o esquema, e nada. Tenho uns 30 esquemas no bolso. Vou variando. Mas as bolas não cooperam. Estão combinadas para me foder, e a você também, se você joga. Se cuide.

É uma merda. Outro dia cinza, sem o horroroso brilho no plexo solar.

É, bem, ainda estamos vivos. Um pouco.

Dusquene

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

O estorvo caos em que me há de acalentar

1.
Sou bem normal, olhando a espécie como um todo.

2.
Bebo com certa regularidade.

3.
"Dusquene, aonde vai?"
"Comprar cigarros?"
"Você não fuma há 18 anos".

4.
É preciso deixar o otimismo em grau de latência.

5.
Ah, o sol, o maldito sol... Umidade: 15%.

6.
Não há melhor caminho do que a ida até
a geladeira, quando tem cerveja ou um tinto.

7.
Ser forte é ter paciência.

8.
Aliás, paciência é coragem.

9.
Por que toda mulher feia acha que todos a querem,
a perseguem nas ruas, ávidos pelo seu corpo?

10.
Muitos durante anos só fodem a paciência alheia.

Enquanto na veneziana aberta do meu pobre ser


1
Qualquer um pode ser um idiota. A burrice não tem proprietário único.

2
As mulheres têm a propriedade de fazer os homens tremendamente infelizes, quando fazem disso a razão de suas vidas.

3
Escrever é confissão.

4
O escritor não precisa de páginas em branco, ncessita ter vivido, pelo menos um pouco.

5
Me disse Rose:
"Dusquene, quando você prestar, você não escreverá porra alguma que preste".
É, você sacou o lance, Rose.

6
Não se engane, camarada,
Você está tremendamente só.
Não se deixe enganar...

7
Bill fugiu com Lilly
E que merda eu tenho com isso?

8
Ninguém sabe o dia de amanhã
Mas muitos não sabem nem o de hoje,
o que fazer de suas pobres vidas

9
O fim é o fim, amigo.
Tente adiá-lo, se você conseguir, me ligue.

10
Abraço do Otto

domingo, 2 de setembro de 2012

O homem mais feliz do mundo

Slim me contou essa história:

A filha do rei adoeceu. Uma doença incomum, letal. O rei consultou os magos do reino à procura de uma cura para aquele mal. Um deles olhou a jovem princesa inconsciente em seu leito (huum... belas tetas... bem, mas isso não faz parte do negócio) e disse ao rei: "Esse mal só tem cura se a moça se cobrir com a camisa usada pelo homem mais feliz do mundo". Então, o rei perguntou aonde poderia achar o tal homem. O mago não soube dizer.

O rei vestiu-se como um andarilho e saiu cavalgando em desespero, subindo e descendo colinas, serras, montanhas, rompendo vales, até que, no fundo de um desses vales, ouviu uma risada. A gargalhada de um sujeito feliz. Ele foi entrando na mata e topou, numa clareira, com um lenhador, que golpeava toras de madeira com o seu machado. O homem gargalhava de chorar, com três ou quatro crianças, brincando ao seu redor, a uma distância segura dos golpes.

O rei aproximou-se e perguntou ao homem, que usava apenas um jeans surrado (a história não é tão antiga assim e as tetas da princesa realmente eram ótimas), porque ele estava tão feliz, em meio àquele trabalho árduo ao sol. "Ora, meu amigo, faço o que gosto, vivo na natureza, respirando ar puro... Tenho uma mulher maravilhosa, que me serve todas as noites por três vezes, e tenho filhos sadios e robustos como ursos, porque não haveria de ser feliz. Feliz só não: EU SOU O HOMEM MAIS FELIZ DO MUNDO!".

O rei quase se ajoelhou de emoção. E perguntou: "O senhor poderia me emprestar uma camisa?". Ao que o lenhador respondeu: "Camisa? Não tenho. Nunca tive. Para quê...", apontando para a paisagem. E sorriu seu riso alegre e bestial.

sábado, 1 de setembro de 2012

Velho Slim

De todos os bêbados, o velho Slim era o melhor. Sabia viver
o velho, como sabia beber e alcançar sabedoria com a
bebida; e cada vez mais ele bebia para se tornar o maior
sábio da planície. O melhor da planície de bêbados, o velho Slim,
o maior dessa cidade dos diabos, cheia de pessoas exaustas,
que vomitam palavras piedosas, entediando todo o mundo,
querem que as acompanhe nos seus jogos enganadores até o infinito.
Mas Slim não era esse tipo de pessoa, que amargava um mau pedaço,
ia em frente com sua verve, seu riso debochado, com dentes rilhantes,
aqueles olhos de demônio que viam as coisas como realmente são:
- O problema, Dusquene, é que as pessoas não sabem aonde querem chegar
e não saber aonde se quer chegar é um perigo, rapaz, um perigo... Fred,
me traga mais uma cerveja. E tem mais uma coisa que eu quero lhe dizer...
E ficava ali, simplesmente, tentando dizer, mas rindo, rindo apenas,
completamente bêbado, uma amizade sincera a nossa: o velho Slim e eu.

A melhor hora da cidade em que ela vive


vejo a cidade morta às quatro horas da manhã
as ruas parecem a pele de um imenso anfíbio negro-cinza
pisada por bêbados erradios e sujos de merda
estou bebendo um tinto de qualidade; e isto é bom
vejo os carros na pista, ao longe, na hora plena
a melhor hora da cidade: quando todos dormem e
e ela, enfim, pode respirar, ficar em paz, livre de
passos, cusparadas, gimbas de cigarro, vômitos...
existe a possibilidade de um assassinato, logo,
mas isso sempre há em qualquer lugar do mundo
nem falo das sirenes de bombeiros e polícias
nem digo do meu incômodo de fazer parte disso...
a minha bebida me basta; nada hoje de rostos
e vozes humanas: só quero esse silêncio, imerso
em álcool, como uma quietude de mim mesmo agora

Sobre o chão de Saturno, essa merda...


esta noite
estou triste
as coisas
não fluem
como deveriam

nem as mulheres
de dia
estavam melhores
nas ruas
hoje

e
todos são
indiferentes
a todos

levam suas mágoas
e angústias
presos
como tigres contidos
uma merda...

e vão morrer
disso
aos poucos
sempre

e assim
viveremos
até o fim
sem dar qualquer
espaço ao que
realmente
queremos fazer
ou dizer

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Blue Moon


qualquer coisa
que falarmos hoje
é bobagem
frente à lua azul
ao cheiro
do vinho tinto
no copo americano
à dama azul
da noite pobre
de mim
de você
mas cheia
dessa angústia
infinita

qualquer coisa
destoa
na paisagem
saiam homens
e mulheres
que nada valem
que nada têm
a oferecer
que nada prestam
que nada sabem
da lua azul
morta e fria
naquele céu
de ninguém