sexta-feira, 26 de agosto de 2011

A fé inabalável na velha amizade

Burns tinha um olho de vidro. O cara que fez a prótese sacaneou com ele. Fez o olho um pouco menor que o globo ocular.

Era constrangedor conversar com Burns. Ele me via no bar, arrastava a cadeira e sentava.

- Como vai, Dusquene?

- Tudo bem. E com você?

- Vou indo.

A conversa seguia. Eu pedia mais um drink. Burns outro. Sei lá, o músculo ocular relaxava depois de umas doses.

- O olho caiu, Burns.

- O que?

- O olho...

- Caralho! Aquele filho-duma-cadela me paga...

E a coisa ia assim, mais meia hora:

- De novo, Burns.

- Ahh?

Eu apontava para o meu olho esquerdo, que seria o olho direito falso de Burns, em imagem invertida.

- Porra, que merda! Desculpe, Duc.

- Não se preocupe. Não tem um jeito de colar?

- Você está brincando comigo, não é?

- Sei lá. Não entendo dessas coisas - eu disse - Esquece - e pedi outro drink.

A coisa foi abaixo novamente.

Dessa vez o olho de íris marrom escuro rolou pelo tampo da mesa e foi parar no chão.

- Passou perto de sua mão. Podia ter segurado.

- Desculpe, Burns, mas agarrar olho de alguém é demais para mim.

E levantei com meu drink.

Burns me olhou puto.

- Você é um cretino, Dusquene.

- Para algumas coisas realmente sou.

Antes de me dirigir ao balcão, lhe disse:

- Se eu fosse você recolheria logo esse olho. O proprietário gosta de passar um esfregão e...

Vi o olho restante de Burns aflito perscrutando o chão.

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