domingo, 31 de março de 2013

A mulher que não tive porque perdida

"Vê aquela ali?". Olhei. "Ela é alienígena, cara. Veio de Zeta Reticuli ou coisa parecida. É doida. Ninfomaníaca". "É?". Olhei a dona mais atentamente. Era loura e tinha belos quadris e pernas. "Disse que seu objetivo na Terra é reprodução. Sabe-como-é, mistura genética. Diz que seu povo às vezes nasce com deformidades: três braços, duas cabeças...". "É?". O cara falava e falava e eu só olhando a dona. "Tem gente lá que também nasce com rabo...". Ele viu minha cara. "Não esse tipo de rabo. Todas nascem com esse rabo. Mas digo rabo mesmo, de macaco". "É?". "É, é estranho mesmo". "Pois quero ver essa dona nua". "Cara, ela é alienígena...". "Quero fazer parte da experiência. Só vou conversar amenidades, como andam as coisas lá em cima". "Cê é louco, cara?". "Só um pouco". Já estava indo quando a mulher se levantou. Havia algo atrás em sua calça jeans, uma protuberância arredondada que descia pelo rêgo da bunda. Era visível e todos faziam que não viam. "É", eu disse, "estranho, muito estranho". Desisti e voltei ao meu drinque. "Eu não disse? Eles estão no meio de nós, cara". O doido, então, riu seu riso de vitória.

Não brinquem com Lenora Fatfull


Lenora FatFull chegou cansada do supermercado, onde trabalhava por 12 horas como caixa e empacotadora. Encontrou Tillburn com uma lourinha em sua cama de ferro. Tillburn ficou mais branco do que era e a lourinha tentou sair da cama, em vão. Recebeu um tapa bruto de Lenora, que quase lhe virou o pescoço. Lenora trancou a porta e disse.

- Não saiam daí! Nem tentem!

Foi à cozinha e, dez minutos depois, voltou com uma jarra de café bem quente e um sorriso escroto.

- Vamos beber. Tillburn adora café.

- É? - tremeu a loura.

Lenora entregou uma xícara para Tillburn e uma para a lourinha.

E seca avisou.

- Coloque perto do seu pau e você, minha querida, perto da xota.

- Mas o que você?

Tillburn não terminou a frase. Um tabefe estalou em sua cara.

- Faça! - Lenora intimou fria.

O que se ouviu no apartamento em seguida foram berros tenebrosos, entrecortados com sopapos, e uma vozinha, ao longe...

- Um pouco mais de café, querido? Oh, você também quer? Não seja por isso...

Grandes bolas de merda

90% do que um escritor escreve são bobagens. 10% quem quiser que leia. Eu não li muitos livros. Foi o que me salvou. Quem está atrás de estilo já está morto. Nem comece ou continue. Faz 30 anos que patinamos em livros miseráveis. Impublicáveis. Mas publicados por causa dos lucros que proporcionam às editoras. Grandes bolas de merda, jogadas por modernas catapultas, que se espatifam nas ruas e melam as pernas dos incautos.

Cenário 57-A


Bobby entrou no apartamento tropeçando. Outra vez de porre.
Entrou no quarto e viu Samantha dormindo, ou fingindo dormir
Samantha ouviu que ele abriu as portas do guarda-roupa
De repente tudo ficou quieto
Samantha desconfiou
"O que você está fazendo aí, Bob?"
Bobby mijava em todas as roupas
"Banheiro, mulher. Banheiro..."
Em seguida, Bobby chamou "Raul"

O profeta nosso de cada dia


Ele passava quase todos os dias pela avenida, no meio da noite, gritando a plenos pulmões que o mundo iria terminar em poucos dias. "Vocês vão ver seus palermas. Ficam ajuntando dinheiro sujo, escroto, debaixo do colchão... VOCÊS NÃO TERÃO TEMPO DE GASTÁ-LO!"

Alguém gritava de um dos apartamentos.

"E o que você nos aconselha, Sulffock? Que a gente dê a grana pra você?".

Sulffock, de barba longa e cinzenta, roupas puídas, olhava para cima, tentava em vão achar o remetente da mensagem no meio das luzes acesas.

Não conseguindo, berrava:

"DEEM SEUS RECURSOS AOS POBRES DE ESPÍRITO! PARA QUE POSSAM SANAR SUAS MISÉRIAS E NECESSIDADES FÍSICAS ANTES QUE VENHA A CALAMIDADE TAMBÉM SOBRE ELES".

Um outro gritou.

"Acabe com essa gritaria, seu alucinado. Todo o dia é essa porra! São quase 11 da noite. Tem gente que precisa trabalhar amanhã. Vê se arranja uma sarjeta pra você se encolher e dormir".

"FALOU A VOZ DE UM PECADOR EMPERDERNIDO!", malhou Sulffock, desta vez identificando o dono da voz e apontando para uma das janelas onde se encontrava um gordo de 130 quilos, de camisa branca.

O cara ficou puto.

"FIQUE QUIETO! NÂO SE MEXA! VOU AÍ PRA LHE MOSTRAR O QUE É UMA CATÁSTROFE IMINENTE!", disse e saiu da janela.

Depois de procurar Sulffock durante meia hora pelos becos e vielas do quarteirão, o homem o encontrou dormindo como criança, numa manjedoura feita de pilhas de jornais velhos, que ele catava de dia para ganhar a vida e manter toda a vizinhança informada sobre os futuros e inadiáveis acontecimentos.

Relato de um homicídio involuntário no 5º andar da rua Toulanes


Relato de um homicídio involuntário no 5º andar da rua Toulanes 

Era um apê legal o de Brenda Lee. 5º andar. Cadeiras de palha. Mesa de centro. Sofá branco, com almofadas brancas, próximo ao janelão de correr. Vista boa.

Fui na frente com as chaves, enquanto Brenda guardava o carro. Iríamos fazer uns camarões empanados na manteiga. Algo fino uma vez na vida pro Otto Dusquene. O sol já ia baixando. Levei as sacolas pra cozinha. Botei o tinto no congelador.

Tudo certo. Voltei pra sala.

Aquelas almofadas na lateral do sofá eram convidativas. Cheguei perto e desabei. Daí ouvi o estalo. “Cleck!”. “Porra! Quebrei o cinzeiro ou o abajur...”. Olhei pro lado. A mesa lateral continuava intacta com seus objetos. Então, tive um palpite. Levantei. Só então a vi... Lá estava Penélope, a poodle neve de Brenda, com o pescoço quebrado, morta pelos meus 100 quilos promocionais. Eu a havia confundido com uma almofada. Ela ali, toda enrolada, dormindo profundamente. Bem que Brenda dissera que a cachorra estava sonolenta em razão de um remédio contra virose, ou algo parecido. Eu cometera um assassinato sob o sol - ou quase.

Precisava pensar... PENSE, DUSQUENE, E RÁPIDO! Segui a única ideia que me ocorreu na hora. Abri o janelão. Um vão largo. E atirei por ele o corpo inerte de Pê (era como sua dona a chamava na intimidade).

Só foi o tempo de me virar, colocar um sorriso relaxado no rosto e Brenda abrir a porta.

“E aí, gostou?”

“Dez, baby, dez”, fiz o sinal de OK.

“Já viu a Pê?”

Olhei pros lados. Braços abertos sobre o encosto do sofá.

“Ainda não. Onde ela está?”

“Pê! Cadê você?”.

Depois de procurarmos por cinco minutos, Brenda começou a se desesperar.

"Não estou encontrando...".

“Calma, vamos achá-la”.

Brenda teve um pressentimento ao reparar o janelão aberto. Foi até lá. Colocou a cara pra fora. E viu lá embaixo, entre os arbustos, uma coisa branca, imóvel.

“OH, MEU DEUS, PÊ! LÁ EMBAIXO!”

Olhei.

“Talvez possa ser”, eu disse.

Descemos as escadas correndo, sem esperar o elevador. Brenda abriu com um puxão a porta da entrada e foi pro jardim. Identificou e se debruçou sobre o corpo de Pê, alucinada.

“O QUE HOUVE? QUE SERÁ QUE ACONTECEU?"

"Só vejo uma possibilidade", falei.

"Qual?", disse Brenda com o rosto afogueado.

"Suicídio".

"O que?"

"Ou isso ou distração. Você disse que ela andava meio sonolenta. O janelão estava aberto. O sofá bem perto".

"Mas eu juro que deixei o janelão fechado quando saí".

"Quando cheguei estava aberto. Sentei justamente ali pelo vento".

Brenda baixou os olhos para Penélope, morta. Afagou-lhe a cabeça.

"Ela era tão... branquinha, que nem neve".

"Foi exatamente esse o problema".

Quase disse. Mas me segurei a tempo.

99 por cento


99 por cento da humanidade me incomoda
não me interessa
- a China com seus olhos cortados não me interessa
- a Índia com seu povo pardo não me interessa
- a Alemanha não me interessa
- o Tibete, muito menos

milhões mancham a paisagem
com seus recalques
conformismo e
ausência de coragem

os homens nos escritórios,
- existem multidões de pessoas em escritórios
e bancos e conglomerados -
vertem negócios
- limpos ou sujos, tanto faz -
e chamam esse trabalho de vida

tudo bem: tomam seu uísque no final da noite,
com boas mulheres e cama larga

mas, sinceramente,
essas pessoas também

quarta-feira, 27 de março de 2013

Um evento à luz do dia


ei, Joll,
o que você vai fazer agora?
afinal,
você não esperava por isso
não é, Joll?
eles não lhe deram estudo
só umas baganas
sem filtro
né, Joll?
por isso, teve que roubar
matar a fome
fazer a vida
Joll

puta-que-o-pariu
a bala foi um coice
no peito
do cara
tava ali à-toa
não tinha nada que tá ali...

não deu pra escapar, né Joll
você tem nervos frios
aguentou muita coisa
mas aquela
cusparada
não deu...
foi o cara é?
foi

por que ele lhe provocou?
ninguém sabe a paciência
de ninguém
ninguém sabe
não é, Joll?

Joll,
quais os seus planos na prisão?
quais os seus projetos para a Morte?
Alice talvez não possa lhe esperar
São 20 anos, Joll
20 anos
é demorado

Quem cuida dos pobres neste mundo infame?


os hospitais do país são matadouros públicos
onde os pobres chegam para morrer
em macas nos corredores,
em UTIs coletivas e úmidas,
não sanitizadas,
uma morte dolorida, aberta,
programada

como doentes internados não votam
os políticos os esquecem
os governantes os esquecem
os médicos os esquecem
a população os esquecem
o que os olhos não veem...
desaparece
foda-se!

(...)

“Mama Brown foi internada com uma infecção aguda no pâncreas”.
“É? Quando foi?”
“Foi ontem. Morreu hoje, às 10”.
“Puta-que-o-pariu! Mama Brown morreu?”
“Morreu, o enterro é amanhã, às 15h. Cê vai?”
“Sei não. Tenho umas entregas pra fazer...”
“Eu também tenho uns assuntos pendentes...”
“É, vamos ver se dá”.
“É, talvez”.

Pobre Mama Brown... que não tinha um ombro onde encostar a cabeça

Até aonde a vista alcançar


lembro dos anos
das luzes dos anos
porque, se eu não gravei os rostos,
gravei certamente as luzes dos ambientes, das festas,
as luzes de um hospital, de um bar,
de uma farmácia

as imagens estão claras e firmes em minha mente
em pastas de arquivos, que posso rever quando quiser
sei os lugares, mas isso não é importante, realmente,
sim o que vejo

estranho
não me lembrar das pessoas, mas dos ambientes
não me lembrar de texturas específicas, do gosto dos alimentos,
mas somente das luzes abrangendo tudo
como um grande sonho de passado

acho que basta isso, é o suficiente para mim
para muitos, não

VOICE


“O problema é a voz”

“O que tem a voz?”

“É lenta demais. Uma voz arrastada, de língua cansada”

“Mas Camille tem um corpão. É toda sexo”

“Sei disso”

“E então?”

“Mas a voz não encaixa e, na hora, sabe como é...”

“Você brocha?”

“É”

“Mas por causa da voz!”

‘Ééééééé!”

“Pede pra ela ficar quieta”

“Mas o pior é que eu conheço a voz. Lembro do seu potencial”

“Como é que ela fala?”

“Ééééécoomoseaacooisafoosseemmmaaarcharreduuziiida”

“Você não tem conserto, Dusquene”

“Nem a voz. Nem ela”

Butterfly


uma borboleta negra e laranja
pousou em mim
uns podem ver nisto
um milhão de significados

para mim
aquilo não passa de
duas folhas que balançam
- comida de pássaro

entenda
não há significado algum
no aterrissar de um inseto
em você
ele apenas queria
sorver uma gota de suor de seu braço,
talvez

pare de ver nos acontecimentos
presságios erradios
tome um trago
trepe

meus olhos céticos
observam com a mesma dura indiferença
o propósito que somente os iniciados enxergam

Mais uma topada no velho Finnegan's


“Ei, Dusquene, eu não sou fiel nem à cadela da vizinha”

“Tudo bem, Foster, continue assim”

“Eles podem ser. Ficarem casados por 30 anos. Eu não!”

“Certo. Agora me deixe beber em paz. OK?”

“Você não vai com a minha cara, não é, Dusquene?”

“Nem um pouco. Já está avisado. Suma”

“Você não quer é me pagar uma bebida!”

“Serve um drink aqui. E Foster... Suma depois disso”

“Eu não vou a lugar nenhum, Dusquene. Ninguém me compra com um drink”

“Certo, Foster. E com dois?”

“Com dois eu faço o que você quiser, Duc”

“Tudo bem, velho. Tome mais um drink e suma. Agora falo sério”

Foster bebeu o segundo drink, bateu no meu ombro.

“Você é um bom sujeito, Dusquene”

“É, infelizmente eu sei disso”

Minha visão daquilo que é

o poema é a vida
que levo
o jogo que faço
o café que bebo
a camisa suarenta
- sapatos, cueca -
que tiro
depois do puto dia
de trabalho

o poema é um continuum
fode, peida, come e caga
comigo

não está aberto
a trocas
nem a deboches,
de certa forma,
é até salário
particular
único

o poema é
meu
e
- para sempre



Glória Dee

Glória Dee,
veio com o outono,
raivosa, franca, fria, fria...
a boca cheia de solidão,
vomitando palavrões
do fundo de sua dor
mal disfarçada,
olhando seca...

Glória Dee,
você não existe,
só para mim você existiu,
e permanece como
um anátema
de bar

Glória Dee,
o mal que lhe fizeram,
foi você mesmo quem causou, por anos,
nas madrugadas em que você não quis voltar
cedo, bêbada, e ficou, toda mijada,
e fria, fria, abraçada à privada
do bar da Blummendale










eu lhe direi somente:
esqueça

Sensação de merda no sapato esquerdo


é preciso sinceramente que haja algo melhor que isso,
do que observar esses rostos óbvios, frequentes,
à espera do próximo pagamento,
do próximo telefonema,
da próxima viagem interestadual,
do próximo fim de semana,
do próximo reality show,
para que eu consiga me apossar
das sobras de mim

não quero ter contato com 99% da humanidade
mas estou cercado desses 99%
sou um ser solitário e mal-humorado
não me dou bem com gente
só com cervejas e jogo de números

a cada dia a tensão aumenta
não consigo sequer olhar para seus rostos...

mas sempre há a perspectiva
da próxima viagem interestadual,
do próximo fim de semana,
do próximo reality show,
do próximo telefonema,
para que, enfim, esses 99%, envolvidos pelas novidades,
desapareçam por algumas esplendorosas horas

Eu só acredito naquilo que meus dedos tocam


1
A pior invenção do homem é o próprio homem.

2
Se o ser humano tivesse algum valor, não existiria tanta gente no mundo.

3
A obrigação de ser decente me assusta.

4
Não tenho paciência com mosquito, imagine com pessoas.

5
Qualquer pensamento benévolo é anormal em um ser humano.

6
A normalidade não existe. O que há são instintos controlados a ferro e fogo.

7
Sem resignação não há saída.

8
Festejo somente quando não me convidam para algum funeral.

9
Sim, é preciso acreditar de alguma forma, até mesmo acreditar na existência da própria fé.

10
Só os dementes se dão algum valor.

o que largamos no turbilhão ao vento volta


necessário seria apenas um gesto largo
uma palavra mais calma
um sorriso sem pagamento
para salvar uma vida

um aceno de cabeça,
um OK bastaria
um comentário jocoso
qualquer camaradagem
um bater de copos
bastaria

o mundo perde muito
sem esses pequenos gestos
então, mantemos nossas caras fechadas,indiferentes,
como se fôssemos parte de uma competição,
peças de um jogo, lento e brutal

abra um cerveja, homem
cante a velha canção
inaugure uma nova estrada
com um passo
um passo
firme

sei que é difícil acordar
com essa raiva, sempre
esse amargor
essa ressaca social
ainda mais
nessa cama cinza
nesses lençois desbotados
da miséria compartilhada

a cidade morre ao longe II


1
ninguém conhecerá realmente sua cidade
se não bebê-la, fodê-la, sem devassar
suas misérias, plenamente

2
respeite sua cidade, mas não a tema,
é um bom modo de sobreviver, ir seguindo
mas não a trate como um almoxarifado

3
quem teme a cidade não a vive,
jamais chegará a conhecê-la,
a cidade pede coragem e pele grossa,
camarada

4
existem mulheres que tornam as ruas
uma festa, outras, uma merda

5
as ruas me chamam
como Vicky Lane
ao me abrir suas roliças pernas de neve

Um troço rombudo


"Lucy, quer ver meu caralhal?"
"O que?"
"Tenho uma plantação de caralhal. Tenho só a espiga matriz. Quer ver ela?"
"Se quiser me mostrar?"
"Quero".
"Então mostra".
"Ó".
"Porra, seu caralhal é enorme, Jimmy".
"Com este caralhal levo você pro céu".
(...), disse Lucy

Lembro de você, Justine, sob as cobertas


1.
A vida de um idiota pode ser extraordinária, se bem contada.

2.
Qualquer bebida é melhor que nada.

3.
A grande mulher é a próxima. Nem sempre...

4.
Amar é, antes de tudo, SIM-PA-TI-ZAR.

5.
O meu carro no lava-jato. O do outro, que se foda...

6.
A incidência de idiotas por metro quadrado está crescendo, exponencialmente...

7.
Saiba viver com o pouco dos outros. Você jamais terá nada além disso.

8.
Ninguém muda.

9.
O sol deveria ser impróprio para quem bebe.

10.
Hoje o dia vai ser daqueles...

terça-feira, 26 de março de 2013

Um cão, uma experiência e os bares ao redor

"A vida é uma montanha-russa de loucos, cara".

"Concordo", disse eu, tomando outro gole.

"Cê não sabe o que aquela puta me fez! Me enxotou de casa..."

"É?"

"E por um cachorro... Um boxer enorme. Rufos... O nome dele é Rufos, se-é-que-me-entende..."

...

"Achei um troço estranho, a mulher no sofá, vendo TV, com Rufos entre as pernas... Sentia um clima, sabe-como-é? Ela ronronava, tesa"

...

"Quando eu tentava ocupar a ponta do sofá, o escroto latia como um demônio... Martha então dizia pro cão: "Que é isso, querido? É papai... Tommy, o dono da casa..."

Tommy emborcou um trago. Ficou pensativo e falou:

"Acho que sei agora quem é o dono do pedaço... Quem é o papai"

Um local escorregadio como as bordas do inferno


Fui ver meu pai na UTI. Ele estava em coma, com um câncer terminal. Entrei na unidade, com minha irmã, no horário estipulado. Prazo da visita: 15 minutos. Do lado de meu pai havia outro velho mais velho, também entubado, mas acordado.

A quantidade de equipamentos era grande. Uma confusão de catéteres e instrumentos de metal, monitores, etc.

Comecei a checar as coisas. Sempre fui curioso. Batimentos cardíacos. Balão de oxigênio. Marcadores de pressão arterial.

“Puta-que-o-pariu! Olha só”, apontei para um gráfico qualquer.

“Que foi?”, disse minha irmã.

“Vê isso. Está realmente crítico”.

Nos aproximamos ainda mais dos aparelhos. Os números pareciam de fato preocupantes.

De repente, minha irmã notou que o velho ao lado nos olhava apreensivo. Agitava os braços tentando aparentemente encontrar apoio para se erguer, para enxergar também o que víamos.

Ai minha irmã percebeu. E disse, baixo.

“Otto, esses monitores são do vovô aqui", balançou leve a cabeça pra esquerda. "Os do pai são aqueles ali. Mais ao fundo e à direita”.

Então olhei pro velhote e falei, avermelhando.

“Pressão excelente. Coração, OK”.

E saímos rápido.

Neste dia, a visita a meu pai durou menos de dez minutos.

Intervenção


"Então, sr. Dusquene, o que tem a dizer?"

"Que estou seco. Que tal um tinto?"

"Esta reunião é justamente para você diminuir a bebida"

"Pensei que as duas estivessem aqui para uma farrinha particular"

"Concentre-se, sr. Dusquene, somos da Assistência Social. Sua situação é deplorável"

"Não menos lamentável que a do cachorro do vizinho"

"Que tem ele?"

"Sei lá. Sarna?"

"Que tal parar de beber por uma semana?"

"Que tal um dia?"

"É pouco. Quatro"

"Fechamos em dois"

"Tudo bem"

"Mas a partir de amanhã e com uma compensação"

"Qual?"

"Irmos imediatamente para a cama"

"Seu filho-duma..."

Reflexão num dia de tempestade


a vida é passageira, homem,
mas parece que já vivi um século
no meio do turbilhão há quase cinco décadas
e hoje estou melancólico, triste mesmo
quero meus bons tempos de volta
mas sei que jamais os terei
e terei que seguir em frente
mesmo assim
bem ou mal
em frente
sempre

creio sinceramente
que os bons tempos já passaram
e realmente estou chateado por isso
era um tolo, mas havia sempre a possibilidade
do ouro na moldura dos dias que viriam

o que me resta agora é engasgar com o metal na boca seca
revirar no sofá, confrontar essa angústia no peito
e o maldito sol que desponta
atrás da persiana

Do que sei e não devo tocar


eu não quero ter nada com isso
com essas pessoas de caras felizes, arrumadas,
com os self-made men
não quero ter nada com conglomerados,
shopping centers, grandes eventos,
festivais

sou um homem simples
quero uma vida simples
anseio por uma vida simples
sem a aceleração da vida moderna
sem o aparelhamento contínuo
que estão nos impondo

eles que fiquem com o seu luxo
sua ostentação, seus prédios,
nada disso me impressiona
é só trabalho, trabalho puro e poder

eu não preciso de nada do que eles têm
bem, talvez um pouco mais de grana e uísque
e de mulheres mais fáceis

a cidade morre ao longe


ainda estranho
a falta de humanidade
estranho a insensatez que há em tudo
e esse silêncio,
em tudo

os gatos não fazem mais barulho nos telhados
suas brigas sexuais me acalmavam
não ouço mais os gatos
só o depressivo ladrar dos cães
ao longe

longas madrugadas
e nunca reparei no céu
estrelas são luzes mortas
gosto de apreciar os ruídos da cidade insone

sei que os hospitais estão repletos
sei que os bares estão cheios de não profissionais
sei que os vagões do metrô ainda funcionam
sei que nos becos há assassinatos e roubos
sei de tudo isso

só não sei que fim levaram os malditos gatos

segunda-feira, 25 de março de 2013

Quando a noite assombra num garrancho


estar vivo é,
muitas vezes,
um pesadelo,
para milhões

a falta de grana,
de perspectiva,
de sobriedade...
a falta de carinho,
principalmente a
falta de carinho,
mata

o homem
é um ser carente
por excelência,
cheio de urgências
e comoções
e, os outros,
com suas inflexíveis
carências e
necessidades,
é que põem tudo
a perder

Pelos monturos, em meio à relva

não farei o grande poema
hoje
nem nunca
nem daqui a alguns minutos
porque
o grande poema
não interessa
o grande poema
é só ARQUITETURA
palavras
que mancham
a página
em branco,
para nada

viver bem
é a grande sacada
é a pegada certa
- e com dinheiro,
melhor ainda

tenho 49 anos,
quase trinta de trabalho,
mas alguma coisa
valeu?

a planície continua aí, ardente, sedenta, delirante,
mas algo tem sido proveitoso:
a batalha contra as CIRCUNSTÂNCIAS,
venci,
até aqui

O momento é esse, aproveite


Eu não preciso de dinheiro em excesso
Só fico irritado quando não tenho algum pra beber
O que as pessoas realmente anseiam
Ao jogar nas loterias para ganhar uma boa grana
É sair do ramerrão

Meu conforto eu encontro quando escrevo,
Quando bebo, quando leio um troço interessante
Não procuro fuga, procuro sanidade nas coisas,
Embora raramente a encontre

Não luto para ter uma poupança,
Mas também não desperdiço meu dinheiro com bobagens
Ele sai leve do meu bolso, sem pressa, tranquilamente

Quem acorda, trabalha e dorme pensando em aumentar o capital,
Já é escravo do metal, monta sua vida em torno do propósito
De ganhar mais e mais...

É, pode ser uma forma de felicidade, talvez
Mas, em si, é uma boa e grande bosta

Um evento natural no Grand Hotel


Fred: Oh, meu Deus... O que é isso! Você quase decepou a minha glande! Puta-que-o-pariu!

Melissa: Desculpe (cuspindo saliva e sangue)... Eu não tive intenção.

Fred: Eu lhe disse pra tirar a porra desse aparelho ortodôntico antes do boquete! E agora? Pegue uma toalha... Oh, Deus...

(Melissa corre para o banheiro. Volta com uma toalha de rosto).

Fred: Sua cadela! Olha a enxurrada... Tem que ser de banho. De banho! Ligue pra emergência!

Melissa: O que?

Fred (já agachando): A emergência!

Melissa: Mas, e a toalha?

Fred: Esqueça a toalha. Ahhgg...Oh, meu Deus! Não para de sangrar. Estou ficando tonto... O que você está fazendo?

(Melissa, olhos assustados, girando a chave e abrindo a porta).

Fred: Aonde você vai? Volte aqui, vadia... Estou vendo negro.

Sete horas depois Fred foi achado morto, estendido sobre o carpete. Segurava os colhões, num mar de sangue. O tampo da glande do lado.

Big Lou


Big Lou não dorme
Tem o sonho de ser atriz
Tem dois vestidos prontos
um pra première
outro para vagar
à noite

Big Lou quer festa,
drinques, o estrelato
Cansou de apanhar de Wilburn,
o cafetão do pedaço,
mas isso faz parte da estrada,
longa estrada

Não apanha mais
Encontraram ontem o corpo de Big Lou,
com as tripas pra fora,
num beco da Sétima

Um sorriso em seu rosto havia,
riscado a carmim,
que parecia off Broadway

Enquanto escrevo, alguém acresce


como esses sujeitos conseguem?
trabalho há 27 anos
e devo ainda cinco de apartamento
não faço uma refeição decente
há meses

meu sol se esconde
entre nuvens
- meu tempo
é sempre chumbo

eles, ao contrário,
andam em carros que trocam
ano a ano
compram terrenos,
utilitários,
investem na bolsa,
andam bem vestidos,
calçam bons sapatos,
enfim

mas, quando abrem a boca,
o que são?
corpos vazios de idéias
carnes que falam
seres óbvios demais,
retas rumo à sepultura,
vidas sem a mínima
FINALIDADE

essa é a minha vantagem
sobre eles: eu escrevo...
o que penso de coisas
que ouço e enxergo
esse é meu trunfo
final

Um troço sério pra caralho


a esquizofrenia é um troço sério
e a capacidade humana de evitar problemas também.
ninguém realmente quer ter a seu lado
um ser "repartido", deprimido,
Loki e suas inconsequências.

já me deparei com dois suicídios
de pessoas esquizofrênicas.
está tudo aparentemente normal,
e, de repente,
um pulo do ... andar,
um outro morre enforcado,
bom laço fez o cara.

eu acho que sou supostamente normal,
bebo, jogo, transo,vejo o noticiário da TV,
peido, coço o saco, tenho uma boa mulher,
escrevo umas coisas na página branca,enfim,
mas é sempre bom nunca baixar a guarda.

Dusquene, Dusquene, olha lá, camarada...

domingo, 24 de março de 2013

Ao coma que em nossa luz se esvai

dinheiro por dinheiro
dor por dor
miséria por miséria
vamos assim?
até quando você aguenta, camarada?
uma loucura
não terá,
não verá o sol
pousado em sua cerca?
como pode ser isto?
uma vida inteira
desperdiçada?

não, Joe,
com você hoje não,
tire a camisa social, jogue fora o cinto de fino couro,
vista o velho jeans, esquecido, repousante,
vá na loja, compre meia dúzia de
cervejas e um charuto do bom,
mande a mulher a puta-que-o-pariu,
mas com diplomacia,
e relaxe
ao sol,
que, enfim,
chegou


Você, que leva o meu, feliz, e com leve choro


Na máquina de teletransporte, Gillmore trocou as partes com Torpedo Inflamante.

"Que? Que porra é essa? A merda dessa máquina deu meu caralho para ele e eu fiquei com ISTO!"

"Desculpe. É que vocês foram transportados quase ao mesmo tempo no espaço-forma"

"Que se foda! Quero o que é meu de volta. Dê um jeito de tudo voltar ao normal!"

"Só amanhã. Na volta de vocês à Kandaria. Colocarei os dois na mesma sincronia no espaço-forma. Prevendo, logicamente, a troca de paus e escrotos..."

"Puta-que-o-pariu...", disse Torpedo, olhando sério para Gillmore, "Cuida desse troço até amanhã com o maior cuidado. Senão cê vai se ver comigo"

"Pode deixar. Está seguro..."

E saíram cada um pra seu lado.

"Espere, Rose, a surpresa que você vai ter essa noite...", pensou Gillmore, ajeitando a verga.

Falo a ela sobre os meus erros

Estou relaxado sobre a poltrona
Esticando
Barriga ao sol
A dona ali, me espiando
Vendo se eu não escarro ou faço algo pior

Dou um “tchauzinho”
Ela fecha a cara e a persiana
Ela tem belos peitos, mesmo

Eu abro a lata de cerveja
- é sempre bom ter uma lata de cerveja
e uma mulher pra acariciar
e um sistema de jogo
e uma caneta à mão pra riscar uns poemas
e, sei lá

Eu não ligo pra muita coisa
O prêmio acumulado da loteria, por exemplo,
Pássaros, crianças, programas da TV aberta,
Cruzadas, escritores contemporâneos,
Gente em geral e em particular

Só tem o seguinte
Não me perturbem quando eu estiver
fazendo algo de que realmente gosto
Eu não me lembro do que, especificamente,
Mas não me perturbem, nunca

Estranhamente sós, esta noite

logo mais todos se vestirão
um pouco melhor que ontem
porque entraremos na famosa noite

em breve matronas irão para suas cozinhas
mulheres lotarão salões de beleza,
os assados já estão temperados, à espera,
os embrulhos, nas árvores,
a postos

assim seguiremos o script pavoroso
abriremos um sorriso protocolar
para confraternizarmos com seres
que só vemos uma vez ao ano
e que nada representam
em nossas vidas
e vice-versa

e a farsa prossegue,
hora a hora,
minuto a minuto,
até a consumação deste tempo
cheio de indiferença, vinho, paganismo e boa vontade

A derrocada de um pequeno homem

- Ehhe. Ehhhehhheeh.

Olhei. Era um velho, chamado Sigmour.

- Que foi? Não vai com a minha cara? - perguntei.

- Eu já tive mais mulher que você, Dusquene.

- Bom pra você – eu disse e beberiquei meu gim.

- Guardo o nome de todas as mulheres que fodi neste caderno. Ehhhehhhh.

Sigmour balançava uma agenda ensebada, ou algo assim.

- Como é que é, seu maníaco?

- Tá tudo aqui. Nome, local, horário da trepada.

- Você precisa ir ao psiquiatra, Sigmour. E isto é pra já.

Sigmour abriu o livro.

- Ahh, tive mais mulheres com “V”: Victoria, Vance, Vanda...

- Wanda não é com “w”? – perguntou um dos clientes que acompanhava a conversa.

- As minhas são com “V”. Tive três VANDAS.

Sigmour abriu seu sorriso desdentado. Tinha uns 70 anos.

- Me orgulho muito deste livrinho.

- Deixe-me ver os nomes – disse o cliente.

- Isto não é para seus olhos, filho – disse o velho.

- Queime ele - eu disse – ou passe os nomes a limpo. A agenda está porca, imunda. Acho que você não consegue ler os nomes que estão aí.

Sigmour ficou puto.

- ISTO É MINHA VIDA, DUSQUENE. ISTO É TUDO O QUE ME RESTA NESTA MERDA DE VIDA. NÂO ME VENHA COM BRINCADEIRAS!

No que ele falou a agenda veio abaixo. Esfarelou-se.

As folhas espalharam-se pelo chão do bar. Caíram aos pés das pessoas.

E estavam todas em branco.

Sigmour olhou as folhas jogadas pelos cantos. Sua boca começou a tremer. Depois seus braços e pernas. Depois ele inteiro.

Via diante de mim o desmoronar de um pequeno homem. De uma ilusão.

Fiquei triste. Mas não podia fazer nada.

Aliás, fiz. Levantei Sigmour do chão.

Paguei a ele uma bebida forte. E continuei a beber meu gim.

Uma notícia em boa hora, enquanto tenho tempo

a danação das ruas
a maquinaria da noite
o verbo
o demônio solto na
na sarjeta do tempo
no apê
tomo cerveja
vejo
pela vidraça
homens e mulheres
guiando
procurando
tudo
– ou quase nada –

entrementes
o
berro
se agiganta

foi
Barbara Fat
que acabou
de
se jogar
do
décimo andar
de um edifício
da Blackshoes street

sexta-feira, 22 de março de 2013

Vertigem


1

homem,
criado do monóxido das ruas
que latejam arbitrariedades voluntárias
reacendendo a chama do pavio, levando
à toxicomania e à podridão que emanam dos becos
longínquos, como o bar de esquina da avenida da noite imensa,
em vastas comoções que chamamos tempestade, e neón e nada,
onde o berro de um bêbado vaza para a noite tremenda, escapando das marquises dos portentos
do centro da cidade, alcançando as fantasmagorias nas paredes da madrugada
manchadas com o catarro dos sonhos expulsos, de ninguém e nada,
onde a negra e acrílica pele asfáltica avança delirante, contorcendo-se e levando a nada,
ou aos neanderthais de rodoviária que esperam o aceno da melancolia nos bancos de cimento
e entram e partem na sombra perversa do sem sentido, ouvindo o estrugir
da boca do velho que traz a mão do homem morto, e ri sorridente, indecente, num jorro fétido e primitivo...
homem, ecce homo, feito de lamento, lama, escárnio e dor permanente,
que coça o saco aviltante da impureza de todos os filhos paridos
em meio aos monturos da Metrópole, oh, homem que traz consigo o animalesco e
vão da canção inesquecível do Patriarca, que convoca todos para a Ressurreição,
que nunca houve nem haverá... humanamente impossível...
ri, torpe velho adunco, daquilo que a Mãe de Todas as Mães lhe proporciona...

2

Lagash,
o vil metal que a alma alheia,
possa eu também sentir em meu bolso de trapos
e insanidade, viver sobre o cimento, os pés em chama,
avermelhados, cair sobre as latas
soltas de cerveja que rolam dos sacos de lixo da Pomerode Street,
vai, enfrenta, esmurra, rilha seus dentes desdentados com o fio de lágrima e sal,
lê, os jornais estão aí para isso, no negro do palato do grosso véu,
páginas sujas, SOB O ÚLTIMO POSTE da última clínica de reabilitação,
antes presas aos pés do banco pelo vento... oh, ENORME INVONTADE...

3

só, na avenida, às 2h da madrugada,
o velho caminha, procura sua alma morta,
ninguém o socorre, reverbera
os seus gemidos no centro do olho do cu do mundo,
tem ele os calcanhares tomados por feridas, pernas inchadas como bastões,
boca em carne aberta, mas ainda não há resposta, e ele se arrasta na noite pestilenta...
assim é o homem...que vejo

OHMMMMMMMMMMMMMMMMMM
quantas facilidades e o mundo terá 3 bilhões de miseráveis em 2050
quantos bônus e jamais terei uma piscina decente num terreno de 1000 m2
quantos drinques e as mulheres não têm verve e se vestem mal
quantas calçadas, ruas, avenidas, meios-fios embranquecidos, sinais, placas, asfalto, lojas, postes, cães,
lixeiras, loucos, bancas de revistas, estações de metrô, rodoviária, sapatos, e mais e mais... muito mais
Lagash não vem em abundância, em 5 décadas, e o sol, o sol, o sol...
o maldito e infame SOL

oh, vibrantes tempestades que vão nos cérebros humanos,
vivas, monstruosas, horrendas flores do mal do ser de qualquer um,
eu BERRO, o berro daquele velho bêbado também é MEU,
sou eu nas ruas em desvario, sou eu... minha alma demente
naquela madrugada, equilibrando sobre pontes inconcretas, erráticas.
Mamom, o Deus de aço dos arranha-céus, é Mamom que domina com sua sombra eternal,
um ser sem olhos, só escuridão e uma angústia brutal, de indústria,
"DINHEIRO, DINHEIRO, DINHEIRO, DINHEIRO, DINHEIRO, DINHEIRO. QUERO DINHEIRO. FAÇAM DINHEIRO!",
é só o que a sombra diz

4

quando a grande mão do Irmão Branco
moer as últimas carnes na última maquinaria
quando a fome subjugar a África e o morticínio
se espalhar pela Ásia, verão... Lagash, a sua incoerência
eu, filho do século anterior das hostes derradeiras,
verei...
o que verei?
ossos, ossos, pilhas de ossos na planície deserta,
habitações destruídas, ardor, quem antes, louco, ali vivia?
"FOME, FOME, FOME, FOME, FOME, FOME, FOME, FOME, FOME, FOME, FOME!",
passará a dizer Um e Outro,
e tudo estará perdido

5

quando você não puder se levantar e comer entre os porcos
quando você não puder ir à enseada para ver as ondas e o crepúsculo
quando você tentar avançar o século mais do que ele puder ser avançado
quando finalmente houver um pouco de paz e ansiolítico em sua alma
quando a hipnótica volta do relógio vespertino marcar a jornada infinda
quando o Patriarca atravessar o alvorecer rendendo graças escarlates
quando for possível, e não for
quando houver uma encruzilhada, mas só um caminho a seguir
quando você escapar das armadilhas, mas não puder se safar de si mesmo
quando houver no turbilhão a esperança da calma entre copos de vinho
quando você enterrar a fé esmagadora que o sustentou até agora 
você verá...
A Grande Pedra Desabada
A Tocha Acesa e Arrependida
A Lei. A Cabala. O Jesuíta.
todos envoltos em espessa névoa

6

eu não serei seu mal ao cair da lua,
nem você me pagará a velha cerveja choca,
por que ninguém envia uma mensagem à planície
onde dorme o homem sedento e roto?
mil anos em meio segundo, farei seu nome imortal
como os grandes promontórios
e vagarei em seus braços de bruma e ânsia e mar
são 2 horas da madrugada, é a febre...
olho pela janela a longa avenida que se ergue e dobra
a dimensão em que hoje vivo - silêncio que vai nos ossos,
íntegro

7

e cresce a Vestal enferma,
sua visão me consome os olhos, adivinha minha carne,
ela que saiu da gonorreia do mundo e caminhou no meu sentido,
e eu preso, eu indissociável de minha própria pequenez,
não consigo lhe dizer palavra alguma
que não seja as de minha impiedade,
enquanto durmo e sonho o berro do decrépito
ser que se escora no mármore de um dos edifícios
vaticinando misérias, o Profeta...

8

acordo,
onde está todo mundo neste apartamento?
a pia repleta de louças e talheres sujos, copos quebrados num canto
a madrugada foi uma grossa corrente de tormentos
e sinto em minha boca o bêbado a se rir,
olho a gigantesca sombra apontando.... Veja!
apontando... O que?
Para mim


A morte do grande amor


Samantha Sunshine cruzou uma linha perigosa
Confrontou o amante, num bar, num dia de lua alta
Ninguém dizia poucas e boas ao Joe e saia impune
Joe estava prometendo há dois anos deixar a mulher por Sam
Mas todo mundo sabe que Joe não deixaria sua mulher
e os dois filhos por Sam
Não ele, não Joe

Sam xingou pesado Joe
Joe não é homem de receber xingamentos, nem de mulher
levou Samantha Sunshine pra fora e a moeu de pancada
os garçons olharam mas fingiram não ver
nem os clientes
que continuaram a rir e a beber tranquilamente

SORTE! Meu amor recluso...


Não jogo há um mês. As pedras me ludibriaram. Estou puto. Dei um tempo. Não adianta forçar a barra quando a Sorte – ou algo parecido com ela – não colabora. Como já comentei, faço uma aposta leve, por diversão. Uma vez ou outra arrisco uns trocados a mais. Nada desesperador. Não quero perder o sonho com isso.
O país não tem me favorecido. Os imbecis estão por aí coçando o saco e ganhando dinheiro. Cada coçada, dois mil. Como conseguem? Eu ainda encontro a porra dessa fórmula esquecida num balcão de farmácia, sei lá. É de impressionar como coisas boas acontecem a pessoas medíocres. Não precisam mexer um músculo e os bolsos já estão cheios de grana – não sei se obtida de maneira lícita ou ilícita, isto é com cada um.
Sempre tive algo semelhante à fé. Uma certeza, talvez. Certo otimismo escondido e indesculpável. Embora desanime no curso da obra, não sou daqueles que jogam a toalha no primeiro ou segundo round. Sou curioso. Quero ver como a coisa vai terminar.
Só estou dando um tempo.
Um dia, quem sabe, a Sorte entrará por aquela porta e sentará no meu colo.
“Ah, Dusquene, que bom que desta vez será com você”.
“Baby, eu nunca te vi, mas sempre te amei”, direi eu, original, passando o braço em sua cintura.

Mulher


difícil é não saber seu nome
chegar neste apartamento imundo
e ficar pensando naquela mulher
na sorte que o mundo tem
de ter aquela mulher sobre a face da terra

difícil é não ver possibilidade de encontrá-la
para dizer como ela é importante para mim
dizer como as coisas poderiam ter sido
diferentes em minha vida se eu a tivesse
visto antes, bem antes, de tudo e todos

difícil é a falta de uísque para esquecer
o sono adiado pelo trabalho insano e inútil
que só enriquece o empregador
e enlouquece os demais
e que, agora, não vem

difícil é saber que talvez nunca mais irei vê-la
descer de um carro, andar como ela andou
cabelos soltos, ao vento...

saber que eu só tenho uma vida e não poderei viver com ela

Dias nossos que não temos porque não são realmente nossos


os domingos são sempre dias mornos
entristecedores
são intervalos reais
entre a folga e a semana turbulenta

domingos servem mais a entidades preguiçosas
não aos homens
é como se houvesse uma quebrar no tempo
ou melhor, um soluço,
para então voltarmos à realidade de nossas vidas
insignificantes
comuns como um abrir de padaria

não gosto dos domingos
creio que 90% do Ocidente estão comigo
são dias realmente estranhos
nem úteis
nem agradáveis
plenamente

além disso, muitos bares fecham nesses dias
piorando a situação
agravando demais
a minha situação

O que faço das minhas horas de folga é problema meu


Às vezes ficamos sós por um momento, e isso é bom. Sem música ou vozes. Só o silêncio. As pessoas necessitam de silêncio. Elas não sabem. Mas é o que elas mais precisam atualmente. Muitas estão enlouquecendo porque não conseguem desligar um minuto, parar de ouvir, para de falar. Parar simplesmente. Um pouco.

Eu sou antissocial por natureza. O que ajuda a manter os chatos afastados. Os vizinhos receosos. O mundo longe. Essa é uma boa estratégia para seguir. Ser antissocial. Meu computador me basta. A página em branco, pronta para ser devassada, corrompida, conquistada. É sempre algo bom. Tranquiliza.

Estamos repletos de nós mesmos. Cansados de gente. Rostos, corpos, braços e pernas para todos os lados que olhamos. A mediocridade, essa mãe de multidões, atrapalha um bocado. Com ela surge o barulho infernal, o vozerio sem fim, incongruente e obsceno de miríades de bocas e mentes obtusas.

Sou mais ficar aqui em cima, no apartamento, tabulando no computador umas coisas. A minha única urgência agora (vou pedir a Gill...) é a de um saca-rolhas para abrir esta garrafa de tinto. O copo está aqui do lado. É, isso também é bom.

800 toneladas de merda


às 6 da tarde elas começam a descer dos apartamentos com seus cachorros
são gordas, magras, loiras, morenas,
jovens, de meia-idade, velhas,
todas levando pela coleira o totó

os pimpolhos despejam 800 toneladas de merda
nas calçadas do país todos os dias,
apenas em três estados

as donas seguem pelas calçadas até 21 horas
seus cães emporcalhando o passeio
fodendo com a paciência que resta do sujeito
que volta de 12 horas de batente
pisando em merda
de animal

por que essas mulheres não arranjam
algo verdadeiramente decente
para ocupar suas vidas?
bebam, façam sexo, vão ao cinema!
mas matem seus cães!

"Vamos logo, Patrícia, mamãe tem que subir
pra ver o capítulo onde Mattison e Pamela
vão se envolver numa
noite daquelas"

"Vamos logo, Patrícia...cague, filhinha!"

e totó deixa o presente pro filho-da-puta
que teima em pisar em bosta de cachorro
todas as noites voltando do emprego de 12 horas diárias

Dusquene

quinta-feira, 21 de março de 2013

O que assiná-lo no armistício do crânio

1
Qualquer mulher é melhor que nada. Não é bem assim. Você tem mão... Algumas valem menos que sua mão direita.

2.
Crer nas pessoas é crer no impossível.

3.
Acredite, desconfiando sempre.

4.
O próximo passo é um drinque. A rigor.

5.
É sério: SE FOR DIRIGIR, NÃO BEBA. Siga sempre este lema.

6.
A garrafa não deve ser a responsável pela morte de ninguém.

7.
"Dusquene, cê é um puta-dum-caralho-de-um-conservador-de-merda"
"É por aí"

8.
Quem nunca trabalhou nunca gastou sapatos.

9.
Só um bêbado reconhece as angústias de outro bêbado.

10.
Já imaginou como será o mundo daqui a 83 anos. Assustador... ou não.

Sempre há uma possibilidade de escapar do inevitável


No futuro, homens se deslocarão em grandes cilindros. Explico. Você será acondicionado em uma cápsula com espaço para uma, duas, quatro, dez pessoas. E, a partir de um poderoso sistema de sucção e propulsão magnética, será jogado numa espécie de autopista. Chegará assim por exemplo, de forma programada e numa velocidade espetacular, no local de trabalho, a 200/400 km de distância.

“Oh, meu Deus, vomitei todo o almoço”.

“Frank, cadê Jezebel?”.

“Sei lá, deve ter embarcado na pílula errada...”

“PARA ONDE, FRANK? MINHA POODLE ESTÁ PERDIDA! VOCÊ TEM DE ENCONTRÁ-LA!”.

“PUTA-QUE-O-PARIU, MARTA! SÃO TRINTA E DUAS OPÇÕES DE EMBARQUE NA CANCELA TRÊS. COMO VOU SABER ONDE A CACHORRA SE ENFIOU?!”.

“FALE COM O MONITOR DO SETOR, POR FAVOR...”.

Não adiantou. O monitor tinha mais o que se preocupar. Disse que não vira animal algum perdido nas imediações. Só restava comunicar ao Setor de Achados e Perdidos.

Para lá se dirigiram.

“Mas vocês cuidam de coisas vivas, não?”.

“Se não forem muito agressivas...”, disse o sonolento rapaz da recepção.

“Ela morde, às vezes...”, atalhou Frank.

“FRANK!”

“Se tentar morder vai pro CEO direto”, emendou o garoto do balcão.

“CEO? Mas o que é CEO?”

“Centro de Eliminação de Objetos... Objetos que estão com defeito são descartados na fornalha”.

“O QUE?! VOCÊS NÃO DIFERENCIAM COISAS INANIMADAS DE VIVAS”.

“Não temos tempo pra isso, madame. O trabalho aqui é corrido. Vazou, explodiu, enguiçou, mordeu... Vai pro fogo na hora”.

“SEUS BRUTOS! QUERO VER O GERENTE DESSA ESPELUNCA AGORA! EXIJO VER O RESPONSÁVEL!”, esbravejou Marta.

Seguiram um dos auxiliares por um corredor longo e escuro. No final do mesmo, o rapaz apontou uma porta de vidro, onde se lia:

“SR. HUMBOLDT CABLE. Gerente-titular do SETOR B-3 de Achados e Perdidos. Proibido terminantemente entrada de animais. QUALQUER UM!”

“Outro dia inesquecível...”, disse um conformado Frank, girando a maçaneta para a passagem da mulher.

Às vezes é apenas um momento


é fácil perceber a rua sem saída
quando damos de cara com o muro
quando o estacionamento do supermercado
está lotado

é fácil ver quando as contas vencem
quando o saco de lixo vaza
o ralo entope
a merda flui

quando o cachorro fez as necessidades no carpete
quando vai ser um dia daqueles
e quando a dona de bunda e coxas tensas
está também num daqueles dias
eh, sei não
fico quieto
bem quieto

é
é fácil
realmente
perceber as coisas
palpáveis, concretas
de aço

mas como não conseguimos compreender
com a mesma exatidão e urgência
A DOR DO OUTRO

se a solidão e a desistência
- e o suicídio -
estão bem ali
escancarados em cada rosto

Otto Dusquene, agora

Catálogo das mulheres que não tive


ela é sexo puro
um ser alado e portentoso, essa mulher...
suas asas são suas omoplatas
- sempre considerei as omoplatas femininas como asas
em nascimento

ela se volta
um instante e sorri
só assim sinto que nem tudo está perdido
que talvez valha a pena colocar a mão na merda
e revolver o limbo à procura da pérola

só assim
penso que exista vida
pelo menos nela
em seu corpo esguio, louro, branco

então, a minha dureza, meu egoísmo
meu ódio por tudo, a minha falta de fé
em relação à humanidade
quase chegam a desaparecer
quando ela surge na calçada
e logo desaparece
numa maldita
esquina
que não deveria
nunca
estar ali

Otto Dusquene

O sol que nos atravessa


tive meus momentos de sol
marítimos
o drink na praia
vodca com limão
o sol no plexo
os coqueiros
as mulheres passando
a lombra
o sabor da maresia
ééé...

o sal grudava nos poros
a pele cozendo
o peixe frito
mais birita

é, Dusquene, um dia quem sabe?
você não é dos piores
aliás,não,
você não é dos piores

espere o verão, Dusquene, espere
quem sabe?

quarta-feira, 20 de março de 2013

AUTONOMIA


1

Marion Manton morreu depois de dois meses e meio,
de um câncer terminal e público. Morreu gritando, gemendo e
definhando no apartamento 208-A, da Danton Street.
Tinha 26 anos. Não teve AUTONOMIA para manter-se viva.
Buff Lindener morreu há menos de um mês,
de edema pulmonar, caído entre duas máquinas de lavar,
às três da tarde, no porão do edifício onde morava.
Idade: 57. Complicação derivada da falta de AUTONOMIA para permanecer vivo.
Dick Craigton faleceu após agonizar durante duas horas,
com dois tiros nas costas. Todos passavam por ele,
sem dar a mínima. Idade: 16. Causa mortis: ausência de AUTONOMIA.
Ruth Stein morreu engasgada com um pedaço de carne.
Sufocou aos 72 anos num restaurante da Limonae.
Havia quarenta pessoas no local. Ninguém notou o episódio.
Não teve AUTONOMIA para desobstruir a traqueia.

2

John Stanley tentou salvar sua filha,
envolvida em um acidente de carro,
quando voltava do trabalho.
Ele passou na via por acaso
e viu a filha presa nas ferragens.
Em desespero, tentou tirá-la do veículo.
Foi imediatamente preso pelos controladores de condutas.
Oito meses depois seu caso foi levado à Suprema Corte.
Foi condenado à prisão perpétua. Faleceu em 2034.

3

Hannah, sua filha, morreu uma hora após o acidente.
Não teve como sair do carro com uma perna e quatro costelas quebradas.
Pulmão perfurado, hemorragia interna.
Muito embora, é preciso destacar, os camareiros
estivessem de plantão a dois metros de onde estava,
esperando que ela fosse até eles, para encaminhá-la
a uma das UNIDADES DE SALVAMENTO,
as quais as pessoas têm direito uma única vez na vida.

4

Quem não tem condições de se safar por conta própria
morre não de doença, acidente, assalto.
Neste mundo todos morrem por não ter AUTONOMIA.
Não é insensibilidade, somente a nova ordem das coisas,
nascida naturalmente... roboticamente... inoxidavelmente
metodicamente incorporada ao dia a dia das pessoas.

5

No conjunto de edifícios cinzas da Área 159-B,
as vidraças balançam nos caixilhos,
com a ventania horizontal,
que já entortou as lâminas de dois dos quatro
outdoors colocados pelo governo,
bem diante dos blocos de apartamentos sem pilotis.
Neles está escrito, em letras garrafais, o mesmo aviso:
“É TERMINANTEMENTE PROIBIDO AJUDAR QUALQUER INDIVÍDUO. AUTONOMIA É REQUERIDA SEMPRE. EM TODAS AS SITUAÇÕES.”.
Logo abaixo, em letras menores, vermelhas, lê-se:
“Quem auxiliar um incapaz será sumariamente preso e julgado sob as leis de AUTONOMIA.”.

6

John Smith, morador do apartamento 227, da Torre C, da Área 159-B,
tentou sabotar essa diretriz, participou de uma rede clandestina de auxílio...
Foi torturado, imolado tão brutalmente
que logo revelou os nomes dos quatro outros integrantes da organização.
As cinco pessoas que, em razão das ações da rede, tiveram uma segunda chance de vida, foram assassinadas (respeitando as mesmas condições em que morreriam se não houvesse ocorrido qualquer intervenção externa).
“AUTONOMIA jamais, jamais deve ter compaixão. Lembre-se disso. É a seleção natural, em último caso o destino, que separa os fortes dos fracos.”.
Os dizeres acima estão espalhados por imensos cartazes. Em todo o país.

Embaixo da ponte, sobre a colina coleante

a porta não se abrirá
e ninguém entrará
e ficará o vazio de alguma coisa
que não houve
e a velha poltrona
defronte à TV
também se cansará
do velho Dusquene de guerra

já a sala mal mobiliada 
sentirá a falta daquele corpo
de mulher
macio
como neve
- como acho que seja

olharei na rua, embaixo
o drinque na mão
a cilada no peito
mas ela não virá
ninguém tocará
a campainha
- nem quem eu quero que toque










O que meus olhos veem


quem vê essas crianças de rua
mal sabe o drama de suas trajetórias

são filhos e filhas de pais alcoólatras,
viciados, violentos

são amantes de seus irmãos maiores
ou do vizinho abusador
curradas aos seis anos de idade

crianças forçadas, humilhadas, prostituídas,
espancadas, barbarizadas até a medula
ou até o esquecimento

exploradas por pederastas gordos, travestis, cafetões
violentadas por toda a vida
crescendo com ódio, traumas e dor...

por isso, quando você enxergar
uma dessas crianças em uma rodoviária
- e é fácil encontrar sempre alguma -
pense muito bem como vai tratá-la
o que vai dizer a ela
se algo ofensivo

trate-a com uma educação
e, principalmente, com uma compaixão
que sei que você não tem nem pela sua mãe

Uma noite em que não dormi direito


cuidado com a química
vá devagar nos destilados
a noite tem 12 horas, contando com a madrugada

pega leve
um drink calmo pra variar
senão as garrafas te pegam

muitos homens perderam a batalha pras garrafas
não foi culpa deles -
está bem, em parte foi -
é que as garrafas são fortes
já vêm rotuladas, provocantes
e agem coletivamente
já o sujeito é apenas mais um na multidão

e nós somos química
e qualquer química em consórcio
com outras químicas,
bem, o efeito não pode ser dos melhores
muitas vezes não é

pegue leve nos destilados
fique na cerveja
lembre-se da velha amiga
A RESSACA, essa velha desdentada
que quer porque quer
lhe enfiar a língua murcha na boca
e sorver seu fígado

Urbanismo


As galerias que vazam os edifícios comerciais deveriam ser lugares de pequenas lojas chinesas, com fachadas de vidro escuro, emolduradas de laca negra. Isso daria uma certa distinção a elas, um ar de mistério.

Mas não. São largas demais. Pùblicas demais. Locais corriqueiros. A fauna que ali passa torna o ambiente previsível. Povoado de passos de gente morta. Meros pontos de passagem indo do nada para o grande nada.

Porque o arquiteto não previu isso, meu Deus? Esse marasmo. Por que esses rasgos inúteis que a todos abarcam? Torpes espaços emporcalhados,devassados como mulheres nuas.

Da minha janela fria


você só conhece a cidade quando ela adormece
às 3h da manhã
quando chega perto
olha pela vidraça e vê carros esporádicos
passando sob os postes de luz laranja
vê o asfalto como uma enguia reta e cinza
indo e indo e indo

a longínqua sirene dos bombeiros
os gritos dos bêbados e suas brigas
o sexo dos gatos nos telhados
são esses os verdadeiros ruídos da cidade

não a loucura diária
não o café da manhã
não o jornal fresco
não os passos dos homens e seus trabalhos
não a normalidade aparente

cidades são como crimes a céu aberto
com seus prédios e sarjetas
hospitais e necrotério
guaritas e cancelas e becos

são
momumentos pagãos
a um deus qualquer
dê a ele você o nome que quiser
mas são um tributo a um deles - Moloch, talvez -
isso eu sei que são

A merda nossa que vaza todos os dias


o diabo é
             o ramerrão
        a falta de perspectiva
                  de grana
as solas dos sapatos gastas
as meias furadas nos dedos e nos calcanhares
                                   o sem saco de
comprar meias e sapatos

o diabo é
             o sol, o maldito sol rompante,
             o café oxidado
                                 na térmica
                                 de quinta
a danação das ruas
            a vontade de ver ninguém
a ressaca bruta
                     o bolor no armário
                                 e o periquito verde
do vizinho
              o pane mental, enfim,
a perda de sensibilidade...


o diabo é isso
                    a uniforme percepção
                    social
               denunciando sonhos
as pessoas do metrô
             com seus rostos vencidos,
banidos, inúteis,
                                  a morte anunciada
                       em tudo

já no apartamento
         depois de um dia morno
ligo a TV
            desligo
- esqueço que não há vida na TV -

é tarde,
camarada,
muito tarde para qualquer um
salvar-se

99 por cento



99 por cento da humanidade me incomoda
não me interessa
- a China com seus olhos cortados não me interessa
- a Índia com seu povo pardo não me interessa
- a Alemanha não me interessa
- o Tibete, muito menos

milhões mancham a paisagem
com seus recalques
conformismo e
ausência de coragem

os homens nos escritórios,
- existem multidões de pessoas em escritórios
  e bancos e conglomerados -
vertem negócios
- limpos ou sujos, tanto faz -
e chamam esse trabalho de vida

tudo bem: tomam seu uísque no final da noite,
com boas mulheres e cama larga

mas, sinceramente,
essas pessoas também
não me interessam nenhum pouco
aliás, me causam certa aversão

assim como as estantes cheias de livros mortos
de romancistas mortos, de poetas mortos
(muitos mortos também fisicamente)

jovens,
cuidado com os literatos
rasguem os literatos

leiam London, Kerouac, Fante e Bukowski
e um pouco do Uivo do Ginsberg
esses caras confrontaram a CICATRIZ

leiam os que ousaram romper as amarras
e escrever sobre a vida real (sem subterfúgios)
escrever sobre os azares cotidianos

esses grandes desbravadores
escritores que valem a pena ler

- os literatos?
que sejam lidos pelas traças

assim como os vermes lerão
minuciosamente
os cadáveres impecáveis
dos homens dos escritórios

terça-feira, 19 de março de 2013

Negociação ao cair da tarde


"Estamos abertos à proposta, homem. Queremos sua alma.
Você sabe disso".

"Sei. E daí? Qual é a proposta?"

"A proposta é você quem faz".

"Tudo bem"

"Então, qual é?"

"Calma, estou pensando qualquer coisa".

"Não tenho o dia todo".

"Ei, cara, vá se foder. Você me aparece no
meio do quarto, enquanto entorno uma birita.
E me apressa? Afinal, quem é você?"

"Maxwell"

"Maxwell de quê?"

"Apenas Maxwell. Meu pai não gosta de sobrenomes".

"E quem é papai?"

"Você sabe muito bem quem é, Dusquene".

"É. Um filho da puta qualquer"

"Não fale assim dele. Olha o respeito".

"Ó, sua bicha, sarta fora. Não quero fazer
proposta nenhuma. Não vou vender minha alma".

"Estou pagando bem: mulheres, iate, grana preta".

"Tá bom. Aí vai. Vendo minha alma por SOSSEGO.
Mil anos de SOSSEGO".

Poema da morte prematura


ei, baby,
vamos pegar as flores
que secaram antes das lágrimas

vamos andar nos campos
vamos correr para a última estrada
onde não tem mais coisa alguma de ninguém

ei, baby,
que tal fazermos algo que valha a pena
morrer em uma tarde de junho está fora dos planos

ei, baby,
então vamos fazer uma coisa louca
que tal sermos felizes, um pouco, só um pouco, agora

Um troço sério da infâmia acesa


Ninguém pode começar um romance se trancando num apartamento para escrever. Isso é neurose. É doentio. Escrever deve ser um troço automático. Vivencial. O cara que elabora demais o texto pode ganhar no estilo, mas o que produzirá morrerá na estante fria.

Prefiro escrever o que me vem na cabeça na hora, porque sei que essa é a minha verdade, mesmo que momentânea. Não adianta o cara sentar no computador e pensar: "Hoje vou escrever o grande poema americano do século" ou "Começarei hoje uma novela espetacular".

Não falo daqueles escritores que fazem uma grande ficção. Não. Falo dos escritores comuns que pouco têm a oferecer, além de uma dura realidade, de sacanagem e poemas com mulheres e bebidas, como eu.

Afinal, o troço bom é isso mesmo.

Cada um com a sua merda infanticida


"Como é que você se sustenta?"
Você é o que você fez ou continua a fazer
Bukowski fazia essa pergunta essencial

"Amigo, como é que você paga suas contas?"
Ele dizia que, nessa pesquisa particular,
observou que quem pagava as contas geralmente era a mãe

O cara tem 25, 30 anos e está ali,
sorvendo os pais como canário novo
Um tremendo filho-duma-puta

Os pais ficam ali, olhando de lado,
praguejando ter um filho assim
A mãe quer jogar carteado com as amigas
O pai arrumou uma putinha e quer comer por fora
e Wilson ali, esquentando os ovos no sofá,
vendo o último filme do Woody Allen

Duvido se os pais, mentalmente,
não queimam o dia do nascimento do garoto no calendário
"Merda de dia...", sussura o velho. "Que foi, pai?"
"Nada, continue vendo a porra do filme"

O lado negro de um moribundo bebum

A merda de sentar todo o dia numa mesma mesa de escritório é que você podia se deparar com Sonja. Ela falava mecanicamente. "Por favor, sr. Dusquene, o senhor poderia agregar essas planilhas de auxílio doença às que o senhor já tem para calcular?". "Tudo bem, Sonja, coloque". "O quê?". "Coloque do lado desse monte aí na sua frente". "Gostaria, por obséquio, que o senhor desse prioridade a essas planilhas, porque são de funcionários nossos". Ergui os olhos. "Sonja, aqui não tem como passar a fila", falei consciencioso. Ela encheu o peito. "Senhor Dusquene, o senhor é um funcionário exemplar. Realmente exemplar". "É, Sonja, eu procuro ser. Que tal almoçarmos hoje, hein?". Sonja tinha belas tetas e pernas e um traseiro que deveria aguentar bem o mangalho. Ela topou.

O velcro preso em um espaço intermediário

"Eu não tenho nada a ver com o machucado na testa dela e..."

"Mas ela caiu como?"

"Tropeçou e deu com a cara na estante..."

O policial se virou para Annie.

"Foi isso mesmo?"

Annie pareceu concordar timidamente.

Bulford a olhava sério. Ela de cabeça baixa.

"Sei...", disse o cana. "Mas como uma mulher de 1,60 bate na quina de uma estante de 1,70, no mínimo? Caindo..."

"Sei lá... Talvez estivesse na ponta dos pés...", Bulford riu.

"Venha cá. Fique aqui você..."

O policial colocou Bulford na lateral da quina.

De repente, aplicou no encanador um tremendo tapa no pescoço.

Imediatamente Bulford começou a sangrar aos jorros no lado direito da testa, um dedo acima do olho.

'´É, realmente pode ter sido um tropeção a causa do acidente... Justo como ocorreu com você agora"

O policial olhava rispidamente para Bulford.

"Sei que esses tropeções de sua mulher jamais voltarão a acontecer. Não é, camarada?"

Bulford cuspiu lodo e covardia e raiva, um pouco.

Mas disse:

"Não".

 

segunda-feira, 18 de março de 2013

Conveniências


é preciso matar o tempo
              então
         se masturbe
            se coce
              reze
             coma
             beba
            arrote
            cague
    empine o caralho
   chupe uma boceta
 - que não seja de puta -
        se hipnotize
        se arrebente
            na via
faça palavras cruzadas
        ande na linha
         ou fora dela
        se masturbe
         novamente
            berre
  mande o tremendo fdp
        para a pqp
 emborque a garrafa
       de uma vez
       ou desista

           enfim,
   faça o que você quiser
contanto que me deixe em paz

A loucura desaba sempre no meio da noite fria


sonho poucas vezes e ontem sonhei que estava no corredor de um supermercado
ia tranquilo empurrando o carro, dobro um dos corredores e lá está ela: uma alienígena, oferecendo copinhos de uma marca de café

a alienígena tinha um olho retangular enorme, me perguntou:
"Gostou da viagem sr. Dusquene?"
"Que viagem?"
"Para Altam, logicamente"
"Que conversa é essa? Estamos nos ..."
a linha fina que era o lábio da alien se expandiu, um risinho talvez
(não sei como, mas eu sabia que era fêmea)
- quando ela falava a linha ia para os lados e só
tinha dois braços como nós, mas verdes e que acabavam em pinças roxas
não vi pernas, bem que tentei, o tórax, sem seios, ia direto ao chão
"Bem, o senhor pensa que está na Terra, mas está em Altam"
"Dispenso o café, quero um uísque puro duplo"
"Não há bebidas alcoólicas neste planeta"
"Ótima droga de notícia. Vou fundar a Máfia por aqui. Como é seu nome querida?"
"Styxxx"
"Sei, pornô"
"Como?"
"Deixa pra lá, Styll. Posso lhe chamar de Styll, não posso? Quando sair do serviço você não gostaria de me mostrar o seu planeta?"
"Adoraria"
"Certo. Vou dar um giro pelos corredores. Que horas você sai?"
"Daqui a 582 horas?"
"O que?!"
"Nosso dia aqui dura 1.385 horas terráqueas".
"Eu preciso realmente de uma bebida agora, Styll. Vou procurar o Al do pedaço e fundar aquela sociedade de que lhe falei"

Um modelo de ser humano como crosta


já é ruim ter de levantar às 7 da manhã
e, como se isso não bastasse,
é preciso enfrentar a massa humana
a fila disforme de rostos, bundas, barrigas e quadris
gente compartimentada, o pior da terra

impossível não olhar a minha, a nossa conformação física,
que não é, de modo algum, das melhores

ontem mesmo um sujeito de 130 quilos ocupou dois bancos do metrô
fiquei olhando de cima e pensei em lhe sugerir uma cirurgia bariátrica
mas fiquei na minha, só observando o mamute lendo jornal:
"Afinal, Dusquene, você não é páreo para confrontar tudo isso se algo der errado"

Uma boa hora para ir a lugar algum


posso perder, mas vou tentando
apesar de todos os revezes, das probabilidades contrárias
você é um homem comum, Dusquene, você não pode muito
mas o jogo prossegue, os dados continuam a rolar,
a sorte está no ar, um dia vou sentir seu cheiro
e não o da merda cotidiana

mas, se tudo der errado, se a sorte fraquejar e não conseguir me alcançar,
sempre haverá a possibilidade de ouvir Satisfationa música do século 20 e 21, a tradução dos nossos últimos 40 anos
sempre ótima, com uma bebida na mão melhor ainda

bem, Dusquene, não custa parar agora e conferir o resultado...

sábado, 16 de março de 2013

Weekend no Pacífico


ainda terei um
weekend no Pacífico
sob as palmeiras
com o vento no rosto
bebendo drink batido, com limão

mulheres, bebidas, calma
uma espreguiçadeira ao meu dispor
- Você venceu, Duc Dusquene... enfim, você venceu
você, o escritor mais prolífico das Américas
você, o pato, que ninguém dava valor

às vezes estarei sóbrio e ligarei para Joan:
- Baby, estou aqui, à beira-mar, relaxando...
um estúpido céu azul imenso sobre minha cabeça
fecharei, então, os olhos, sentirei o calor e sonharei um sonho bom

Um cão


amo você, baby
como um cão
um cão danado
um cão de rua
triste

um cão cheio de carrapatos
com cicatrizes no focinho
seco e só

amo você, baby
como um cão
parado numa esquina
sarnento, repulsivo,
repleto de pulgas
e triste

amo você, baby
como um cão
manco e débil,
mas feroz

amo você,
ganindo

Caledônia


Fillgow, o pistoleiro, desta vez cai. Morre na tarde rubra, em meio a cactus e folhetins de cowboys. E então esperaremos que ele resnasça nas velhas páginas de gibis esquecidos nos fundos de gavetas.

"Ele não virá, Gillmore".

"Virá, sim".

"O gibi deste mês já foi lançado".

"É uma merda, vou ver com meu pai se ele acha um novo no almoxarifado".

Um serviço de Billy boy


"Eu ainda mato esse cara. Ainda quebro ele".

"Quem?"

"O Gillmore".

"Que houve?"

"O desgraçado pediu que eu fosse na loja comprar camisinhas tamnho GG pra ele".

"Sacanagem da grossa".

"E ele falou... 'Desse tamanho aqui, ó', na frente de todo mundo. O homem é um filho-da-puta"

"E você foi?"

"Comprei, fazer o que..."

"Mas foi 'Desse tamanho aqui, ó'", e fiz o gesto com as mãos separadas uns 30 centímetros.

"Não fode, Dusquene", e Billy boy saiu caminhando, chateado.

sexta-feira, 15 de março de 2013

Baratas, meu mundo delas não sai

As baratas do almoxarifado são legais. Eu me apeguei a algumas delas. Edgar é o cara das costas pretas, tem uma asa fraturada, a esquerda. É dobrada pra cima. Creio que ele a bateu no pouso, não sei. Buster é quase do tamanho de Edgar, mas é pálido como uma beluga. Buster tem classe, caminha pisando leve, como Fred Astaire, mas é velho de casa. Conheço ele a uma porrada de meses. Ele gosta de aparecer no meio da noite, um pouco depois de Edgar. Edgar geralmente fica entre a segunda e a terceira prateleiras. Buster não, sempre na quarta, juntamente com ela, a minha favorita. Molly é a menorzinha e se esconde realmente bem no final das caixas de papelão. Só lá pelas 22h, quando estou realmente sozinho, na vigília, que ela aparece, devagarinho. Põe a cabeça pra fora. "Oh, é você Molly, hoje trouxe uns farelos de biscoito de coco. Taí. Não sei se vai gostar. Buster não quis. Está de dieta. Mas é melhor que a velha mazeina". A coisa ia assim, eu e meus animais de estimação. Sempre disse pra Edgar ficar atento. "Pare de se aventurar na segunda, fique na terceira. Os caras podem te ver na caminhada". Não deu outra. "Porra, que merda é essa Dusquene? Aqui tá cheio de bicho". Não deu tempo pra nada. Buff descarregou toda a raiva de séculos em Edgar. Depois olhou pra mão, contendo Edgar pulverizado. "Bosta", disse. Limpou meu pobre amigo em seu macacão. "Bosta, não. Ele se chamava Edgar". Buff não entendeu. "A barata que cê matou, desgraçado", eu disse. Buff me olhou. Apontou o dedo pra mim. "Cê é doido cara, ou passa tempo demais aqui nesta caverna". Depois da tragédia, Buster e Molly regularam mais as saídas. Passei a colocar as refeições somente às 23h.

Aquilo que é bom e nem é tanto


todos os bares estão fechados
todas as gargantas estão secas
e o tédio ronda
esta segunda-feira

a TV novamente não tem nada que preste
e ainda tenho quatro cervejas a meu serviço
e não há por que não bebê-las

a maquinaria da noite
envolve luzes de postes longínquos
como borrões impressionistas
e os bares mantêem-se fechados

só há a certeza da terça-feira
e que o fim de semana avança
- e eu que detesto todos os fins de semana
que são como bocas velhas
fluindo seu esgoto sem dentes

é...
só me resta cair de pau
nessas garrafas
e rezar para amanhã ser
um bom
e rápido dia

A cortina puída da alma alheia


1
Quem não tem preconceito - um que seja - não é humano. É triste, mas é verdade.

2
Os dias de sol, os drinques na piscina, quando os terei?

3
Certeza absoluta só idiotas têm.

4
Quando uma mulher quer, ela faz um homem pensar naquele viaduto.

5
As mulheres se arrumam. Se maqueiam. Vão a salões de beleza. Fazem o diabo. Mas muitas perdem seus homens para a garrafa.

6
Viver é im-pre-vi-si-bi-li-da-de. O caos...

7
Os jovens hoje vivem com os país até 27, 30 anos. Júnior não sai de casa nem para comprar cigarros.

8
Um bar sortido. Essa é minha ideia de Paraíso.

9
Sempre há gotas a mais no fundo de qualquer garrafa.

10
A possibilidade geralmente é apenas isso: uma possibilidade.

Foda é viver pensando nisto que não tem jeito


homem,
olhe o mundo,
veja a merda em que você se meteu

nem pense
em escapar,nem tente,
nem lute demais, nem chore,
nem abra essa lata de cerveja agora

veja a lua cheia,
apenas pare um pouco com tudo isso,
é esse o momento de ficar calmo,calmo como
a superfície de um lago congelado

homem,
olhe o mundo,
nem pense tentar vencê-lo,
nem que você morra tentando,
socando paredes de concreto,
você é apenas algo inútil, que passa, é só

quinta-feira, 14 de março de 2013

Bullingan


Bullingan tinha um olhar pornógrafo
as mulheres se sentiam nuas diante dele
cada cruzar de pernas, cada nuance de quadril
Bullingan captava, apreendia, catalogava

as mulheres ficavam desesperadas, levando a mão
no meio das pernas, escondendo as mamas
mas muitas gostavam do olhar sacana de Bulligan
se havia as incomodadas, havia as lisonjeadas,
cheias de malícia e que estufavam as carnes para que
Bullingan pudesse apreciar melhor a paisagem

Bullingan tinha um olhar pornográfico
mas era impotente e só e bancário e nunca forçou nada
com Sally, Debra, Suzzy, nada com ninguém,
tinha um olhar pornográfico e só