sexta-feira, 9 de junho de 2017


sábado, 30 de junho de 2012

Darwin em abril

então,
iremos sob o sol,
passaremos uns pelos outros,
num sadio desconhecimento,
cada qual com sua doença,
com seus tremores,
com suas obsessões

uns tomarão
cervejas em bares
de esquina
e falarão do que
fariam se...

outros irão
para casa, sós,
e esperarão a
morte, sempre atrasada

outros criarão
cães e gatos, acreditando
firmemente que fazem
um bem enorme
à Humanidade

o certo mesmo
é que cada um quer
que o outro se foda,
morra enfiado numa 
grande bola de merda seca,
ou pior

é a lei da evolução,
uma lei simples
e boa

Paisagem fosca em meio ao clarão


ando pela rua e vejo o que vejo,
subo as longas escadas do Marítimo,
só me resta beber urgentemente
enquanto as vagas seguem em melancolia

ah, um bar, um fim de tarde,
mulheres com belas pernas chegando
e um copo com uísque e gelo suficientes

a vida pode ser até tolerável,
pode ser até decente
para um homem,
quando ele não agoniza
em um escritório,
queimando num trabalho
ordinário

- Garçom, mais um aqui.
- Certo, Sr. Dusquene.

agora, depois de duas horas,
o sol desce no horizonte,
ligo para minha fonte para
saber o que deu no primeiro prêmio

tudo laranja-amarelado
gostei do bar, realmente gostei,
fica sobre uma plataforma,
sem prédios em volta,
bom para beber
na véspera de uma folga,
que bem mereci

Não brinquem com Lenora Fatfull


Lenora FatFull chegou cansada do supermercado, onde trabalhava por 12 horas como caixa e empacotadora. Encontrou Tillburn com uma lourinha em sua cama de ferro. Tillburn ficou mais branco do que era e a lourinha tentou sair da cama, em vão. Recebeu um tapa bruto de Lenora, que quase lhe virou o pescoço. Lenora trancou a porta e disse.

- Não saiam daí! Nem tentem!

Foi à cozinha e, dez minutos depois, voltou com uma jarra de café bem quente e um sorriso escroto.

- Vamos beber. Tillburn adora café.

- É? - tremeu a loura.

Lenora entregou uma xícara para Tillburn e uma para a lourinha.

E seca avisou.

- Coloque perto do seu pau e você, minha querida, perto da xota.

- Mas o que você?

Tillburn não terminou a frase. Um tabefe estalou em sua cara.

- Faça! - Lenora intimou fria.

O que se ouviu no apartamento em seguida foram berros tenebrosos, entrecortados com sopapos, e uma vozinha, ao longe...

- Um pouco mais de café, querido? Oh, você também quer? Não seja por isso..

sexta-feira, 29 de junho de 2012

O elemento que falta em mim

não escrevo para ninguém
nem para mim,
poderia parar de escrever agora mesmo
e não seria o fim
nem o começo de nada

o que não posso é ficar sem mulher
e sem bebida
cerveja, pelo menos,
destilados estou fora,
tenho 48

quem acredita que o mundo precisa
que ele escreva é um imbecil, um demente,
eu não preciso também ler o que as pessoas escrevem,
livros me causam náusea

páginas e páginas
sem razão alguma, sem motivo,
alegria, verve ou dor,
ou quem sabe algo menor

escrever é tedioso
- jamais me empolgo com o que leio agora -,
sei que não há nada mais a ser feito
ou dito


só poeira, às vezes nem isso 




quarta-feira, 27 de junho de 2012

Edna Hill

Edna Hill queria foder sempre às 17h. Nem um minuto antes nem depois, o começo do troço, é logico. Deveria começar precisamente às 17h e durar, no mínimo, meia hora. E Edgar não tinha meia hora para gastar naquilo. Afinal, tinha filhos para alimentar, uma esposa para cuidar, um cão que precisava de um osso, um canário talvez. Edgar fazia bicos como encanador e preenchia os dois encanamentos de Edna também. Mas o serviço começando sempre às 17h. E às vezes não dava. Edgar não podia parar um serviço no meio para pegar outro.

Edna não entendia e cobrava. Começava a ligar pelas 15h15.

- Olhe, seu puto, não vá me faltar. Às 17h hein? Não se esqueça...

- Estou no meio de um conserto delicado aqui, querida. Posso atrasar.

- Atrasar, o caralho! Se você não chegar aqui no horário, sua mulher vai ter notícias minhas...

E desligava. E Edgar tinha que dar um jeito. Tinha que acelerar o trabalho para se conectar aos encanamentos de Edna.

E, às vezes, Edna não limpava direito um deles. Aí dava merda. Era a vez de Edgar cobrar.

- Porra, que troço é esse! Cê tem que ter mais higiene.

- Desculpe, Ed,  juro que não vai mais acontecer. Foi o salame.

- O meu?

- O salame que comi ontem? Ficou pastoso demais...

- Preciso de uma folga para me recuperar dessa.

- Nem pensar. Amanhã, aqui, no mesmo horário. Senão sua mulher...

Pugilismo ao cair da tarde


De repente, rolou uma briga no bar.

Na verdade, o dono estava tentando deter um dos clientes, que, de tanto beber, pensou que estivesse no banheiro e começou a se despir. O homem ficou irritado com o proprietário e a luta seguiu no chão. O sujeito era gordo e não queria ser dominado.

"Ele quer me currar, esse filho-duma-cadela. Quer me currar!".

"Levante suas calças, Fred. Saia do meu bar", disse Bulford.

Embora franzino, Bulford tinha força nos braços e havia imobilizado Fred com um golpe por trás.

"Me ajudem. Esse cara quer comer meu cu!".

Por fim, Fred foi jogado na calçada. Levantou todo estropiado. As calças ainda meio arriadas. Era uma imagem triste. Havia se separado de Irene há um mês. E há um mês bebia pesado.

Soube depois de cinco meses que a cirrose, misturada ao conhaque, o havia levado.

Irene continuou rebolando seu rabo de aluguel.

Mil pesadelos em meio à névoa da cidade suspensa


Era um castigo maldito.

Acordava aspirando a fumaça de breu da Steak Grill, ao lado. As janelas do cubículo onde eu morava pareciam feitas de carvão, de tanta fuligem depositada pelo vento. Fui reclamar com o gerente judeu do restaurante. O cara disse que iria construir a droga da chaminé até o topo do prédio dentro de um mês, no mais tardar. Um mês logo já era três.

Fui lá de novo:

- Estou respirando madeira torrada há três meses. Cadê a chaminé, Fullman?

- Sai em menos de um mês. Sem falta. Prometo.

- Esquece. Quero a chaminé para ontem. Trate de providenciar o troço, senão...

Fullman ficou sem cor. Entendeu a advertência como ameaça. Porém, eu quis dizer apenas que, se ele não erguesse a chaminé, eu apresentaria reclamação formal no Departamento de Obras e Posturas da prefeitura. Mas deixei correr, sem nada explicar, para ver no que dava.

Quinze dias depois a chaminé estava lá, suspensa no ar como a Babel antiga. Vazava dia e noite sua tosse negra. Mas nas alturas. Sobre os edifícios residenciais. O tumor carregado pela ventania.

Finalmente pude abrir um pouco as janelas. A fuligem não acabou de todo. Mas melhorou um bocado.

Num final de semana, Fullman saiu com a mulher para o litoral. Fechou a Steak.

À noite, um gato começou a miar, alto. O som escapava de dentro da chaminé. Talvez o bichano tivesse sido atraído pelo cheiro ou resto de carne e ficado preso, sei lá...

Depois de dois dias de miados infernais, sem ninguém pregar o olho, mesmo de ressaca como eu, a Obras e Posturas, atendendo a inúmeros chamados da vizinhança, arrombou o cadeado da Steak. Acharam uma ninhada de sete gatos pretos, negros como a noite, logo na entrada da chaminé.

Na volta, Fullman encontrou o estabelecimento interditado por evidente falta de higiene.


terça-feira, 26 de junho de 2012

Ruas

essas ruas cheias de nada
cheias de homens e mulheres náufragos
em ilhas pequeninhas, estéreis,
convivendo com a passagem do tempo,
temendo a própria passagem do tempo,
pessoas mortas, mortas...

eu, no meu bar momentaneamente predileto,
até que alguém queira fazer amizade
e eu tenha de me afastar dali,
observo a massa ignara, indo, vindo,
pobre como um espantalho 
de milharal

aquilo é uma visão repugnante,
e eu me calo, com o álcool
limpando a minha goela,
agora sem sede,
em paz


Blind Date


“Quem é?”

“Aqui é Rajesh Voojoo, secretário do Grande Aranda Kalapajaloo. Informo que o senhor se encontra em atraso com uma mensalidade-doação para nossa entidade”

“Como é? Quem é?”

“É o Rajesh Voojoo, secretário do Grande Aranda”

“Escuta aqui, Voodoo...”

“É Voojoo, senhor”

“Tudo bem. Que seja. Eu não sou filiado a nenhuma seita. Só contribuo com o asilo das putas, quando dou uma”

“O senhor realmente necessita da espiritualidade do Grande Aranda... Venha nos fazer uma visita. Aproveite e traga o carnê para o pagamento da mensalidade”

“Ó cara, vá se foder. Já disse que não conheço nenhum Kapalo...”

“Desculpe. Mas é o Grande Kalapajaloo...”

“Esse mesmo e...”

“O senhor precisa pagar a mensalidade para manter acesa a sua vela da vida. Senão...”

“A vela é grossa, Raj?”

“É. Por que?”

“Enfiei ela toda no cu do Grande Aranda como minha contribuição particular para a ordem”

“Mesmo assim, gostaria de lhe informar que sua mensalidade ficará em aberto em nossos arquivos. Ligarei dentro de uma semana”

“O que? Alô... alô...”

Uma tarde feliz entre pombos e gatos

Quando entrei na casa, dei de cara com o pombal, numa das laterais. Na verdade, uma tela de galinheiro, armada entre pilotis de ferro, com uma dúzia de pombos atrás, fechando toda a varanda de Buba PopCorn.

"Mas o que é isso?", cheguei perto e levantei o braço para apontar para o troço.

"NÂO TOQUE NA TELA! ELES SENTEM O CHEIRO", disse Buba.

Era uma negra gorda, de 100 quilos.

"Eu não ia...Só queria saber por que?".

"Gosto de pombos".

"Eu de gatos".

"Hummm. Não fui com a sua estampa, garoto".

Olhei melhor. Havia alguns pombos dominantes, que corriam, espantavam os outros. Havia um cinza marrom. Perguntei se era o big boss.

"Esse é o Poncho. Aquela é a Suma. Esse branco é o Franco, só vive no chão. Asa esquerda quebrada. Esses maníacos do parque. Pode ter sido também um gato", e Buba me olhou desconfiada.

De repente, falou.

"Agora, franguinho, vamos transar".

"O que? Não, Buba. Vicky está para chegar. Ela é sua amiga. Não acho certo e...".

"Vamos transar já!"

"Mas eu não..."

"Já, Dusquene. Pro quarto..."

Fui empurrado, forçado, estuprado. Em agonia, eu arfava para seguir o script, enquanto os pombos se desbatiam no cercado estreito, assustados com alguma coisa ou com tudo.

Consegui, não sei como, mas consegui.

Dez minutos depois estávamos na sala, esperando Vicky.

Um toque na campainha.

"E ai", disse Vicky, "Vocês se deram bem? Gostou do Duc, Buba?".

Buba me olhou, séria. Bochechas infladas. Beiços grossos e curtos.

"Sei não. Ele é chegado a gatos".

segunda-feira, 25 de junho de 2012

...

meu medo
é não ter tempo para coisa alguma
que valha a pena
o tempo é curto
e estamos correndo como loucos
para o quê? Não sei...

não sei o que dizer
ao velho amor
nem porque
a alegria das pessoas,
a confiança das pessoas,
me faz tanto mal

talvez porque eu não as queira ver,
talvez sejam a causa dessa angústia,
talvez eu não saiba nem isto

talvez sejam elas justamente o meu medo...

sexta-feira, 22 de junho de 2012

O que faço das minhas horas de folga é problema meu

Às vezes ficamos sós por um momento, e isso é bom. Sem música ou vozes. Só o silêncio. As pessoas necessitam de silêncio. Elas não sabem. Mas é o que elas mais precisam atualmente. Muitas estão enlouquecendo porque não conseguem desligar um minuto, parar de ouvir, para de falar. Parar simplesmente. Um pouco.

Eu sou antissocial por natureza. O que ajuda a manter os chatos afastados. Os vizinhos receosos. O mundo longe. Essa é uma boa estratégia para seguir. Ser antissocial. Meu computador me basta. A página em branco, pronta para ser devassada, corrompida, conquistada. É sempre algo bom. Tranquiliza.

Estamos repletos de nós mesmos. Cansados de gente. Rostos, corpos, braços e pernas para todos os lados que olhamos. A mediocridade, essa mãe de multidões, atrapalha um bocado. Com ela surge o barulho infernal, o vozerio sem fim, incongruente e obsceno de miríades de bocas e mentes obtusas.

Sou mais ficar aqui em cima, no apartamento, tabulando no computador umas coisas. A minha única urgência agora (vou pedir a Gill...) é a de um saca-rolhas para abrir esta garrafa de tinto. O copo está aqui do lado. É, isso também é bom.

O torpor de minha mente vaga

“Vai dar certo. Sobe aqui”
“Mas aí?”
“É”
Vicky obedeceu.
“Não. Eu não aguento. Fica você”
“Vai. Vai. Vaiiiiii....”
“Puta-que-o-pariu, a bunda... Não sinto minha bunda”
“Que é que deu na sua cabeça para trepar num depósito de gelo?”
“Tesão. Então? Vamos tomar uma ducha?”

Enquanto tranquilo aqui estou

tenho mais de 300 poemas e textos curtos
e o público continua querendo mais, mais do quê?
por Deus, são mais de 300 poemas, porra,
mas as pessoas não se cansam,
querem visitar ruínas,
ver se o sujeito esqueceu
uma parede sem ser demolida,
querem ver a última bebedeira,
o copo se espatifar no chão,
"Dusquene ir à merda"

fodam-se vocês todos, miseráveis!
eu sou como vocês estão todos os dias
de suas vidas opacas e sem sentido,
vomitando a bílis das palavras sem lastro,
que entrego a vocês, de graças

mais de 300 poemas e essa merda em vão...
vão aos escritos dos primeiros tempos,
há Dusquene lá também, melhor do que hoje,
muito melhor

deem-me a gratidão do esquecimento
por uns dias, vou ao bar,
que o bar é logo em frente

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