quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Uma semana de cão

Eu fumava uma carteira de cigarros por dia. Plaza ou Carlton.

Comecei a tossir desbragadamente por uma semana seguida. Uma tosse seca e constante.

Fui no médico. Doutor Medenhorf. Clínico geral.

- Tosse. Respire devagar. Agora tosse.

Medenhorf auscultou meus pulmões com o estetoscópio.

- Hummm. Sei não. A coisa não vai bem para você, rapaz.

Ele preencheu uma guia.

- Tire umas radiografias dos pulmões e volte aqui. E logo!

Sai do consultório já prevendo o pior. A doença maldita.

Fiz as radiografias no mesmo dia de tão ansioso que estava.

Liguei à tarde para a secretária do doutor. No outro dia, às 10 da manhã, eu estava no consultório.

Medenhorf tirou as duas radiografias do envelope duro da clínica.

Pôs no contraluz. Olhou por três ou quatro segundos e disse à queima roupa:

- Nunca vi algo parecido em toda a minha vida profissional...

Olhei para o doutor e depois para as radiografias no contraste.

- O que o senhor nunca viu?

- Seus pulmões estão envolvidos por uma película visível, clara como água. Está vendo?

Ele apontou áreas ao redor dos pulmões que realmente apresentavam um contorno indefinido, esbranquiçado.

- E isso é ruim?

- Péssimo, meu rapaz. Você deve ir urgentemente a um pneumologista. Logo!

Sai mortificado da consulta, com o envelope com as radiografias debaixo do braço.

Marquei a consulta com o pneumologista. Só tinha vaga daqui a uma semana. Não tinha jeito. Mesmo dizendo que era caso de vida ou morte, de pré-enterro, só daqui a uma semana.

Foi uma semana dos diabos. Uma espera cruel, aterradora.

No dia da consulta, lá estava eu no consultório do pneumologista.

A atendente me chamou. Entrei no consultório. Expliquei o caso.Ele me pediu as radiografias e as colocou no contraluz.

Olhou-as por três segundos.

Não aguentei:

- É câncer não é?

O médico me olhou.

- O senhor não tem nada nos pulmões.

- E essa película branca ao redor deles? - apontei.

- O senhor deve ter se mexido um pouco na hora em que as radiografias foram batidas. Noto que o senhor é muito ansioso... Esses contornos são normais... É o estremeção.

Vi sangue. Na minha frente só um nome: Medenhorf.

Agradeci o doutor. E sai dali. Precisava de um telefone público.

Liguei para Medenhorf. A secretária atendeu. Pedi para falar com ele. Caso importante. Ele não atendia ligações, mas, quando a secretária lhe disse quem era, ele ficou curioso.

- Medenhorf falando...

- É você, seu baita filho-duma-puta? Aqui é o Dusquene, o paciente que você enlouqueceu por uma semana dizendo que meus pulmões estavam envoltos por uma película cancerígena...

- Mas eu nunca disse que era câncer. Só imaginei que...

- Pois não imagine, seu traste! Você não sabe a semana dos cachorros que me fez passar. Você não é médico Medenhorf. Você é um sádico, um carniceiro, um carrasco, é isso que você é...

E desliguei, quase quebrando o telefone público.

Depois olhei para o envelope com as radiografias dentro dele.

Rasguei tudo com vontade. E deixei o espólio ali mesmo na rua.

O gari que se fodesse.








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